Agricultores reclamam de falta de investimento no Estado mais 'aecista'

Jefferson Puff

Enviado especial da BBC Brasil a Benedito Novo (SC)

  • BBC Brasil

    Técnico em agropecuária, Ricardo Ewald Jr. diz que não há antipetismo em Benedito Novo (SC)

    Técnico em agropecuária, Ricardo Ewald Jr. diz que não há antipetismo em Benedito Novo (SC)

Se dependesse só de Santa Catarina, o candidato Aécio Neves (PSDB) teria sido eleito o novo presidente do Brasil logo no primeiro turno, com 52,89% dos 3,7 milhões de votos depositados nas urnas pelos catarinenses. Dilma Rousseff (PT), ficou com 30,76% dos votos e 12,83% dos eleitores votaram em Marina Silva (PSB).

Embora demonstrações de apoio a Aécio sejam frequentes ao redor do Estado que mais lhe deu votos, é na pequena cidade de Benedito Novo que os eleitores mostram maior preferência pelo tucano.

Para a maioria, a explicação para a insatisfação com o governo Dilma está na ponta da língua: falta de investimentos no Estado, más condições para os agricultores e o desejo de mudança, com a saída do PT do governo federal.

No município com forte vocação agrícola e população de pouco mais de 11 mil habitantes (segundo dados do IBGE), 77,27% dos votos foram para Aécio, contra 16,72% para Dilma, e 4,50% para Marina.

É a cidade com a maior proporção de votos em Aécio no Estado. E basta um giro pelo lugar para entender melhor o que levou a este cenário.

Propagandas de campanha da candidata do PT são quase inexistentes, e de Marina Silva parece que a maioria mal ouviu falar, enquanto painéis de candidatos locais ao lado de Aécio Neves podem ser vistas já no caminho para a cidade.

Reinaldo Odorizzi, pequeno agricultor e um dos principais militantes do PT na região, confirma que houve pouco incentivo do diretório estadual para a campanha. "Não recebemos muitos recursos, acho que a campanha poderia ter sido mais intensa. De fato, há poucas placas e distribuímos pouco material nas ruas", explica.

Alemães, italianos e poloneses

Além disso, a composição étnica de uma típica cidade do interior de Santa Catarina está representada logo na entrada da pequena cidade, onde uma placa deixa claro que a colonização local é de alemães, italianos e poloneses.

Especialistas apontam que enclaves como este tendem a indicar o perfil tradicionalmente conservador do eleitorado catarinense.

Uma breve visita ao site da Prefeitura comprova que, ao menos na chefia das pastas municipais, esses são, de fato, os grupos representados: Grundmann, Tonolli, Klitzke, Koprowski, Schutz, Beyer, Schmidt, Koslowski, Lowen, Bonetti, Gessner e Teske são alguns dos sobrenomes dos servidores. É difícil achar um Oliveira, Carvalho, Silva ou Santos.

Na rua principal, a Prefeitura rivaliza com uma farmácia muito moderna, cuja construção é quase maior do que a sede do poder municipal. Além disso há duas igrejas Luteranas, agências bancárias e pequenas lojas.

Chegar ao meio-dia é sinônimo de dar com a cara na porta. Aqui 95% do comércio, repartições públicas e escritórios fecham para o almoço e retornam somente entre 13h e 14h.

Há muitas ruas de terra, mas a maioria das casas é bem cuidada. De acordo com o IBGE, o PIB per capita é de R$ 13.403,82 (dados de 2011), e o rendimento nominal médio mensal dos domicílios é de R$ 2.234,06 na zona rural e R$ 2.428,96 na zona urbana. Quanto ao IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), o município se sai muito bem, encontrando-se na faixa de classificação "muito alta", de 0,740.

Além da rua principal, há mato. Muito mato. As áreas verdes são intensas, e coroadas ainda com rios, riachos e cachoeiras – um potencial turístico "ainda a ser descoberto", diz a Prefeitura. As pessoas são desconfiadas, e a primeira atitude ao se avistar um "forasteiro" é ver a placa do carro, para checar a procedência.

