O que os pré-candidatos à Presidência dizem sobre a intervenção no Rio

Daniela Garcia e Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo

  • Pedro Ladeira /Folhapress

    16.fev.2018 Presidente Michel Temer assina decreto de intervenção das Forças Armadas na segurança do Rio de Janeiro

    16.fev.2018 Presidente Michel Temer assina decreto de intervenção das Forças Armadas na segurança do Rio de Janeiro

O decreto de intervenção federal na segurança pública do Rio dividiu e também silenciou os pré-candidatos às eleições presidenciais. A ação é inédita no Brasil desde a promulgação da Constituição Federal, que completa 30 anos em 2018.

Anunciada pelo Palácio do Planalto como forma de "garantir a ordem pública e a segurança da população" ante a escalada de violência que assola o Estado, a medida foi avaliada pelos presidenciáveis desde "drástica, porém necessária" a algo que promove o "esvaziamento democrático" e tira foco das dificuldades em se aprovar a reforma da Previdência pelos pré-candidatos.

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O decreto, assinado pelo presidente Michel Temer (MDB), tem validade até o final de seu mandato, 31 de dezembro. Caberá ao novo ou à nova presidente, portanto, o rescaldo da ação anunciada hoje, caso o decreto não seja revogado antes do prazo-limite de validade.

O UOL buscou ouvir os principais nomes que postulam, declaradamente ou não, a sucessão. Dos que têm se apresentado dispostos a concorrer, não se pronunciaram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) - atual líder das principais pesquisas de intenção de voto - e o ministro da Fazenda de Temer, Henrique Meirelles (PSD). A assessoria do petista deu retorno --informou que "não tem comentário" sobre o caso.

Sem Lula no páreo, caso a Justiça Eleitoral inviabilize a candidatura do petista, e sem apoio a outro candidato do Planalto, o próprio Temer, revertendo os altos índices de rejeição a tempo, não descarta uma tentativa de reeleição.

Confira, a seguir, a opinião dos pré-candidatos.

Alvaro Dias: "Incompetência do governo"

Presidenciável pelo Podemos, o senador Alvaro Dias (PR) criticou o decreto do governo em vídeo publicado em suas redes sociais.

"O Rio de Janeiro é o retrato do caos em matéria de segurança, mas não é apenas o Rio, ele não é uma exceção –a regra é a ausência de segurança para a população", disse. "O governo perdeu essa batalha, e o anúncio da  intervenção é a revelação da incompetência do governo. A causa é esse modelo corrupto e incompetente; os governantes não tiveram tempo de se preocupar com a segurança do povo porque estavam roubando recursos, e agora não tem recursos – o caixa foi raspado pela corrupção", completou.

Na avaliação do parlamentar, faltaram recursos federais para ações como armamento e qualificação técnica dos profissionais de segurança pública. "O combate à violência começa também na faixa de fronteira, com uso do Exército", defendeu.

Ciro Gomes: "motivação mesquinha e politiqueira"

Pré-candidato pelo PDT, Ciro Gomes disse, por meio de nota, que a motivação do presidente Temer é "mesquinha e politiqueira". "Biombo para o fracasso politico da malfadada reforma da previdência que de reforma nada tem", pontuou.

Apesar da crítica contra o governo federal, o pedetista diz que a intervenção federal atende a "súplica generalizada da sociedade brasileira que anda com medo". Ele avalia, no entanto, que as Forças Armadas não devem assumir o papel de polícia no país. 

"Faz tempo que nações poderosas querem que as forças de defesa de países como o Brasil abandonem sua missão institucional para se converterem em forças de segurança pública e combate ao narcotráfico. Não podemos aceitar isto! A corrupção no aparelho policial do Rio, e do Brasil vai procurar caminhos para se relacionar com o Exército", declarou.

