Cascavel (PR)

Adolescentes bagunçam política em cidade no Paraná e abrem espaço para segundo turno

Campanha nas escolas dá certo, e cidade tem mais que 200 mil eleitores

A cidade de Cascavel (494 km de Curitiba), no oeste paranaense, superou a marca de 200 mil votantes com uma campanha para que adolescentes de 16 e 17 anos tirassem o título de eleitor. Com ônibus fretados durante o horário letivo, jovens se deslocaram para o fórum e enfrentaram burocracia. Mesmo com pouca experiência, os teens opinam sobre a política e criticam corrupção.

Bárbara Therrie, Rodrigo Bertolotto e Rodrigo Bozzi

Do UOL, em Cascavel (PR)

Mateus Souza da Luz, 16, foi escolhido a dedo para ser “o piá 200 mil”. Traduzindo: ele se tornou o eleitor a partir do qual Cascavel se elevou ao status de outras 82 cidades brasileiras (incluindo as paranaenses Curitiba, Londrina, Maringá e Ponta Grossa) que podem ter segundo turno nas eleições deste ano.

Por isso mesmo, ele foi blindado para que sua imagem não fosse usada eleitoralmente por nenhum candidato. No dia em que tirou o título de eleitor, Mateus foi cercado por políticos atrás dos flashes direcionados à celebridade teen local. Seus professores se encarregaram de afugentar os figurões locais.

O UOL visitou Cascavel dentro do projeto UOL pelo Brasil, série de reportagens multimídia que percorre municípios em todos os Estados da federação durante a campanha eleitoral.

  • Rodrigo Bozzi/UOL

    Alunos acompanham palestra de conscientização política; veja mais imagens clicando na foto

Durante a campanha, um candidato chegou a conseguir uma foto ao lado do adolescente, mas novamente foi barrada a utilização eleitoreira. Aluno de escola pública, estudioso e interessado em política, Mateus foi pinçado pelo NRE (Núcleo Regional de Educação) e pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), entidades que levaram à frente a campanha “1+1=200 mil eleitores”, que desde o final de 2011 incentivou jovens a tirar o título.

Segundo a legislação eleitoral, apenas as cidades com mais de 200 mil eleitores realizam segundos turnos quando nenhum candidato obtiver, pelo menos, 50% mais 1 dos votos válidos.

A proteção é tanta no entorno de Mateus que a reportagem do UOL também teve dificuldade para entrevistar o jovem. Parte dos professores do colégio estadual Eleodoro Ébano Pereira, onde ele estuda, tentou impedir a entrevista. O garoto acabou falando por três minutos, após insistência de outra parte dos professores.

“Meus amigos inteligentes são interessados em política. Mas também há muitos que só vão votar por obrigação”, foi a opinião de Mateus sobre o protagonismo juvenil na campanha de “Casca City”, apelido da cidade.

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  • http://eleicoes.uol.com.br/2012/enquetes/2012/09/18/voce-acha-que-os-adolescentes-estao-preparados-para-votar.js

Mateus encara a votação como um vestibular: ele tem de estudar, se preparar para teste e escolher as alternativas certas no dia 7 de outubro. O jovem parece estudar cada palavra que diz e está distante das posturas mais esperadas para um adolescente diante da política: ou a rebeldia ou a indiferença.

Rebeldia que fica clara nas palavras de Fernanda Tagut, 16. “Eu gosto de rock, não gosto de política. É muita falsidade, vou votar nulo”, diz. “Eu trabalho e estudo. Não tenho tempo para horários eleitorais e debates”, responde uma indiferente Jéssica de Lima, 17.

Cabular aula vira estratégia para tirar o título

Cascavel, polo agroindustrial e universitário, tem horário eleitoral de TV para seus políticos faz décadas, coisa de cidade grande. Porém, não contava com um segundo turno, porque faltavam cerca de 8.000 títulos para cumprir a exigência mínima do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

“A gente percebeu que apenas 15% dos alunos entre 16 e 18 anos tinham o título. É até compreensível, afinal, os políticos relegam os jovens a um segundo plano. Mas agora é a hora de conscientizá-los sobre a importância da política”, analisa Vander Piaia, chefe na cidade do núcleo regional da Secretaria Estadual de Educação.

