Aos 83, mesário mais antigo de SP já nem sabe em quantas eleições trabalhou

Marcelo Freire

Do UOL, em São Paulo

  • Junior Lago/UOL

    Ary Prizant não se considera um exemplo por trabalhar no pleito: "temos que colaborar"

    Ary Prizant não se considera um exemplo por trabalhar no pleito: "temos que colaborar"

Pesquisa Ibope divulgada em 23 de setembro mostra que  quase metade dos eleitores brasileiros --46% dos entrevistados-- diz ter pouco ou nenhum interesse nas eleições de 2014. Mas não são todos que podem escolher ficar de fora do pleito em 5 de outubro. Uma parcela significativa do eleitorado é convocada pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para exercer a função de mesário.

Segundo o TSE, os 142 milhões de eleitores brasileiros contarão com o auxílio de 2,4 milhões de mesários, dos quais 1,3 milhão se apresentou de forma voluntária. Um deles é o advogado Ary Prizant, 83, o mesário mais antigo da cidade de São Paulo e que nem consegue precisar em quantas eleições já atuou na função.

Hoje na posição de primeiro mesário, Prizant foi presidente de seção eleitoral e também trabalhou na junta apuradora na época que as eleições ainda não contavam com urna eletrônica. Ele estreou na função em 1953, no pleito municipal que elegeu Jânio Quadros prefeito de São Paulo.

"Fiquei orgulhoso e mostrei para os colegas a convocação. A eleição era uma festa cívica, com distribuição de pentes, canetas, todo tipo de brinde dos candidatos, e uma fila enorme para votar. Me apresentei à seção e um senhor me mostrou como funcionava o trabalho. Depois disso, sempre continuei colaborando", diz Prizant, recordando que a cidade contava com apenas seis zonas eleitorais na época --hoje, são 422.

O mesário recorda que a ampla distribuição de brindes era uma das maiores diferenças da eleição em relação a hoje e vê de forma saudosa a época em que itens como chaveiros, réguas, lixas de unha, porta-documentos e abridor de garrafas --alguns ele até guarda em seu escritório-- eram entregues aos eleitores. "E hoje você percebe que, mesmo com tudo isso proibido, os candidatos gastam até mais nas campanhas", diz.

Junior Lago/UOL
Prizant mostra um abridor de garrafa, brinde de um candidato em uma eleição passada; hoje, itens são proibidos

Outra diferença, logicamente, é a instituição da urna eletrônica, a partir das eleições municipais de 1996. Apesar de também lembrar com carinho da época das cédulas de votação e do trabalho na junta apuradora, que durava alguns dias para contagem dos votos que decidiam o vencedor, Prizant não tem restrições à chegada da eletrônica.

"O resultado sai quase imediatamente. E na época do voto no papel tínhamos que contar com uma parafernália da PM para acompanhar a urna antes do início da apuração. Hoje é muito mais fácil e rápido", afirma.

Apesar da dedicação como voluntário, o advogado diz não se considerar um exemplo por atuar no apoio ao processo eleitoral. "Sou apenas brasileiro e patriota. Temos que colaborar com tudo que for bom para o país, não só na eleição."

"Fã incondicional"

A atual colaboração como mesário voluntário ilustra o quanto Prizant, como cidadão, se interessa pelo cenário político do país. Por um curto período, no fim da década de 1950, chegou a ser filiado ao extinto PSP (Partido Social Progressista), mas logo voltou ao papel de observador. Depois, foi um dos eleitores do presidente que mais admirou: Juscelino Kubitschek (1956-1961). "Votei porque ele prometia 50 anos em cinco. E cumpriu."

Mas o que o apaixona no processo eleitoral, de verdade, é o aspecto democrático da escolha de seus representantes, que ele considera um dever de todos.

"A eleição é para todos. O valor do voto é o mesmo, tanto do milionário quanto do pobre. Essa é a essência da democracia. Se você quer manter a democracia no Brasil, tem que votar. Se não, não pode criticar. A democracia é a política, e vice-versa. Não concordo com o que você faz ou fala, mas tenho obrigação de brigar para que você tenha direito a sua opinião. Eu sou fã incondicional da democracia. Mesmo com erros, que continue assim", resume.

O trabalho de Prizant como mesário tem herdeiros --a neta Laura, 19, estudante de direito, foi convocada e participará no pleito de 2014. No próximo dia 5, o veterano estará lá preparado, tanto para o trabalho quanto para o voto. E já escolheu os candidatos a presidente, governador, senador, deputado federal e deputado estadual que receberão seu apoio.

"Já tenho os cinco, mas mesmo assim faço a 'colinha' para levar no dia. Sei que alguns não vão se eleger, mas mesmo assim tenho que votar. Muitos deixam de votar em alguém porque essa pessoa não vai ganhar. Para esses eleitores, eu digo que eleição não é corrida de cavalo, não tem que apostar no ganhador."

Benefícios

Quem atua como mesário recebe dispensa do trabalho pelo dobro dos dias prestados à Justiça Eleitoral, auxílio-alimentação para o dia da eleição, vantagem em situações de empate em concurso público (caso previsto em edital) e créditos em disciplinas de cursos superiores, se as instituições estiverem conveniadas com os tribunais regionais eleitorais.

Veja também

UOL Cursos Online

Todos os cursos