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28/08/2008 - 08h00

Falta de transporte adaptado é principal problema das pessoas com deficiência em São Paulo

Bárbara Paludeti
Em São Paulo
Calçadas esburacadas, carência de transporte público adaptado e falta de pessoal capacitado, estes são os principais problemas que as pessoas com deficiência enfrentam na cidade de São Paulo, segundo instituições que trabalham com este público.

PROMESSAS

Conheça as propostas dos principais candidatos a prefeito de São Paulo para as pessoas com deficiência

De acordo o censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 2000, 24,5 milhões de pessoas (14,5% da população) no país declararam ser portadoras de alguma deficiência. Na cidade de São Paulo, segundo informações da SMPED (Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida), 10,32% da população apresentam algum tipo de deficiência, o que corresponde a cerca de 1,5 milhão de pessoas. De acordo com um levantamento de 2004, feito nas 31 subprefeituras da cidade, cerca de 453 mil pessoas possuem deficiência física ou motora, 131 mil têm deficiência mental, 247 mil são portadoras de deficiência auditiva e 687 mil têm deficiência visual. Conheça a descrição de cada tipo de deficiência aqui.

Apesar de a Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispor sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência e sua integração social, como atendimento preferencial, construções acessíveis, acesso irrestrito à educação, condições de formação profissional, não é bem assim que as coisas funcionam.

  • Jefferson Coppola/Folha Imagem

    Apenas 18% da frota total de ônibus da cidade de São Paulo é adaptada

De acordo com a SMPED, a frota de ônibus da cidade de São Paulo é de 15.000 carros, destes, cerca de 2.700, o corresponde a apenas 18%, são adaptados para pessoas com deficiência. Além disso, ainda de acordo com a secretaria, estão disponíveis 9.118 livros em braile e 2.233 audiolivros, distribuídos nas sete bibliotecas públicas da cidade.

Na Fundação Dorina Nowill para Cegos, que produz títulos em braile e distribui para bibliotecas, em 2007 foram feitos 3.453 títulos, dentro deste número entram diversas coisas, como a chamada prestação de serviços que são a confecção de cardápios, por exemplo, e também livros didáticos e de literatura. A média anual de produção de títulos de literatura e didáticos é de 150. Também há o Livro Digital Acessível, que foram distribuídos 7.000 exemplares em 2007. Este livro tem tanto texto ampliado, quanto voz, navegação, busca e acionamento opcional de nota de rodapé. Os livros falados, que os pedidos são atendidos sob demanda, foram feitos cerca de 332 títulos e mais 252 gravados de best-sellers.

Há também o serviço de transporte Atende, do tipo porta-a-porta, gratuito, destinado a pessoas com deficiência física e alto grau de comprometimento da mobilidade, impossibilitadas de utilizar outros meios de transporte público para atendimento regular de reabilitação. São disponibilizados 278 carros, que fazem cerca de 52.500 atendimentos por mês, número insuficiente já que há mais de 1,5 milhão de pessoas portadoras de deficiência na cidade.

A Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, realizada pela ONU (Organização das Nações Unidas) em dezembro de 2006 coloca o tema da deficiência no patamar dos direitos humanos. "Creio que o tema é tirando, definitivamente, do campo da filantropia, do assistencialismo e do paternalismo", aponta a coordenadora executiva da ONG Amankay, Marta Gil. Mais de 30 países ratificaram a convenção --dentre eles o Brasil.

Problemas da cidade

Como estamos em tempos de eleições municipais, a reportagem do UOL conversou com quatro instituições que realizam diversos tipos de trabalho ligados ao público portador de deficiência e conseguiu definir os principais problemas e dificuldades que esta parcela da população enfrenta.

O vice-presidente institucional da Avape (Associação para Valorização e Promoção de Excepcionais), instituição que realiza trabalhos com pessoas portadoras de todos os tipos de deficiências, Carlos Ferrari, destaca a questão do transporte adaptado como a mais crítica a ser tratada pelo próximo prefeito. "Ele [próximo prefeito] precisa ser mais rígido em relação à frota, as mudanças precisam ser mais rápidas", afirma.

"Se eu falo que eu vou botar 35 ônibus, tenho que botar, não deve ser apenas promessa de campanha", pondera a coordenadora executiva da ONG Amankay.

Ferrari também aponta a necessidade de articulação com os municípios vizinhos como fundamental para tornar a vida do deficiente mais fácil, pois aquele que anda de ônibus em várias cidades diferentes, tem que ter diferentes carteirinhas de gratuidade.