A estratégia foi arregimentar eleitores dentro de 42 escolas e transportá-los para o fórum em ônibus fretados com ajuda de entidades privadas. Os alunos eram orientados a trazer os documentos necessários e o trâmite era feito durante o horário letivo.

“Para eles, era uma festa. Sair da rotina de aula e fazer um programa diferente”, conta Luciano Katarinhuk, presidente da comissão eleitoral da subseção da OAB. A mobilização foi tanta que o número de eleitores ultrapassou os 204 mil.

A prefeitura não ajudou em nada a ação para aumentar o número de eleitores, e muitos interpretaram isso como um sinal que o atual prefeito, Edgar Bueno (PDT), não tinha muito interesse em criar mais um obstáculo em sua campanha pela reeleição. Procurado pela reportagem, a prefeitura não se pronunciou até a conclusão deste texto.

Uma pesquisa Ibope de intenção de votos em Cascavel chegou a ser publicada, mas foi retirada do ar após decisão da Justiça. Casos semelhantes também aconteceram em Londrina e Curitiba.

Quem moveu a ação em Cascavel foi Jorge Lange, candidato ao cargo pelo PSD. Ele é o único que está usando a novidade do segundo turno em sua campanha de TV e rádio. Lange chegou a procurar Mateus para que ele participasse de inserções, o que foi prontamente negado. O jeito foi juntar militantes jovens do partido e encenar como se fossem os novos votantes da cidade.

As escolas promoveram palestras e debates para incentivar o interesse político nos jovens com direito a voto e também indicaram que eles usem também a internet para se informar sobre os candidatos. “Nas redes sociais é mais bate-boca de um lado e do outro. Não dá para saber quem está com a razão. Prefiro pesquisar a história de cada um para ter uma base”, afirma Luan Schaebler, 16.

Uma pesquisa rápida pelo Google, por exemplo, pode revelar que o PP lançou Idalina Barreiros, 77, porque seu marido e duas vezes ex-prefeito, Salazar Barreiros, não pôde se candidatar por estar na lista negra do Tribunal de Contas, ou que o candidato Lísias Tomé (PSDC) já foi prefeito, ou que Francisco Menin (PPS) tenta sua 7ª candidatura sem sucesso para prefeito e adora se vestir como Elvis Presley. Será que ele vai conquistar o público jovem por seu perfil roqueiro?

Diário de Bordo

  • Rodrigo Bozzi/UOL

    Saiba mais curiosidades das cidades visitadas no UOL pelo Brasil

Dedão é atração da cidade

  • Rodrigo Bozzi/UOL

    É tão baixa a vocação turística de Cascavel que é difícil achar uma lembrancinha ou um souvenir de lá no comércio. Por outro lado, a cidade tem um símbolo no mínimo inusitado: a escultura de um dedão gigante na avenida principal. O artista Dirceu Rosa, autor de vários monumentos locais, virou um especialista em esculpir mãos e doou o dedo para a prefeitura.

Você não teve infância?

  • Rodrigo Bozzi/UOL

    Lucas Martins é membro da Câmara Jovem de Cascavel, espécie de legislativo para adolescentes apresentarem propostas de políticas para a faixa etária. De terno e usando terminologia de um senador, Lucas aparenta mais idade que seus 16 anos. "Teve uma vez que um adulto até me perguntou: 'Você não teve infância, não?'. Dei muita risada."

Tudo surgiu com um ninho de cobra à beira do rio

  • Rodrigo Bozzi/UOL

    Segundo o próprio site da prefeitura, o nome da cidade surge da lenda de um grupo de colonos que pernoitou à beira de um rio e encontrou um ninho de cascavéis, cobras conhecidas pelo guizo na cauda.

  • Arte UOL

Cidade: Cascavel
Estado: Paraná
Distância da capital: 491 km
População: 286.205 (2010)
PIB per capita: R$ 16.849,63
Área (em km²): 2.100,837
Número de eleitores: 204.185 (2012)
Data de fundação: 14 de dezembro de 1952

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