Operação Lava Jato

Odebrecht entrega e-mails que mostrariam compra de imóvel ao Instituto Lula

Bernardo Barbosa

Do UOL, em São Paulo

  • Cristiane Mattos - 21.fev.2018/Futura Press/Estadão Conteúdo

    Lula na quarta (21), em evento em Belo Horizonte

    Lula na quarta (21), em evento em Belo Horizonte

A defesa de Marcelo Odebrecht, ex-presidente do Grupo Odebrecht, entregou nesta quarta-feira (21) ao juiz Sergio Moro uma série de e-mails que, segundo seu advogado, comprovariam que a empresa usou dinheiro de uma "conta corrente" de propinas para comprar um terreno supostamente destinado ao Instituto Lula, que cuida do acervo histórico do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

As conversas apresentadas, datadas de julho de 2010 até março de 2012, mostram como executivos da Odebrecht supostamente buscaram esconder as transações e se preocuparam em não expor a empresa como real compradora do imóvel. As mensagens também mencionam pessoas e empresas que teriam sido usadas como intermediárias da Odebrecht e de Lula na transação.

Odebrecht teve seu acordo de delação premiada validado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em janeiro de 2017. Segundo sua defesa, os e-mails só foram entregues agora porque, com o empresário em prisão domiciliar desde dezembro, ele enfim teve acesso ao conteúdo de um notebook apreendido pela Polícia Federal ainda em 2015.

Segundo a defesa de Lula, a apresentação dos e-mails é "extemporânea" e contém "vícios que poderão anular o processo". Os advogados dizem que "Lula jamais solicitou ou recebeu a propriedade ou a posse de qualquer imóvel para o Instituto Lula" e negam que "qualquer recurso ilícito tenha sido direcionado a Lula".

Em seu interrogatório no processo, Lula confirmou ter visitado o terreno, mas disse que não se interessou pela compra. O Instituto Lula nunca chegou a funcionar no local.

O empresário e o ex-presidente são réus em processo da Operação Lava Jato sobre a compra do terreno, no valor de R$ 12,4 milhões. Segundo a acusação feita pelo Ministério Público Federal, a transação funcionou como pagamento de propina da Odebrecht a Lula. Em troca, ele teria atuado para beneficiar a empresa em contratos com a Petrobras. 

"Estamos batendo na trave"

Nenhuma das conversas menciona nominalmente Lula. No entanto, em uma troca de mensagens datada de 8 de novembro de 2010, no fim do segundo mandato do petista, Odebrecht reclama da publicação de uma notícia segundo a qual o Instituto Lula teria "patrocinadores e sede", sem citar quem seriam. 

Em um dos e-mails, Odebrecht cita um "Italiano" --que, segundo o empresário, é o ex-ministro Antonio Palocci-- e pede para executivos do grupo prepararem uma estratégia de comunicação para o caso de algum "repórter xereta" chegar ao nome da DAG, empresa acusada de ter sido usada como laranja pela Odebrecht para a compra do terreno.

"Já avisei ao Italiano que estamos batendo na trave! Este pessoal não tem responsabilidade. Como algum repórter xereta pode acabar chegando na DAG acho importante preparamos a história/estratégia de comunicação (ou de não comunicação) deles", diz a mensagem de Marcelo Odebrecht.

Em depoimento a Moro, o dono da DAG, Demerval Gusmão, confirmou que comprou o terreno a pedido da Odebrecht, mas que soube apenas depois da compra que o local seria destinado ao Instituto Lula. Ele também é réu no processo.

Adriano Vizoni - 20.dez.2016/Folhapress
Terreno em São Paulo que teria sido comprado para o Instituto Lula

"Não pode deixar rastro óbvio"

Em outra troca de mensagens de 13 de agosto de 2010, Marcelo Odebrecht conversa com os executivos do grupo Paulo Melo e Paul Altit, que também são delatores. Altit diz: "Marcelo, volto a insistir o que tenho dito ao [Marcos] Grillo e ao Paulo [executivos do grupo e delatores]. A relação do cliente com o proprietário estruturado do ativo precisa ser a prova de fogo. Não pode deixar rastro óbvio."

Em setembro, quando interrogado por Moro no processo, Melo disse que a compra do terreno "seria a forma mais estúpida para se pagar uma propina", e que Odebrecht nunca lhe disse que a transação seria voltada para o pagamento de vantagem indevida.

O e-mail de Altit é uma resposta a uma mensagem de Odebrecht pedindo para que os executivos da Odebrecht Realizações Imobiliárias falassem sobre "dificuldades/riscos que estão vendo para o prédio instituto". 

Giuliano Gomes - 1º.set.2015/Folhapress
O empresário Marcelo Odebrecht

Os pagamentos pelo departamento de propinas

Ao anexar os e-mails, a defesa de Marcelo Odebrecht destaca uma mensagem do empresário, datada de 9 de setembro de 2010, em que diz a Paulo Melo que a despesa com a compra do terreno (R$ 3.173.760) deveria ser debitada de contas controladas pelo "departamento de propina" da construtora.

Em agosto do ano passado, o MPF (Ministério Público Federal) entregou à Justiça documentos segundo os quais a Odebrecht usou seu departamento de propinas para pagar parte do terreno. Os pagamentos apresentados pelo MPF somam justamente uma quantia de pouco mais de R$ 3 milhões.

Segundo os procuradores, a Odebrecht usou empresas em paraísos fiscais para fazer os pagamentos. De acordo com as informações coletadas no Drousys, um dos sistemas usados pela companhia para gerenciar suas propinas, foram feitos três pagamentos de aproximadamente R$ 1 milhão entre outubro e novembro de 2010. Pelo menos parte do dinheiro tinha como destino uma empresa de Mateus Baldassari, um dos donos do terreno, também registrada em um paraíso fiscal.

Outro lado

A defesa de Lula põe em dúvida a veracidade das informações dos sistemas usados pela Odebrecht para gerenciar o pagamento de propinas. Os advogados do ex-presidente contestam as informações em processo que corre em segredo de Justiça.

"Perícia contratada pela defesa de Lula também constatou que documentos anteriormente juntados por Marcelo Odebrecht e que estão sendo usados pelo Ministério Público Federal contêm elementos que permitem afirmar que não são inidôneos. O assunto é discutido em incidente de falsidade ainda pendente de julgamento", diz o advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins.

A defesa informa que vai solicitar a retirada dos documentos do processo. "Além dos vícios que poderão anular o processo, os documentos juntados hoje por Marcelo Odebrecht em nada mudam a realidade de que Lula jamais solicitou ou recebeu a propriedade ou a posse de qualquer imóvel para o Instituto Lula. Tampouco demonstram que qualquer recurso ilícito tenha sido direcionado a Lula", afirma Martins.

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