Candidato tucano em Porto Alegre, Marchezan Jr. não descarta privatizações

Flávio Ilha

Colaboração para o UOL, em Porto Alegre

  • Divulgação

    Marchezan aparece em terceiro lugar na pesquisa, empatado tecnicamente com Sebastião Melo

    Marchezan aparece em terceiro lugar na pesquisa, empatado tecnicamente com Sebastião Melo

Último candidato a ser apresentado oficialmente para a disputa da prefeitura de Porto Alegre em 2016, o deputado federal Nelson Marchezan Jr. (PSDB) não esconde sua agenda liberal, embora diga que não se enquadra em rótulos de esquerda ou direita. O tucano defende a privatização de empresas públicas e diz achar que os problemas são mais de gestão do que estruturais e menciona constantemente a influência negativa de sindicatos, corporações e partidos na administração pública.

O UOL entrevistou os quatro candidatos à Prefeitura de Porto Alegre de acordo com pesquisa de intenção de voto do Ibope divulgada no dia 22 de agosto: Luciana Genro (PSOL, 23% das intenções de voto), Raul Pont (PT, 18%), Nelson Marchezan Junior (PSDB, 12%) e Sebastião Melo, com (10%). A margem de erro da pesquisa é de quatro pontos percentuais, para mais ou para menos, portanto Luciana e Pont estão tecnicamente empatados entre si, assim como Marchezan e Melo.

Ontem foi publicada a entrevista com Sebastião Melo; nesta segunda, será a vez de Pont (segunda-feira) e, no dia 6, a de Luciana.

 

Herdeiro do capital político do pai, deputado federal que apoiou a ditadura militar (1964-1985) pela Arena e posteriormente pelo PDS, Marchezan , Marchezan diz apostar na coerência de seu discurso e evita criticar as gestões passadas de Porto Alegre. Veja abaixo a entrevista concedida ao UOL pelo candidato:

UOL – A pesquisa de opinião mais recente (Ibope) colocou a sua candidatura como uma das postulantes ao segundo turno. É uma surpresa, considerando que o PSDB é um partido pequeno em Porto Alegre?
Nelson Marchezan Jr –Temos absoluta consciência de que é um retrato do momento, dentro de um critério metodológico de uma empresa. Mas ficamos contentes, é claro, porque a nossa candidatura foi a última a ser apresentada. E tem outro detalhe: sou deputado federal, ou seja, não estou presente nas questões da cidade e minha atuação parlamentar é muito focada na aplicação do dinheiro público. Não é uma pauta populista e nem popular. É uma pauta de gestão, dura, difícil de conversar com a população sobre isso.

Como vai encarar a disputa com candidatos tradicionais, conhecidos na cidade?
Nossa caminhada não tem peso morto, não tem problemas. Não tem nada estranho para defender na nossa coligação, nenhuma secretaria foi negociada, nenhum CC (cargo de confiança) foi exigido, nenhuma função gratificada sequer foi mencionada, nem um nome lembrado para alguma coisa, como dizem, muito especial. Então, está sendo tudo em altíssimo nível. Estamos lutando contra partidos que têm vinculações com sindicatos, com estruturas ligadas às máquinas municipal e estadual, o que nos leva a fazer uma campanha com a população.

A sua coligação tem apoio do PP, um dos partidos mais citados na Lava Jato (o candidato a vice na chapa é Gustavo Paim, do PP). Como esse tema vai ser tratado na campanha?
Com absoluta transparência. Nós não temos vigaristas de estimação. Se alguém tiver que ser processado, que seja. Se alguém tiver que ser condenado, que seja. Vamos seguir a linha de sempre. Tenho certeza de que os cidadãos que escutassem todas as nossas conversas (entre ele e o candidato a vice) iam ficar orgulhosos.

Não pode constranger o apoio de condenados na Lava Jato?
Com certeza vou ter gremistas ou colorados me apoiando que podem ter problemas judiciais.

Mas não é a mesma coisa, candidato. Estou falando de política, não de futebol.
Estamos falando de políticos.

Eu estou mencionando um partido, não políticos.
Eu fiz uma coligação com o PP de Porto Alegre. E a minha relação com esse partido foi límpida, transparente, leve, honesta e, diria até, bonita. Não tenho nenhum problema em ter o apoio do PP de Porto Alegre.

Reprodução/Facebook
5.ago.2016 - Cerimônia de oficialização da candidatura de Marchezan Júnior (centro). O vice-candidato a prefeito será o advogado Gustavo Paim, do PP. Também integram a coligação ao PMB e o PTC

Por mais que alguém possa achar que dois partidos grandes, como PSDB e PP, pudessem ter alguma conversa sobre espaço determinado para alguém, isso não ocorreu. Todos os compromissos de gestão, de transparência, de resultados, de combate à corrupção, são absolutamente avalizados, apoiados e vão ter iniciativas que virão do próprio PP.       

