Greca e Leprevost querem mudar tarifa de ônibus e renovar frota em Curitiba

Rafael Moro Martins

Colaboração para o UOL, em Curitiba

  • Prefeitura de Curitiba

Na disputa para ver quem irá comandar a cidade que um dia foi apontada como modelo em transporte público, Rafael Greca (PMN) e Ney Leprevost (PSD) buscam seduzir o eleitor curitibano com propostas de trocar os ônibus atuais por outros mais modernos, movidos a energia solar e biogás, ou a redução imediata da tarifa --que atualmente custa R$ 3,70-- em R$ 0,15.

No ano passado, o transporte coletivo de Curitiba transportou 18,29% menos passageiros do que em 2000, segundo a prefeitura. Na contramão, as frotas de automóveis e motocicletas dispararam 92,61% e 242,67%, respectivamente, de acordo com dados do Detran-PR (Departamento de Trânsito do Paraná).

O sistema de ônibus vive crise sem precedentes. As empresas não compram ônibus para renovar a frota desde 2012, amparadas por decisão judicial. A integração entre linhas municipais e metropolitanas foi parcialmente desfeita por conta de desentendimento entre o governador Beto Richa (PSDB, apoiador de Greca) e o prefeito Gustavo Fruet (PDT, que buscou e perdeu a reeleição).

Para fazer frente ao cenário, Greca promete refazer a integração com o transporte metropolitano --usando o bom relacionamento com Richa-- e "renovar e qualificar" a frota de ônibus. Durante debate promovido pelo jornal "Gazeta do Povo", sonhou grande: "Quero pensar em ônibus solares ou movidos a biogás ou híbridos". 

Ele também promete uma tarifa diferenciada, mais barata, em horários de menor demanda, de forma a tentar reduzir a lotação dos ônibus, e fala em implantar sistemas de veículos leves sobre pneus em novos eixos de transporte, ainda a definir.

Reprodução/Facebook e Rodrigo Félix Leal/Estadão Conteúdo
Rafael Greca (PMN) e Ney Leprevost (PSD) disputam 2º turno

Leprevost também afirma que voltará a integração com as linhas metropolitanas. Para isso, aposta no colega de partido e cabo eleitoral Ratinho Junior, que é secretário estadual do Desenvolvimento Urbano e tem sob sua tutela a Comec, empresa responsável por gerir o transporte metropolitano. Ainda que funcionário de Richa, Ratinho Junior (filho do apresentador do SBT) não apoia o governador, a quem vislumbra suceder em 2018.

Mas a principal promessa do candidato do PSD é reduzir em R$ 0,15 a tarifa nos primeiros dias de governo. Diz que fará isso acabando com o repasse de 4% de cada passagem para a Urbs, empresa municipal que gerencia e fiscaliza o sistema de ônibus da cidade. Por fim, quer colocar veículos leves sobre trilhos para rodar nas vias férreas que cortam partes de Curitiba.

Críticas

Especialistas no assunto ouvidos pelo UOL duvidam da viabilidade do que propõem ambos os candidatos. "Soam mais como opiniões do que como decisões fundamentadas", afirma Carlos Hardt, arquiteto, urbanista e professor da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná). "Eles chutam", critica Valter Fanini, vice-presidente do Sindicato dos Engenheiros do Paraná e coordenador, por 20 anos, do sistema de transporte público e do sistema viário da região metropolitana de Curitiba na Comec. 

"A redução de passageiros no transporte público não tem causa única. A facilidade para a compra de automóveis, em anos passados, e a atual crise econômica, que reduz os deslocamentos, são dois dos principais motivos. É um problema bastante complexo, que não será resolvido com medidas simplistas", afirma Hardt. 

"A situação exige esforços de gestão que tragam vantagens para o cidadão preferir o transporte público. Mas qualquer proposta sem aprofundamento, sem estudos de impacto, é temerária. E duvido que os candidatos tenham em mãos estudos técnicos suficientes", critica o professor da PUC-PR.

"Curitiba ainda não tem um plano de mobilidade estruturado, que faça jus ao que preconiza o Ministério das Cidades. Fazer um, que abarque a capital e os 14 municípios que formam a mesma malha urbana, seria um bom começo. Enquanto isso, tudo o que propõem os candidatos é sofisma", argumenta Fanini.