O clima é pacífico e tranquilo, de cidade pequena, humilde, ordeira e agrícola. A predominância da colonização alemã, no entanto, se impõe nos hábitos e na cultura locais.

Mudança

Apesar da tranquilidade e bons indicadores econômicos, a maioria aqui quer mudança. Alguns deixam claro que não sabem se Aécio conseguirá colocar em prática todas as alterações que eles esperam: entre eles reforma tributária, maiores incentivos em Santa Catarina, em particular para para os pequenos agricultores, e combate à corrupção.

O técnico em agropecuária Ricardo Ewald Jr. nega a existência de um sentimento anti-PT na cidade. "Houve muito pouco investimento aqui. Nós somos abandonados em relação ao Nordeste. Não foi uma decisão partidária, acho que as pessoas só querem mudanças, coisas novas mesmo. Não acho que votaram por partido, votaram no Aécio mesmo", conta.

A reportagem percorreu diversos pontos do município, e ouviu vários entrevistados comparando Aécio a um "salvador", que pode "livrar" os brasileiros do que grande parte enxerga como um governo insatisfatório.

O vereador Walter Doege, do PMDB - que apesar de manter coligação com o PT em nível nacional aqui se coligou com o PSDB e está em maioria na Câmara, com cinco vereadores contra quatro da oposição -, ressalta o que vê como qualidades do tucano. "Pessoa digna, honesta e sincera, e nós confiamos nele. Tem que mudar o poder federal. Disso não resta dúvida", diz.

Rejeição e apoio a Dilma

Para Jean Castro Costa, doutor em Ciências Políticas pela USP que há três anos mora em Florianópolis e leciona na UFSC, há vários fatores por trás do apoio maciço a Aécio no Estado, entre eles uma rejeição ao governo Dilma.

"Dizer que o Estado tem tradição conservadora é muito simplista. Creio que há mais razões. Há um consenso de insatisfação com o governo atual e com a necessidade de tirar o PT do poder. E o discurso de Aécio casou muito bem com a ideia da mudança", explica.

Ele relembra que no Norte e no Sul do Estado, assim como no litoral, o PT não costuma emplacar, mas que no Oeste tem uma presença fortalecida, com inúmeros sindicatos e o MST (Movimento dos Sem Terra).

Entre o catarinense dessas regiões, há também a noção muito difundida de que os Estados do Nordeste recebem muita ajuda e de que programas sociais usam verbas que poderiam ser melhor aproveitadas.

"Fui caminhoneiro durante alguns anos. Vi que em muitos lugares do Brasil as pessoas poderiam trabalhar mais, receber menos ajuda. Não sei se o Aécio vai fazer tudo que queremos, mas é importante mudar", diz Roberto Lorenz, de 29 anos, técnico em informática.

Seu colega Daniel Felipe Zoboli, de 19 anos, acredita que o governo deveria levar mais fábricas, indústrias e outros postos de trabalho às regiões Norte e Nordeste, onde há grande adesão aos programas como o Bolsa Família e Bolsa Escola.

"Por que não dão trabalho para eles, no Nordeste? A gente espera que o Aécio seja a mudança, mas não dá para saber. Todo mundo está esperando que ele melhore a economia, faça as alterações necessárias. Agora com o PT não dá para ficar", conta.

A costureira Elfie Schrull Maus, de 46 anos, concorda. "Votei no Aécio e todo mundo que eu conheço votou nele também. Vamos ver", diz.

Mas Reinaldo Odorizzi, militante do PT na região, diz que é preciso relembrar que 1.081 pessoas votaram em Dilma em Benedito Novo. "Sobre essa votação para o Aécio, o que posso dizer? Sabíamos que seria difícil. Aqui é realmente muito forte o eleitorado do PMDB, PSDB, PP, sempre foi. Mas para mim o governo Dilma foi bom, foi importante, e eu sigo com ela", diz.

"Há outros fatores aqui que podem ajudar a explicar. Eu acho que há um pouco de preconceito quanto aos programas sociais para o Nordeste, e na minha opinião há até machismo. Muitos não votam nela só por ela ser mulher", acrescenta Odorizzi.
 

Campanha presidencial 2014
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