Violência no Rio

Lei e efetivo da Guarda Municipal dificultam propostas em segurança no Rio

Alfredo Mergulhão

Colaboração para o UOL, no Rio

  • Tânia Rêgo/Agencia Brasil

    14.abr.2014 - Manifestantes retirados de ocupação na zona norte em confronto com a Guarda Municipal

    14.abr.2014 - Manifestantes retirados de ocupação na zona norte em confronto com a Guarda Municipal

Com atribuições limitadas em segurança pública, os prefeitos encontram nas Guardas Municipais o principal instrumento para poder atuar na área. Os dois concorrentes ao cargo no Rio de Janeiro defendem que o órgão não utilize armamentos letais e prometem fazer mudanças na atuação dos agentes. Especialistas ouvidos pelo UOL afirmam, no entanto, que as mudanças prometidas esbarram na legislação e no efetivo das tropas.

Marcelo Crivella (PRB) afirma em seu programa de governo que vai colocar 80% do efetivo em "operações de policiamento comunitário e vigilância ostensiva da cidade". O estatuto geral das Guardas Municipais (lei 13.022, de 8 de agosto de 2014), no entanto, estabelece como princípio do órgão o "patrulhamento preventivo". A legislação não faz qualquer menção à tarefa de policiamento ostensivo, conforme anuncia Crivella.

"Há um risco em conferir à guarda atribuições parecidas com as da PM. É uma temeridade fazer isso sem uma discussão prévia para definir um protocolo de procedimentos e um sistema de treinamento", afirmou o sociólogo João Trajano Sento-Sé, do Laboratório de Análise da Violência, da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).

Na atual gestão, a relação da Guarda Municipal com a Polícia Militar ocorre em trabalhos de capacitação e aperfeiçoamento. As duas corporações fazem também ações conjuntas, como a Operação Praia, que está em andamento na orla da cidade.

Marcelo Freixo (PSOL) pretende distribuir a Guarda Municipal "nos principais pontos de encontros de pessoas na cidade" para atuar na prevenção. No entanto, Freixo terá dificuldade para colocar a proposta em prática devido ao tamanho do efetivo da Guarda Municipal, que tem outras responsabilidades.

"Se a Guarda Municipal cumprir bem sua atribuição de proteger o patrimônio público, prevenir pela presença nos locais e preservar a ordem pública, já dará sua contribuição. A prefeitura não tem como fazer muito mais na área de segurança", afirmou Sento-Sé.

Hoje, a tropa conta com 7.500 agentes para 6,32 milhões de habitantes, segundo estimativa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) para este ano.

José Lucena/Futura Press/Estadão Conteúdo
Hoje, uma das atuações da Guarda Municipal é a retirada de ambulantes ilegais e fechamento depósitos clandestinos no centro do Rio

Orçamento apertado

Crivella promete criar uma política de incentivos para as forças de segurança do Estado, o que inclui o pagamento de policiais civis e militares. A medida seria parecida com o que já ocorre com a Operação Segurança Presente, na qual os agentes são pagos pela Fecomércio e a Prefeitura do Rio.

O entrave à proposta será o orçamento apertado em 2017. A Lei Orçamentária Anual começou a tramitar na Câmara do Rio no dia 4 de outubro, com uma redução de R$ 3 bilhões em relação a este ano, segundo a FGV (Fundação Getúlio Vargas). Em 2016, o orçamento da prefeitura foi de R$ 30,8 bilhões.

A criação de equipes de choque nas UOPs (Unidades de Ordem Pública), prometida por Crivella, recebeu críticas dos especialistas. As UOPs estão subordinadas à Guarda Municipal.

Tânia Rêgo/Agencia Brasil

"A Guarda Municipal possui o Grupamento Tático Móvel, que é uma força especial tem atribuição que se aproxima com uma equipe de choque. E é ele que deveria ser reforçado", afirma o especialista em segurança Paulo Storani.

Mediação de conflitos já existe

Freixo, por sua vez, aposta na criação de novas instâncias para resolver conflitos urbanos e discutir as estratégias que serão adotadas na área de segurança pública. Uma de suas propostas é levar centros de mediação de conflitos urbanos para as regiões administrativas da cidade.

No entanto, o Tribunal de Justiça do Rio já possui o Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos e o Ministério Público Estadual tem o Grupo de Mediação e Resolução de Conflitos.

O candidato do PSOL argumenta que sua ideia é executar uma política integrada com esses dois órgãos e também com Defensoria Pública, a Ordem dos Advogados do Brasil, o Conselho Regional de Psicologia e o Conselho Regional de Serviço Social.

"O programa de centros de mediação de conflitos será o resultado da articulação em rede de uma série de órgãos que precisam trabalhar em conjunto", explicou.

Freixo também promete criar outra instância que já existe. Trata-se do Conselho Municipal de Segurança Cidadã, "que terá funções consultivas e deliberativas, de articulação, informação e cooperação entre todas as entidades que possam intervir ou se envolver na prevenção e na melhoria da segurança da população carioca".

O Rio conta com 19 Conselhos Comunitários de Segurança, um em cada Área Integrada de Segurança Pública na capital. Esses conselhos são coordenados pelo ISP (Instituto de Segurança Pública), órgão do governo estadual.

"Esta proposta pode ser interessante, desde que prefeitura e governo estadual discutam juntos os temas pertinentes ao Rio, pois é o poder público estadual quem anima os conselhos coordenados pelo ISP", afirmou Sento-Sé.

Praças abertas

Outra medida que Freixo aplicará caso seja eleito é a retirada de grades das praças. O candidato afirma que a melhor maneira de garantir segurança é estimular o uso dos espaços públicos. E promete levar arte, cultura, esporte e lazer.

Sento-Sé explica que a associação entre o uso dos espaços da cidade e segurança pública é consenso entre pesquisadores do tema. "Quanto mais as pessoas são alijadas do espaço público, mais violenta fica a cidade", disse o sociólogo.

Já para Storani, é preciso alertar que as praças inevitavelmente ficarão vazias em algum momento do dia ou da noite. "É importante prever isso diante do nível de segurança que temos hoje no Rio. Tirar as grades só para dizer que o espaço é de todo mundo não adianta."

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