A conta não fecha

A integração entre as linhas de ônibus de Curitiba e entorno começou nos anos 1990. Com a queda na demanda de passageiros, que tornou o sistema deficitário, Beto Richa decidiu, em 2012, pagar um subsídio anual de R$ 64 milhões, em valores da época, à Urbs, que então gerenciava todo o sistema.

O socorro estadual foi feito sob medida para o aliado Luciano Ducci (PSB), sucessor de Richa na Prefeitura de Curitiba, que disputava a reeleição. Mas Ducci perdeu para Gustavo Fruet, desafeto do governador, que passou a dizer que o subsídio era apenas um "socorro momentâneo" ao sistema.

Sem que chegassem a um acordo a respeito, prefeitura e Estado passaram a cuidar cada um dos percursos sob sua responsabilidade. Com isso, muitas linhas que permitiam a moradores de cidades vizinhas chegar a Curitiba e tomar outros ônibus pagando uma só passagem deixaram de existir.

É incerto se o governo do Estado --que já enfrenta greve dos professores por não ter concedido reajuste salarial em 2016-- vai retomar o subsídio. O UOL fez a pergunta ao Palácio Iguaçu, mas, como resposta, ouviu apenas que não haveria pronunciamento a respeito por se tratar de "assunto de campanha eleitoral". 

Vagner Rosario/Futura Press/Estadão Conteúdo
Capital teve greve no início de 2015 por conta de reajuste salarial
Reajuste e renovação

Mais longínqua ainda parece a possibilidade de conciliar a redução --ainda que parcial-- da tarifa com a retomada da compra de ônibus novos, uma promessa dos dois candidatos. 

O Setransp, sindicato que reúne os donos das viações que operam em Curitiba e região, é taxativo: "A tarifa que as empresas recebem [atualmente] é insuficiente para cobrir os custos do sistema e, portanto, para realizar um investimento como a compra de novos ônibus", informou, via assessoria de imprensa.

Quem quer assuma a prefeitura terá ainda pela frente, em fevereiro, a discussão do reajuste salarial de motoristas e cobradores de ônibus. É habitual que o aumento nos vencimentos dos trabalhadores seja seguido por uma passagem mais cara. 

Resta ver como Greca --que já falou que reajustar a tarifa "é um espinho no coração de qualquer prefeito"-- e Leprevost --que promete não só não aumentá-la, como também reduzi-la-- irão agir, se eleitos.

Por outro lado, os dois são cautelosos quando questionados sobre a possível revisão do contrato de 15 anos firmado com as empresas, em 2010, após licitação aberta por Richa (então prefeito) e homologada por Ducci. Ele já foi questionado por uma CPI aberta na Câmara Municipal e por um acórdão do TCE (Tribunal de Contas do Estado) que, em 2015, pediu que 14 itens fossem retirados da planilha de custos --o que, na prática, poderia permitir a redução da tarifa. 

Mas isso significaria ter de bater de frente com as empresas de transporte. Greca propôs um debate que reúna o Ministério Público e "todas as partes envolvidas no setor do transporte público" para que se chegue a um consenso sobre a cobrança.

Leprevost diz que irá "abrir a caixa-preta da Urbs". "Isso é algo que todo prefeito promete e não cumpre: dar transparência ao processo de gestão tarifária. Hoje, não se conhecem os parâmetros, nem como eles são monitorados", critica Valter Fanini.

Paulo Lisboa/Brazil Photo Press/Agência O Globo
Dilma lança edital para licitação de construção do metrô de Curitiba
E o metrô?

Anunciado por três vezes pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e prometido, em 2012, pelo então candidato Gustavo Fruet, o metrô curitibano, que funcionaria sob a gestão da prefeitura, ainda é apenas um projeto --e incompleto. E deve prosseguir assim, a depender de Rafael Greca ou Ney Leprevost --ainda que o primeiro não descarte totalmente tocar o projeto, caso haja dinheiro federal para isso.

Em lugar do metrô, os candidatos propõem veículos leves sobre pneus ou sobre trilhos --cuja capacidade é menor do que a dos trens.

"O descarte do metrô é uma alternativa simplista. Para fazer isso, é preciso haver um suporte técnico grande, coisa que eles não parecem ter", avalia Carlos Hardt. "É um equívoco", concorda Valter Fanini. "É preciso, ao menos, concluir os estudos para que não se perca a chance quando o país tiver dinheiro para financiá-lo."

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