A sua candidatura pretende ocupar qual espaço entre os eleitores?
Da coerência. O meu discurso de hoje é o mesmo de um ano atrás, de um mandato atrás. E de uma década atrás. Então, eu mantenho uma linha.

Mesmo que se fale muito mal da política hoje, a sociedade está falando mais de política e está mais consciente. Esse momento é de respeito aos 16 anos de administração do PT (1989-2004), respeito a esse grupo político que administrou Porto Alegre por 12 anos (desde 2005), mas vivemos um momento de mudança.

É preciso dar uma nova oportunidade para Porto Alegre.

Pretende ocupar o mesmo papel do candidato do PMDB ao governo do estado em 2014 (José Ivo Sartori, que se elegeu em segundo turno), contra todos os demais candidatos?
Se for para ganhar a eleição, sim (risos). Não, na verdade não será nossa estratégia. Vamos mostrar um novo caminho, ter esperanças de transformar. Não tem prefeito hoje que vença os partidos, que vença os sindicatos e as corporações sem apoio da sociedade. Não vou ser o candidato anti alguma coisa.                 

Em termos de novidade, o PSOL também nunca administrou a cidade.
Mas simboliza os 16 anos de governo do PT. A forma de ver o Estado e a sociedade são as mesmas entre PSOL e PT. É a mesma forma com que governou o Brasil nos últimos 14 anos, a mesma forma com que governou o Rio Grande do Sul por oito anos (em dois mandatos) e a mesma forma da prefeitura, em 16 anos.

Qual é a social democracia que o senhor defende?
Não me enquadro muito nesses conceitos de esquerda e direita, nem nessa questão de liberal ou socialista. Eu diria que vou socializar os recursos públicos e incentivar o empreendedorismo.

O que é socializar os recursos públicos?
Hoje, os recursos estão concentrados nos interesses do menor número de cidadãos possível. Estão centralizados em poucas pessoas. Se tu tens 40% de carga tributária, que vai para o setor público, e a sociedade ainda é extremamente carente de serviços públicos, é porque temos alguém se beneficiando desses recursos. O Estado não consegue devolver para todos. Então, o grande mal da nossa sociedade é esse: os recursos públicos estão mal distribuídos.

O seu João e a dona Maria, por exemplo, não conseguem fazer lobby na prefeitura ou na Câmara de Vereadores.

Quem faz (lobby) são os partidos, os sindicatos.

Qual a principal crítica à gestão atual no município e o que fazer em relação a esse problema?
Para o cidadão, o que mais afeta seu dia a dia hoje em Porto Alegre, inequivocamente, é a falta de segurança pública. A cidade está dentro de um cenário nacional, de fronteiras abertas, e de um cenário estadual de falta de recursos para as polícias. Mas apresenta índices piores que aquelas com quem devemos ser comparados. Falta à prefeitura assumir de forma objetiva e prática que o problema também é do prefeito, na medida em que se sobressai a tantos outros e acaba se tornando grave. Falta atitude.

Como resolver?
Primeiro, ter atitude para dizer que, sim, esse é um problema do prefeito. Depois, combater a criminalidade dentro do setor público, dentro da própria prefeitura, com absoluta transparência.

E, por último, gerar empregos. Porto Alegre tem que ser uma cidade onde a iniciativa privada possa considerar um lugar legal para colocar o dinheiro dela. Não adianta tirar o cara das drogas, de uma forma permanente, se não oferecer a ele a porta do emprego.

Combater corrupção e desemprego são medidas de longo prazo, que não afetam a vida cotidiana do cidadão.
Também é preciso oferecer segurança nos serviços públicos municipais, como táxis, ônibus e espaços comuns da população, terminais viários, estações de metrô. Tem várias ferramentas para dotar esses serviços, especialmente de transporte, com segurança. Hoje não há nenhuma relação de trabalho conjunto entre as informações dos aparatos municipal, estadual e federal em Porto Alegre. Temos a metade dos furtos e roubos de veículos do Estado. Furto e roubo de carro, a princípio, é o primeiro crime para uma série de outras ocorrências.

Então, eu tenho a chance de monitorar isso com as câmeras e saber onde ocorre o roubo, qual é a rota de fuga, quais são o segundo e o terceiro crimes, qual é a imagem do criminoso. Esse aparato de acesso à vida real, que a prefeitura tem com suas câmeras, deveria ser interligado com a Polícia Civil, que tem inteligência investigativa. Mas não há nenhum protocolo de ações. Se conseguir interligar isso, tem um grande avanço na questão da informação, da tecnologia e da gestão na área da segurança.

