Caso Lula encerra debate sobre prisão após condenação em 2ª instância?

Ana Carla Bermúdez

Do UOL, em São Paulo

Ao negar o recurso (habeas corpus preventivo) da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para evitar sua prisão, o STF (Supremo Tribunal Federal) mantém, ao menos por enquanto, o entendimento da Corte de que é possível dar início ao cumprimento de pena após a condenação em segunda instância.

Alvo de polêmicas, a hipótese de revisão desse entendimento vem sendo fortemente debatida --tanto por aqueles que o veem como uma forma de enfrentamento à impunidade como por outros que acreditam que ele viola o direito da presunção de inocência, e que seria, portanto, inconstitucional.

Na semana passada, o juiz federal Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, se manifestou sobre a questão. Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, Moro afirmou que uma eventual revisão do entendimento do STF "teria um efeito prático muito ruim".

O juiz citou que, entre as penas executadas por ele e confirmadas em 2ª instância, haveria também casos de "traficante", "pedófilo" e "doleiros", e não apenas envolvendo corruptos. Pessoas que, segundo Moro, poderiam ser beneficiadas com a mudança no STF e recorreriam, então, em liberdade.

"Se o habeas corpus de hoje [o do Lula] tivesse entrado na tese da prisão de 2º grau, ou seja, se eles [ministros do STF] tivessem revogado o entendimento do tribunal de 2016, que permite a prisão após segunda instância, de fato todos os demais réus que se encontram em situação análoga à do Lula poderiam requerer a extensão dos efeitos desse habeas corpus para os seus casos", diz Carlos Gonçalves Junior, advogado e professor de Direito Constitucional da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).

No julgamento que terminou na madrugada desta quinta-feira (5), os ministros sequer analisaram o mérito da prisão em segunda instância, mas isso pode acontecer em breve na Corte.

Isso porque duas ADCs (Ações Declaratórias de Constitucionalidade) que tentam reverter o atual entendimento do STF já foram liberadas para julgamento no plenário, mas ainda não foram colocadas em pauta pela presidente Cármen Lúcia.

No julgamento desta quarta, os ministros pressionaram a presidente a colocar as ADCs em pauta –um eventual julgamento das ações estabeleceria efeito vinculante, ou seja, seu resultado valeria para todos.

Gonçalves Junior afirma que a mobilização em torno da questão da prisão após segunda instância "é um tema polêmico, porque o texto da Constituição, na visão do STF, não se colocou suficientemente claro em distinguir culpabilidade da possibilidade do cumprimento de pena".

Alguns ministros entendem, portanto, que só é possível determinar o cumprimento de pena após reconhecida de "maneira definitiva" que uma pessoa é culpada, ou seja, após esgotados todos os recursos em instâncias superiores –incluindo o STJ (Superior Tribunal de Justiça) e o próprio STF.

Já outros entendem que uma condenação em segundo grau, quando a condenação por um juiz de primeira instância é revisada por um Tribunal, é possível autorizar o início do cumprimento de uma pena.

O professor diz que, pelo entendimento vigente, não há uma distinção para a espécie de crime, mas, sim, pela espécie de condenação. Portanto, se o STF revir a condenação após segunda instância e permitir que se recorra em liberdade, casos como os citados pelo juiz Moro poderiam ser de fato beneficiadas por essa decisão.

"No entanto, na discussão de hoje, já se inaugurou um diálogo, puxado pelo voto do ministro Gilmar Mendes, de que se for revista a posição do Supremo sobre a prisão em segunda instância, que se faça uma distinção quanto à natureza dos crimes", pontua o professor.

"Teremos que aguardar como o Supremo vai se posicionar para saber qual vai ser a extensão das consequências deste novo julgamento [das ADCs]", complementa.

Gilmar explica por que mudou posição sobre prisão após 2ª instância

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