Sertão e seca. Essa combinação sempre foi sinônimo de sofrimento para o nordestino, especialmente em épocas de estiagem intensa. Mas em Canindé do São Francisco (a 206 km de Aracaju) a regra passa a ser uma exceção.
Graças à agricultura irrigada e aos royalties pagos pela Chesf (Companhia Hidrelétrica do São Francisco) pelo uso da água do rio São Francisco, pela hidrelétrica de Xingó, o município se tornou referência de desenvolvimento no semiárido nordestino. Com um projeto de irrigação consolidado há 25 anos, turismo ecológico e desenvolvimento urbano, Canindé do São Francisco cresceu e atraiu então moradores de outras cidades.
O UOL visitou Canindé do São Francisco dentro do projeto UOL pelo Brasil --série de reportagens multimídia que percorre municípios em todos os Estados da federação durante a campanha eleitoral.
Os números não deixam dúvida da diferença de Canindé para as demais cidades nordestinas. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas), a renda per capita anual de Canindé do São Francisco, em 2009, alcançou R$ 39.456,09, quatro vezes o registrado a média estadual --R$ 9.787,25. Para se ter ideia do alto valor, a renda per capita de Canindé, em pleno sertão nordestino, é maior que a da cidade de São Paulo, que, em 2009, ficou em R$ 35.271,93.
De olho no cofre gordo, Canindé do São Francisco tem uma disputa eleitoral acirrada, com dois candidatos, entre eles um deputado federal: Heleno Silva (PRB), que pode deixar o cargo na Câmara para governar uma cidade de apenas 24 mil habitantes. Ele disputa o cargo com o comerciante Ednaldo da Farmácia (PSC), figura popular na cidade e apoiada pelo atual prefeito Orlando Andrade (PSDB).
Para Ednaldo da Farmácia, o fato de Canindé do São Francisco ser rica tem seus efeitos colaterais, que podem ser amenizados com investimentos. "Administrar um município localizado em uma região fronteiriça, que atrai centenas e centenas de imigrantes pobres, sem formação profissional e com baixíssima escolaridade requer uma atenção redobrada com o social. Canindé é o município referência em oferecer oportunidade de uma vida melhor para todos que aqui chegam”, diz, citando que pretende fortalecer a educação e a saúde.
Já Heleno Silva, que representa a oposição, afirma que, pelos recursos que possui, o município poderia oferecer melhor qualidade de vida, com mais investimentos para fortalecer o turismo e a agricultura, entre outras áreas. “Governar uma cidade com tantos recursos é você proporcionar uma melhor qualidade de vida as pessoas dando oportunidade para juventude na educação, na geração de empregos e ter a noção exata da importância do município para região que deve ser o polo do desenvolvimento. Tornar uma cidade modelo, incentivando a vinda de fabricas e indústrias”, afirma
Os dois candidatos disputam o comando de uma prefeitura com dinheiro em caixa, condição financeira que em nada lembra a de cidades vizinhas. O município tem 22 escolas e um centro educacional, sendo seis na zona urbana --todas da cidade com acesso à internet. Ao todo são 7.800 alunos.
O transporte dos estudantes não é feito em pau-de-arara ou em veículos antigos, como na maioria das cidades do interior nordestino. Alunos são transportados em 20 ônibus e 37 vans.
Avanço comparado a outras cidades
O desenvolvimento responde por um nome: royalties. O dinheiro é pago como compensação pela exploração das riquezas naturais. A cidade recebe os louros da construção da hidrelétrica de Xingó, administrada pela Chesf. O UOL tentou uma entrevista com algum responsável da companhia na cidade, mas não teve as solicitações respondidas.
Fora a ligação com a usina, a economia da cidade é baseada na agricultura, onde os agricultores plantam diversas culturas. Apesar de estar encravada numa das áreas de menor percentual de chuvas da região, a agricultura irrigada transformou a cidade.
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- http://eleicoes.uol.com.br/2012/enquetes/2012/09/28/cidades-como-caninde-do-sao-francisco-mostram-que-o-sertao-do-nordeste-tem-jeito.js
O projeto Califórnia existe há 25 anos e se tornou uma das experiências mais exitosas do Nordeste. São 333 lotes irrigados, que beneficiam 1.665 pessoas, com a produção de 27 mil toneladas de alimentos, segundo a Companhia de Recursos Hídricos de Sergipe.
O UOL visitou quatro desses lotes e viu que, graças à água abundante, culturas como quiabo e goiaba --que jamais poderiam se desenvolver com o clima no sertão-- se tornaram viáveis e geradoras de renda. “A seca só é ruim para os bichos, para quem tem gado”, conta o agricultor Jailton Paes dos Santos, que veio do município de Glória (BA) em busca de uma oportunidade e conseguiu, há 22 anos, um lote irrigado.
Agricultores cobram central de abastecimento
Mas o sucesso de desenvolvimento não esconde suas carências. A principal queixa dos agricultores é a falta de uma central de abastecimento onde pudessem vender seus produtos sem a necessidade do atravessador. Os produtores afirmam que deixam de lucrar mais com os seus produtos por conta da falta do local.
“Eu queria pedir [ao próximo prefeito] que ele fizesse um Ceasa [como são conhecidas as centrais de abastecimento]. Se tivéssemos, chegava e colocava lá o quiabo para vender, por exemplo. Levava até em carroça de burro. Hoje tem que vender a quem passa aqui, e a gente não sabe quanto vai receber pela mercadoria. Seria uma melhoria de 100%”, diz Santos.
“Os políticos só vêm aqui de dois em dois anos. Se tivesse ao menos uma cooperativa para entregar a mercadoria com preço garantido. Hoje a gente produz e não tem nenhuma ideia de quanto vai receber”, conta o agricultor Erisvaldo Alexandre de Assis.
Apesar do pedido dos agricultores, o UOL consultou o plano de governo dos dois candidatos, mas nenhum deles faz qualquer menção à construção de uma central de abastecimento no município.