Operação Lava Jato

Soma de indícios e delações pode condenar, diz chefe da 2ª instância do MP

Nathan Lopes

Do UOL, em Porto Alegre

  • Nilton Fukuda - 22.jan.2018/Estadão Conteúdo

    O julgamento do recurso será na próxima quarta-feira (24) no TRF-4

    O julgamento do recurso será na próxima quarta-feira (24) no TRF-4

Elementos diversos que comprovem um crime podem ser usados para condenar alguém. Essa é a avaliação de Carlos Augusto da Silva Cazarré, procurador-chefe da PRR-4 (Procuradoria Regional da República da 4ª Região), a segunda instância do MPF (Ministério Público Federal).

"O Código de Processo Penal expressa a respeito disso: um conjunto de indícios pode condenar. Então, eu tenho, eventualmente, um depoimento de delator, mas eu tenho outros elementos de convicção que levam a um juízo de convicção, de certeza", disse em entrevista ao UOL.

Cazarré comanda a PRR-4 desde outubro do ano passado, mesmo mês em que o procurador regional Mauricio Gotardo Gerum apresentou seu parecer a respeito da apelação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contra a sentença em que foi condenado à prisão no processo do tríplex. Gerum sugeriu que a pena de Lula fosse aumentada. O julgamento do recurso será na próxima quarta-feira (24) no TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região).

Em sua reclamação contra a sentença, a defesa de Lula tem pontuado que o petista foi condenado apenas com base em palavra de uma pessoa, no caso, o ex-presidente da empreiteira OAS Léo Pinheiro. O petista costuma dizer que foi julgado sem provas, somente a partir de "convicções". Moro, porém, considerou outros indícios para embasar sua sentença, como a reforma e a decoração do apartamento, pertencente à empresa e que seria uma vantagem indevida a Lula em função de um esquema de corrupção envolvendo três contratos entre a OAS e a Petrobras.

Dida Sampaio/Estadão Conteúdo
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O procurador-chefe conversou com UOL em seu gabinete na PRR-4 na segunda-feira (22) sem citar especificamente o processo do ex-presidente. Cazarré explicou que, pela lei, a palavra de um delator não dá base a uma sentença. "Se isso estiver isolado da prova, aí não posso obter a condenação. Agora, se eu tenho outros elementos que confirmam aquilo, que mostram que aquilo é verdadeiro, é um elemento a ser considerado também".

Cazarré vê ainda uma resistência por parte da população a novos métodos de investigação, como acordos de colaboração. "Isso é natural. O primeiro impacto da delação premiada para o nosso sistema jurídico é grande: 'ah, o Estado vai negociar com bandido?' Essa reação já ocorreu".

A experiência vai mostrando que certos modelos de criminalidade modernos precisam de sistemas de investigação modernos também

Carlos Augusto da Silva Cazarré, procurador-chefe da PRR-4

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Defesa da delação e do Judiciário

Para o procurador-chefe, delações, cooperação internacional e acesso a dados bancários e fiscais, por exemplo, são medidas que, aos poucos, a legislação vem incorporando no sentido de combater a criminalidade. "Nessa operação [Lava Jato], a gente viu isso. O dinheiro em praticamente todos os casos era encontrado no exterior".

Cazarré acredita que a lei de delação é boa e que será aprimorada com o tempo. "O filtro fino é feito pela jurisprudência. As leis precisam se adaptar à realidade. E quem faz isso é o Judiciário, nos dando as balizas".

Para ele, o MPF é a única instituição que pode negociar acordos que, eventualmente, abram mão de determinada punição em favor de informações, como no caso das delações. "Isso sempre com a cooperação da autoridade policial. Ela tem seu papel na investigação, mas quem tem efetivamente a responsabilidade para negociar um eventual benefício tem que ser o titular da ação penal".

Também membro da força-tarefa que analisa a Lava Jato na PRR-4, Cazarré acredita que a operação evidenciou que é preciso rever o sistema de financiamento de campanhas. "Temos que barateá-las, elas têm que ser mais acessíveis, para não haver estratagemas por recursos".

O procurador-chefe avalia haver um exagero nas críticas contra o Judiciário. Ele acredita que precisaria haver um comedimento "para não acirrar ânimos". "Um juiz, para demonstrar a responsabilidade de alguém, ele gasta um raciocínio gigantesco. Às vezes, são páginas e páginas para mostrar por que está condenando. E as pessoas, às vezes, querem levar essa informação imediatamente em duas linhas".

Cazarré ressalta que a atuação do Ministério Público é estritamente técnica. "A gente tem procurado se basear em cima de fatos. É importante as pessoas examinem essas questões antes de fazerem análises políticas".

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