17/08/2010 - 21h27

Marqueteiros dão show na arte de remodelar candidatos

Mauricio Stycer
Crítico do UOL

Se o maior objetivo da propaganda eleitoral gratuita é apresentar o candidato ao eleitor que não o conhece, os principais nomes na disputa pela Presidência foram muito bem no primeiro dia. O sisudo José Serra virou Zé, amigo do povo. A durona Dilma Rousseff se transformou em Dilma, a mãe do povo. E à doce Marina Silva coube o papel de, com alarme, anunciar o apocalipse do planeta.

Como já acontece há muito tempo, a campanha presidencial é uma vitrine privilegiada para a exibição do poder e da eficiência dos maiores marqueteiros do país. A novidade nesta eleição parece ser a coincidência de os três candidatos principais estarem sendo submetidos a um processo tão visível de reconstrução de imagem.

No caso de Serra, a transformação foi radical, sem nenhuma transição. No programa de abertura, o ex-governador, ex-prefeito e ex-ministro virou Zé. Sem mais. Oposição? Situação? Quem é o Zé? Nada resume melhor o impacto desta reconstrução que o sambinha apresentado por um grupo de músicos populares no primeiro programa do candidato: “Quando o Lula da Silva sair é o Zé que eu quero lá”.

À noite, no segundo programa, Zé voltou a ser Serra e fez promessas na área de saúde, enfatizando a imagem antiga que o notabilizou, de político com competência de técnico.

A remodelação de Dilma se deu de forma um pouco menos abrupta. Com dez segundos de programa, Lula apareceu pela primeira vez, apresentando a candidata. Diferentemente de Serra, cuja biografia passou feito um foguete, a da candidata foi relatada com calma – incluindo depoimentos do ex-marido, de uma companheira de prisão e de ex-chefes. Igualmente, a luta contra a ditadura foi abordada de frente, ainda que sem esclarecer dúvidas sobre o seu papel na resistência armada.

À noite, Dilma virou “mãe do povo”. Em diálogo permanente com o “pai” Lula, prometeu fazer “o que precisa ser feito” com o “cuidado de mãe”.

Já Marina, cuja identidade com a causa ambiental brasileira é conhecida, optou por apresentar um panorama global do problema. Falou em “planeta”, em elevação do nível dos “oceanos”, “destruição” e “reequilíbrio”. Com bem menos tempo que os rivais, deixou no ar mais medo e alarme do que soluções – uma imagem bem diferente da que a notabilizou. À noite, voltou a ser doce Marina que seus antigos eleitores conhecem.

É possível que alguém sinta saudades de Dilma quando ela não arrumava tanto o cabelo ou de Serra quando ele não sorria? Ao apostar nos novos eleitores, os marqueteiros parecem esquecer dos antigos. Isso faz alguma diferença? Temos 44 dias para ver.
 

Sites relacionados

Siga UOL Eleições

Hospedagem: UOL Host