  • Fernando Donasci/Folha Imagem

    Calçada desnivelada no bairro do Pacaembu dificulta vida dos cadeirantes

"Acredito que o maior problema em termos de mobilidade são as calçadas da cidade. É uma coisa terrível, até as pessoas saudáveis tropeçam. O problema das calçadas é gritante", aponta a presidente do Instituto Brasil Acessível, Sandra Perito. E ela também cita o transporte público adaptado como necessidade urgente, e destaca que não é apenas colocar rampas em ônibus que resolve o problema. "As barreiras não são só físicas, mas também de atitude das pessoas", diz Perito.

As pessoas que lidam com os deficientes, seja no transporte coletivo, sejam funcionários de empresas públicas e privadas que fazem atendimento ao público e até mesmo os próprios cidadãos, não estão treinados e/ou acostumados para lidar com este tipo de situação. "A minha sugestão para o próximo prefeito é a de capacitar as pessoas, não só a estrutura física, de equipamentos, de ambiente, mas sim os funcionários que estão interagindo com a população que apresenta algum tipo de deficiência", afirma a presidente do Instituto Brasil Acessível. Ela ainda diz que este treinamento de pessoal, que poderia incluir campanhas de conscientização, seria simples e com um custo muito menor do que fazer quilômetros de calçadas, por exemplo.

Para o diretor clínico e superintendente técnico da AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente), que cuida também de adultos, Antônio Carlos Fernandes, uma das áreas mais problemáticas da cidade são os locais para tratamento das pessoas com deficiência. "Temos estes locais, mas é um número insuficiente, não conseguimos oferecer para a população, não temos locais adequados suficientes. O Estado não consegue e a AACD não consegue atender todo mundo", destaca.

Fernandes também cita a carência de transporte adaptado, aponta que o Programa Atende é insuficiente e fala da pouca acessibilidade em metrôs, prédios públicos e privados. "Melhorou, mas muito precisa ser feito", afirma.

A Lei Federal 8.213/91 impõe que empresas com 100 ou mais empregados estão obrigadas a preencher de 2% a 5% de seus cargos com pessoas portadoras de deficiência. Com esta medida, houve uma grande melhoria na oferta de empregos para as pessoas portadoras de necessidades especiais. "O programa de cotas nas empresas deu bastante resultado, porque há também uma fiscalização efetiva", destaca Ferrari, da Avape.

Já o diretor da AACD argumentou que há empregos que exigem qualificação sobrando para as pessoas com deficiência. "A maioria não tem acesso a tratamento, não tem transporte adequado, não consegue escolaridade, portanto, não arruma emprego", explica.

Além do acesso arquitetônico, há a questão da comunicação, como a disponibilidade de livros em braile e audiolivros. Na cidade de São Paulo, desde 1997, os restaurantes, bares, lanchonetes e hotéis devem disponibilizar cardápios em braile para pessoas com deficiência visual, mas são poucos os que cumprem a lei.

Vontade política

O presidente institucional da Avape acredita que o potencial das associações que já trabalham com deficientes deve ser mais bem aproveitado pelo próximo prefeito. "Pode ser com o repasse de recursos, por exemplo. Estas instituições já possuem cursos de capacitação profissional e projetos de auxílio e integração do deficiente com a sociedade, por isso creio que deve haver uma ação mais articulada com a prefeitura da cidade de São Paulo", afirma.

O Instituto Brasil Acessível fez um estudo com a COHAB (Companhia Metropolitana de Habitação) para o projeto do primeiro prédio totalmente dentro dos critérios de mobilidade universal. Mas ele não foi construído e ficou parado apenas no papel. "Tem vontade, quer fazer, mas a coisa não se concretiza, por uma falta de vontade política, de determinação ", conclui Sandra Perito, do Instituto Brasil Acessível.

Segundo a assessoria de imprensa da COHAB, mais de 3% das construções da companhia, que é o que a lei exige, estão dentro dos critérios de mobilidade universal, tendo até mais do que a ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) pede.

"A participação do Executivo é muito importante, ele tem que ter uma equipe bem estruturada que tenha conhecimento das necessidades das pessoas com deficiência e trabalhar para atendê-las", afirma Ferrari, da Avape. Já Perito acha que, apesar de estar acontecendo muitas movimentações em prol das pessoas com necessidades especiais, a quantidade de ações está aquém do esperado. "A cidade de São Paulo não vai ser totalmente acessível nunca. Isso é utopia", conclui.

Fernandes, da AACD, propõe a criação de uma rede. "Uma networking de pequenos centros de reabilitação, o tratamento principal é feito nas grandes instituições, e o tratamento de manutenção, a pessoa faz próximo da casa dela. A dificuldade tem que ser minimizada", completa.

"Nós já aprendemos que tudo que é bom para as pessoas com deficiência é bom para todo mundo", finaliza Marta Gil, da ONG Amankay.

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