Ciro também tece elogios ao general Walter Braga Netto, nomeado como interventor na segurança do Rio de Janeiro. "É o que há de melhor em nossas Forças Armadas. Sério, competente e com elevado espírito público, deve ter o apoio de todos nós", disse.

Ao final da nota, Ciro deixa uma mensagem pessimista sobre a medida: "Torço muito que possa dar certo, mas duvido muito!"

Geraldo Alckmin: "medida extrema, mas necessária"

O governador de São Paulo e presidenciável pelo PSDB, Geraldo Alckmin, classificou a intervenção no Rio como uma "medida drástica, porém, necessária". Por outro lado, defendeu também a transitoriedade da intervenção.

"É uma medida extrema, mas era necessária; só que tem que ser transitória", disse. "Entendo que o governo federal tem que liderar esse trabalho porque, hoje, nosso grande problema é o tráfico de drogas e de armas e a lavagem de dinheiro, que são crimes federais", complementou.

O tucano também se disse favorável à criação do Ministério da Segurança Pública, cogitado pelo governo do presidente Temer.

"Sempre defendi a criação do Ministério da Segurança Pública --e Temer agora vai implementar-- e uma agência nacional de inteligência que unisse a inteligência dos Estados, a Abin [Agência Brasileira de Inteligência], as Forças Armadas, a Polícia Federal e o Gabinete de Segurança Institucional para a questão das fronteiras, que sabemos que não é fácil.", declarou Alckmin.

Guilherme Boulos: "falsa solução"

Cotado para a disputa pelo PSOL, o coordenador nacional do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) afirmou que a intervenção federal "é uma falsa solução" no combate ao crime organizado. "Houve uma ação militar como essa na [comunidade da] Maré [zona norte do Rio], durante o governo de Sérgio Cabral, e basta ver o resultado que teve em relação a isso", afirmou ao UOL.

Para o líder dos sem teto, há uma "enorme preocupação" de que o anúncio do governo "leve a uma criminalização da pobreza, com ataques e desrespeitos aos direitos humanos de moradores de favelas e comunidades". "O Exército trabalha com a ideia de que tem um inimigo externo a combater, e o receio é que esse inimigo seja identificado nos moradores de favelas com uma série de abusos; esse é o risco real desse tipo de operação: a atuação irresponsável", declarou.

A ação de Temer, por si, prosseguiu Boulos, seria "uma tentativa de impedir a tramitação da PEC [Proposta de Emenda à Constituição] e, com isso, esconder o fracasso da reforma da Previdência".

"Não conseguiram aprovar essa PEC, amplamente rejeitada pela sociedade, mesmo com um amplo balcão de negócios para obter votos e aprová-la. Ao mesmo tempo, há algo muito perigoso em curso com essa militarização na política ao se ter um interventor general: isso cria um caldo de repressão que aprofunda o esvaziamento democrático que já está em curso no país", classificou.

Jair Bolsonaro: "servir bando de vagabundos"

Defensor de um discurso armamentista como forma de proteção do cidadão comum, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ) foi procurado pelo UOL, mas não quis falar sobre o assunto. Ao site "O Antagonista", o parlamentar disse que o modelo de intervenção federal determinada por Temer no Rio se presta a "servir esse bando de vagabundos". O presidenciável reclamou de a decisão ter sido tomada "dentro de um gabinete" e supostamente sem consulta às Forças Armadas.

"É uma intervenção decidida dentro de um gabinete, sem discussão com as Forças Armadas. Nosso lado não está satisfeito. Estamos aqui para servir à pátria, não para servir esse bando de vagabundos", disse, ao site.

Defensor do regime militar, Bolsonaro também se queixou da autorização para que os militares, que se instalarão em pontos de estratégicos do Rio de Janeiro por tempo indeterminado, atuem sem que lhes seja garantido o "excludente de ilicitude" – garantia jurídica que garante a membros das Forças Armadas a inimputabilidade em caso de mortes provocadas por eles em combate.