Pode citar outra preocupação com os serviços municipais?
Outro problema, a meu ver, é na saúde, cujas filas para atendimento em algumas especialidades chegam a demorar dois anos, dois anos e meio. De novo, a ferramenta é a gestão da tecnologia. Porto Alegre, por exemplo, não dá bola para o serviço do Telesaúde, muito usado em outras cidades da região metropolitana. E por quê? Porque a prefeitura tem vários rachas, a segurança pública de Porto Alegre não fala com a segurança pública do Estado. A saúde pública de Porto Alegre também não fala com a saúde estadual.

Donaldo Hadlich/Framephoto
31.ago.2016 - Marchezan Jr (PSDB) participa de debate na Associação Comercial da cidade

Na sua opinião, não faltam postos de saúde para atender a população?
Sim, faltam. Mas é possível fazer mais com menos. Encher (o sistema) com médicos, com mais postos de saúde, mas manter a mesma metodologia, torna o custo desse sistema inviável.

Se administrar melhor, por exemplo, os 30% ou 40% de ausência nas consultas, os 20% de usuários que simplesmente não buscam seus exames, os 15% que não vão fazer o que foi prescrito, se isso for administrado no histórico de cada um, já melhora. Segundo os profissionais de saúde, 85% das pessoas atendidas na emergência do Hospital de Clínicas (zona central de Porto Alegre), têm smartphone. Essas tecnologias podem ajudar muito a administrar a saúde.

O senhor mencionou a questão do emprego. Qual o papel da prefeitura nesse aspecto?
Porto Alegre tem que se desburocratizar para gerar empregos e dar mais dignidade e melhorar o otimismo da população. É preciso em primeiro lugar entender por que as empresas estão saindo daqui e estão se instalando em cidades da região metropolitana. Estou falando de empresas de tecnologia, que precisam de mão de obra bem formada e acesso a infraestrutura de dados, de fibra ótica. Tem que saber por que essa empresa se constituiu aqui, cresceu aqui e foi embora daqui.

Hoje Porto Alegre tem um dos piores níveis de empreendedorismo do setor público no país. A oferta de serviços e a burocracia estão entre as piores. A nossa rua mais conhecida, mais charmosa, por exemplo, que é a rua da Praia, tem contêineres de lixo espalhados ao longo da via. Em plena rua da Praia. Então, temos muito que avançar.

Evandro Inácio G. dos Santos/Blog Minha Cidade
Rua dos Andradas, conhecida como rua da Praia

Haverá enxugamento da estrutura administrativa?
Com certeza o número de secretarias e gabinetes tem que diminuir. É muito grande, não se consegue despachar com 37 secretários. Não consegue verticalizar o problema.

A ideia é diminuir e melhorar a gestão. A prefeitura tem que aumentar os serviços públicos, tanto em termos de quantidade como em termos de qualidade. Então, pretendemos aumentar os serviços públicos. Mas não necessariamente contratar mais funcionários ou aumentar a máquina pública.

Mas isso não aumenta a despesa, candidato? São dois contratos no lugar de um só.
As despesas, claro, não podem aumentar. De alguma forma tem que melhorar a gestão. Uma empresa como a Carris (empresa pública de transporte de Porto Alegre) não pode dar R$ 50 milhões de prejuízo por ano se tem as melhores linhas. A Procempa (empresa municipal de processamento de dados) não pode dar R$ 50 milhões de prejuízo para pagar salários de R$ 30 mil, R$ 40 mil para seus diretores.

Ou seja, ela diz o que vai gastar e em cima disso fixa o preço para a prefeitura. O cidadão de Porto Alegre não trabalha para sustentar a Procempa.  

Há intenção de privatizar empresas públicas, como a Carris e a Procempa, mencionadas pelo senhor?
Nosso entendimento é de aumentar os serviços públicos, melhorar a qualidade e diminuir os custos. As empresas (públicas) podem ter um papel importante dentro desse padrão, mas vão ter que se enquadrar. A Procempa tem um núcleo de conhecimento importante para a gestão, mas não pode ter esse custo que mencionei. Não posso exigir que o cidadão se adeque ao custo que a Procempa quiser.

Isso quer dizer que o senhor admite privatizá-la?
Quer dizer que não há nenhum preconceito contra empresas públicas e nenhum preconceito em relação a privatizar. O que interessa é o melhor serviço ao menor custo. Tudo do serviço público, qualquer empresa, está nesse parâmetro.

Se for eleito, qual será sua primeira medida?   
Apresentar o projeto de reforma administrativa para tentar nos aproximar dos problemas da cidade através de uma estrutura menor de poder.

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