Em agenda privada, Crivella usa boatos contra Freixo para conquistar apoios

Bruno Braz e Gustavo Maia

Do UOL, no Rio

  • Bruno Braz/UOL

    Crivella (o quarto da esquerda para a direita) se reuniu com dirigentes esportivos

    Crivella (o quarto da esquerda para a direita) se reuniu com dirigentes esportivos

Em evento que não constava na sua agenda pública para esta sexta-feira (21), o senador Marcelo Crivella (PRB), candidato a prefeito do Rio de Janeiro, atacou o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL) citando boatos espalhados contra o oponente no início do segundo turno. Crivella participou de almoço fechado, no início da tarde, com os presidentes dos quatro maiores clubes de futebol da cidade ---Flamengo, Vasco, Fluminense e Botafogo-- e da Ferj (Federação de Futebol do Estado do Rio), a quem pediu apoio.

Dizendo-se "decepcionado" e "apavorado" com o comportamento de Freixo, que usou inserções de televisão para explorar as polêmicas envolvendo posições de Crivella enquanto bispo da Igreja Universal, ele declarou que os adversários pensam em "ensinar nossas crianças de seis anos de idade que não tem menino nem menina e que eles têm que experimentar para ver se são homem ou mulher".

Ouça fala de Crivella sobre suposto projeto de educação sexual de Freixo

O candidato do PRB, que viu sua vantagem para Freixo cair nove pontos percentuais na pesquisa Ibope divulgada nesta quinta, afirmou ainda que os adversários são favoráveis à "escola com partido". "É isso que eles querem. [Com alunos de] seis, oito, nove anos de idade, essas escolas vão ser visitadas por militantes políticos que vão falar sobre [o ditador russo Josef] Stalin, sobre China, sobre Cuba, sobre [o ex-presidente cubano] Fidel [Castro]", declarou.

A reportagem procurou Freixo para comentar as declarações de Crivella. Sua assessoria de imprensa informou que ele participava de uma reunião de coordenação por volta das 15h30, e até o momento não retornou. Procurada pelo UOL, a assessoria de Crivella também não comentou o caso até a publicação da reportagem.

Em discurso de aproximadamente 15 minutos, realizado no jardim da casa de um dirigente esportivo, no Humaitá, zona sul do Rio, Crivella também anunciou que sua campanha iria começar a apresentar, a partir desta sexta, o vídeo com o trecho de um discurso do professor universitário Mauro Iasi, candidato à Presidência da República em 2014 pelo PCB, único partido coligado ao PSOL no Rio.

Ouça declarações de Crivella sobre suposta proposta de Freixo para escolas

"Ele diz o seguinte, e de maneira enfática, em um auditório lotado com mais de mil pessoas: 'os que não pensam como nós, os da direita [...] as vezes são boas pessoas. Então, vamos conseguir para eles, um bom paredão, uma boa espingarda, um bom tiro, uma boa pá e uma boa cova, e vamos enterrá-los. Com a direita, não tem diálogo, é a luta'", contou. "Esse é o partido. Esses são os valores", comentou Crivella.

A manifestação de Iasi, durante o 2º Congresso Nacional CSP-Conlutas (Central Sindical e Popular), realizado no ano passado, era na verdade um trecho do poema "Perguntas a um homem bom", do dramaturgo e poeta alemão Bertold Brecht. O próprio Crivella foi alvo de boato por conta de um vídeo que trazia um trecho descontextualizado de uma fala durante o primeiro turno da campanha.

No vídeo editado, Crivella aparece dizendo que "negros só gostam de cachaça, prostíbulo e macumba". O candidato publicou outro vídeo com o contexto da fala, em que diz a frase como algo que ouviu de outra pessoa quando viveu na África, como missionário religioso.

Ouça declarações de Crivella sobre relação com Freixo

Ao explicar porque iria usar o pronunciamento de Iasi na TV, ele usou duas informações erradas. "É uma fala do presidente do partido [PCB] coligado ao PSOL e que deu a vice dele, aquela senhora chamada [Luciana] Boiteux", disse. Mauro Iasi não preside a legenda --ele é membro do Comitê Central do partido-- e Luciana é do PSOL. "Vocês vão ficar estarrecidos quando verem (sic) na televisão", comentou Crivella.

O senador afirmou ainda que Freixo é um "arrivista" (aquele que quer vencer a qualquer custo) e que, no primeiro turno, os dois tinham "um diálogo muito fidalgo". "Ele me ligava e eu ligava para ele. Nós achávamos que o PMDB, pelos escândalos desalentadores que protagonizou na nossa terra, deveria nem ir para o segundo turno, sofrer uma reciclagem. E nessas conversas, então, nós falávamos sobre os debates, sobre as pesquisas, trocávamos informações", falou Crivella.

Crivella para Freixo em debate: "você não pode colocar [boatos] nas minhas costas"

"Passou a primeira fase, e quando entrou o segundo turno, de repente, sem nenhuma razão, no programa de televisão, eu passei a ser o homem das milícias, o sujeito que vai matar os homossexuais, que vai trazer de volta toda a corrupção do [ex-governador Anthony] Garotinho (PR), e chutar a santa", declarou o candidato do PRB. "Eu pergunto a vocês: isso é comportamento de um... de um cidadão? É justo isso? É honesto? Pois é isso exatamente que está ocorrendo".

Crivella afirmou ainda que se surpreendeu ao ser chamado de covarde por Freixo, que criticou sua ausência em debates. "Aquele que há duas semanas atrás (sic) me chamava de companheiro, 'vamos à luta, se nós dois chegarmos ao segundo turno, o Rio de Janeiro já venceu, estamos livres da corrupção'. Olha, que decepção eu tive. E que decepção terá o Rio de Janeiro se, mais uma vez, com essa mensagem de preconceito, de religião, que não tem nada a ver com o processo eleitoral, ele conseguir nos derrotar", disse.

Ele também aproveitou o encontro para se defender das acusações de que sua relação com a Universal, fundada pelo tio, o bispo Edir Macedo, vai interferir no governo caso seja eleito. "Eu faço um apelo a todos os senhores que nos ajudem, porque não haverá ninguém da Igreja Universal na prefeitura, nem a [TV] Record [pertencente a Macedo] vai se beneficiar. Pelo contrário. Eu terei que ir até a última linha do código de postura porque vou ser vigiado o tempo todo. Para a igreja o bom é que se fosse um outro prefeito e não eu", declarou.

Ouça declarações de Crivella sobre a Igreja Universal e a TV Record

Apesar de não aparecer na agenda do dia divulgada por sua assessoria de imprensa na noite desta quinta (20) --o comunicado informava apenas que ele participaria de um encontro com entidades e lideranças ligadas às pessoas com deficiência, pela manhã--, o almoço foi divulgado duas horas após o fim do evento. A assessoria informou que o evento foi marcado de última hora e por isso não foi previamente anunciado.

Durante o almoço, o presidente do Vasco da Gama, o ex-deputado federal Eurico Miranda, roubou a cena ao declarar apoio a Crivella e repúdio a Freixo. Os demais dirigentes preferiram não manifestar sua preferência política.

À noite, Crivella viu fotos suas fichado pela polícia em 1990 estamparem a capa da revista "Veja", que trouxe reportagem sobre o episódio no qual o então pastor da Igreja Universal do Reino de Deus foi detido em flagrante por invasão de domicílio, acompanhado por homens armados com revólver.

Na manhã deste sábado, ele disse que nunca foi preso e classificou o caso como uma "confusão danada".

Bruno Braz/UOL
O candidato do PRB discursou durante almoço com cartolas na zona sul do Rio

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