"No Haiti, você podia atirar. Aqui como vai ser?", questionou. "Todo mundo diz que estamos em guerra. O Rio está em guerra. Mas que guerra é essa que só um lado pode atirar? Qualquer um do lado de cá, que tome uma medida de força, vai ter problemas depois na Justiça. Seja o policial militar, o civil ou o rodoviário federal", complementou.

Marina Silva: "medida traumática"

Para a porta-voz da Rede e pré-candidata ao Planalto, Marina Silva (AC), a intervenção federal é uma "medida traumática" em um país democrático.

"No âmbito de uma federação democrática, a medida mais traumática é a intervenção federal. Só espero que esta tenha sido precedida do mais responsável planejamento, para que a respectiva execução, de fato, traga a devida proteção e amparo à sofrida população do Rio de Janeiro em lugar de aumentar suas agruras", disse.

Segundo Marina, o decreto é uma medida urgente, derivada da "incapacidade do governo estadual" e omissão da esfera federal. "Inação de sucessivos governos federais que negligenciaram a pauta da segurança pública, deixando apenas para os estados a responsabilidade de enfrentar um problema complexo, que deveria ser tratado de maneira nacionalizada e integrada entre os entes federativos para promover ações mais efetivas e duradouras", opina.

Manuela D'Ávila: "uso indiscriminado é perigoso"

Ao UOL, a deputada estadual Manuela D'Ávila (RS), pré-candidata pelo PCdoB, disse, por meio de nota, que o uso das Forças Armadas para o policiamento é inadequado e "perigoso". "A atividade das Forças Armadas não está relacionada ao policiamento, mas à defesa nacional. O seu uso indiscriminado, de forma crescente pelo governo federal, é indesejável e perigoso", afirmou.

Segundo a deputada, "um gesto único" é incapaz de trazer uma solução para a crise do Estado fluminense. "É necessária uma completa reestruturação da política de Segurança Pública", declarou.

A pré-candidata também acusou o governo Temer de ter objetivo eleitoreiro com a aplicação da intervenção federal, além de retirar de "foco a derrota que sofreria com a reforma da Previdência"." Não há cortina de fumaça que esconda o repúdio da população à agenda ultraliberal do governo. "

Temer chama crime organizado de "metástase" e diz dará resposta "dura"

Michel Temer: "crime organizado é metástase"

Após assinar decreto que estabelece intervenção federal na segurança pública do Rio nesta sexta-feira (16), o presidente Temer, que tem cogitado tentar a reeleição, justificou a medida dizendo que o crime organizado é uma "metástase" que "quase tomou conta do Estado".

"Os senhores sabem que o crime organizado quase tomou conta do Estado do Rio de Janeiro. É uma metástase que se espalha pelo país e ameaça a tranquilidade do nosso povo", declarou.

O presidente reconheceu que a intervenção é uma medida extrema, mas disse ser necessária porque "as circunstâncias assim exigem". "O governo [federal] dará respostas duras, firmes, e adotará todas as providências necessárias para enfrentar e derrotar o crime organizado e as quadrilhas", afirmou.

Rodrigo Maia: "salto triplo sem rede, não pode errar"

Presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) classificou a intervenção como um "salto triplo sem rede" e reafirmou que erros não poderão ocorrer na ação. "Está se dando um salto triplo sem rede, não pode errar", disse, em encontro com jornalistas na manhã desta sexta.

Um pouco antes, o presidente da Câmara defendeu mudanças no Estatuto do Desarmamento e informou que o tema será colocado em discussão no Congresso no esperado pacote de segurança. "Acho que a matéria vem junto com essa pauta de segurança", afirmou.

No Twitter, Maia escreveu que a população do Rio vive hoje em "desespero". O presidente da Câmara, que é deputado pelo Estado do Rio, rebateu a informação de que teria sido contra a intervenção. "Eu sempre apoiei a intervenção federal no Rio", escreveu.

* Colaborou Bernardo Barbosa, de São Paulo

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