Pomerode (SC)

Em cidade catarinense, candidatos falam alemão para ganhar confiança do eleitor

Políticos bilíngues abrem vantagem contra rivais na hora de lutar por votos

Pomerode, “a cidade mais alemã do Brasil”, tem uma campanha no mínimo singular. Como muitas famílias não dominam o português, candidato que fala o alemão ganha mais credibilidade e confiança. O curioso é que o prefeito que tenta a reeleição, Paulo Pizzolatti (PP), é descendente de italianos. Seu vice, Ércio Kriek (PP), se encarrega de convencer os eleitores germânicos.

Bárbara Therrie, Rodrigo Bertolotto e Rodrigo Bozzi

Do UOL, em Pomerode (SC)

O horário eleitoral nas rádios de Pomerode (a 167 km de Florianópolis) é todo falado em português, mas na hora de pedir o voto cara a cara o candidato tem de gastar o alemão para ganhar a confiança do eleitor. “A gente aprendeu a pedir voto em alemão. Não sou fluente, e meu sotaque não é bom, mas o vice se encarrega de convencer porque ele fala bem”, confessa Paulo Pizzolatti (PP), o primeiro prefeito eleito sem sobrenome germânico em toda a história do município, emancipado em 1959.

O UOL visitou Pomerode dentro do projeto UOL pelo Brasil, série de reportagens multimídia que percorre municípios em todos os Estados da federação durante a campanha eleitoral.

Atrás de sua reeleição, Pizzolatti tem o atenuante de possuir mãe de origem alemã e ter crescido na cidade. Um de seus rivais na campanha é a chapa duplamente italiana Rolf Nicolodelli e Ricardo Campestrini, da coligação PMDB-PSD. “Mas nós dois falamos bem o alemão. As pessoas ficam mais à vontade e dá uma credibilidade maior falar no idioma que eles estão acostumados”, conta o vereador Campestrini, vice na chapa.

Estas, porém, são exceções que só reforçam a regra na “cidade mais alemã do país”, como a localidade catarinense se autointitula até em seu hino: "Pomerode! Pomerode! O teu povo se orgulha de ti, ó cidade mais alemã do Brasil".

O cálculo é que 90% da população tenha origem na Pomerânia, região à beira do mar Báltico que atualmente é dividida entre a Alemanha e a Polônia. A influência é tanta que o dialeto pomerano, extinto na Europa, ainda sobrevive nesse canto do Brasil.

A cultura alemã se preserva por lá também com os bolos cucas, os marrecos recheados, os grupos de dança folclórica, os clubes de tiro, as cervejas artesanais e na arquitetura de chalés típicos usando a técnica do enxaimel. Todo o mês de janeiro tem a Festa Pomerana.

Mas a política já atrapalhou essa característica local. Após o ex-presidente Getúlio Vargas declarar guerra aos países do Eixo (que inclui a Alemanha nazista) em 1942, o governo brasileiro proibiu o uso da língua alemã, assim como construções no estilo alemão e qualquer outro tipo de manifestação que lembrasse a cultura do inimigo bélico de então. O banimento terminou junto com a guerra em 1945.

Hoje em dia, o alemão é ensinado nas escolas primárias e é considerado língua cooficial do município. Há placas bilíngues e alguns serviços, como enfermagem e comércio, podem ser oferecidos nos dois idiomas.

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  • http://eleicoes.uol.com.br/2012/enquetes/2012/09/25/voce-votaria-em-um-politico-so-porque-ele-tem-a-mesma-origem-etnica-que-a-sua.js

“Eu já chego falando alemão com todo mundo. A gente conquista o eleitor com mais facilidade”, conta o vereador Nelson Fischer (PMDB). O mais usual nas ruas, na verdade, é uma espécie de dialeto que mistura a estrutura do alemão popular (o chamado plattdeustch) com palavras em português. Surge daí a palavra “prefekt” para prefeito, quando o certo na língua de Goethe é “bürgermeister”.

O isolamento de Pomerode, que ajudou a criar esse dialeto, também tem seu lado negativo. “Pela nossa formação, uma vergonha pública é inaceitável. A pessoa prefere se suicidar a ficar devendo para um vizinho”, comenta o vereador Arno Muller (PMDB) sobre a triste estatística recente de Pomerode, com alto índice de suicídio por habitante.

Outro tema polêmico é o racismo dentro de uma comunidade tão homogeneamente branca. Várias empresas alemãs, como Bosch, Netzsch e Weiku, se instalaram nos últimos anos na cidade, atraídas pelo ambiente germânico da região.

  • Rodrigo Bozzi/UOL

    Chão da cidade de Pomerode, em Santa Catarina; veja outras fotos clicando na imagem

Os investimentos, porém, mudaram ainda mais o perfil rural da cidade para o industrial --antes, a principal fábrica era a de porcelanas Schmidt. A movimentação econômica também trouxe uma leva de migrantes vindos principalmente do vizinho Paraná.

O tema ainda não ganhou importância eleitoral, mas pode ganhar importância no futuro. “Há 18 anos, quando cheguei aqui, havia uma resistência muito grande a quem era de fora. Agora até que está melhorando”, relata o paulista Hamilton Petito (PP), único vereador sem sangue alemão.

Além da migração, a TV também é um vetor de transformação. “Os pais e os avôs começaram a assistir a televisão e assimilar o português e os costumes brasileiros. Isso está mudando a cultura local”, opina Arno Muller, vereador pelo PP.

Diário de Bordo

  • Rodrigo Bozzi/UOL

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Quem é mais alemão?

  • Rodrigo Bozzi/UOL

    A colonização alemã no Brasil começou no início de século 19 e se concentrou principalmente em localidades de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná e Espírito Santo. Por isso mesmo, outras cidades também reivindicam o título de “a mais alemã”. A gaúcha São Leopoldo, por exemplo, sancionou lei em 2011 se autoproclamando “o Berço da Colonização Alemã no Brasil”.

Guerra deixa marcas

Além da proibição da língua e da arquitetura alemãs, o governo brasileiro no final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) também convocou soldados de Pomerode para combater as tropas nazistas na Itália. Um monumento na praça Jorge Lacerda lembra a história dos expedicionários.

Bandinhas dominam

  • Rodrigo Bozzi/UOL

    A rádio Pomerode AM é um caso à parte na cidade. A ronda diária de notícias inclui até o total de pessoas internadas no hospital local. Mas a principal atração da estação é Opa RudiBerth, personagem que ironiza os avós alemães e tem forte sotaque. Aos domingos de manhã, a programação é só de música alemã, seja das típicas bandinhas ou o pop germânico. Em outros horários, o sertanejo universitário e a MPB dominam as preferências.

  • Arte UOL

Cidade: Pomerode
Estado: Santa Catarina
Distância da capital: 167 km
População: 27.759 (2010)
PIB per capita: R$ 27.224,09 (2009)
Área (em km²):  215,905
Número de eleitores: 21.405 (2012)
Data da fundação: 21 de janeiro de 1959

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