Marcelo Freixo (PSOL) chegou ao segundo turno da eleição para a Prefeitura do Rio de Janeiro com 18,26% dos votos válidos. Seu pior desempenho foi na zona eleitoral de Santa Cruz, na zona oeste, região pobre da cidade e onde ele teve apenas 7,34% dos votos. Lá, muitos territórios são controlados por milícias, que foram alvo de uma CPI presidida por Freixo na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio).

O trabalho à frente da comissão, em 2008, lhe garantiu visibilidade política, insuflada pelo sucesso do filme "Tropa de Elite 2". Mas isso parece não ter sido o suficiente para que ele seja reconhecido em bairros mais afastados da zona sul e do centro do município.

"O Freixo teve que reforçar o discurso de esquerda para mobilizar a militância e chegar ao segundo turno, mas agora a missão é outra. (...) Agora ele vai ter mais tempo de televisão e, evidentemente, vai ter que tentar desidratar o Crivella [Marcelo Crivella, que disputará com Freixo o segundo turno no Rio] nas regiões que ele tem maioria, como por exemplo zona norte e zona oeste", analisa Geraldo Tadeu Monteiro, cientista político do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro) e autor do livro "O Manual do Candidato às Eleições".

Na segunda-feira (3), a reportagem do UOL esteve em Santa Cruz --onde vivem mais de 217 mil pessoas-- para conversar com os moradores e frequentadores do bairro a respeito da candidatura de Freixo. A maioria dos entrevistados afirmou que desconhecia o deputado estadual do PSOL até a passagem dele ao segundo turno do pleito municipal.

"Nem conheço ele direito. Esse cara já veio aqui? O Crivella, eu sei que veio aqui", afirmou a dona de casa Lúcia Batista, 57, referindo-se a uma atividade de campanha do adversário do PRB. "Olha, eu confesso que não conheço direito o Freixo. Sei que ele ganhou do Pedro Paulo, mas nunca tive informação sobre ele. Para mim, foi até surpresa. Achei que o Pedro Paulo iria para o segundo turno", comentou José Renato Barbosa dos Santos, 35.

"Eu não conhecia esse tal de Freixo até agora. Mas como eu não confio no Crivella para nada, vou votar nele", brincou Celi Barbosa, 60, que tem uma barraquinha de pipoca próxima à estação do BRT Santa Cruz. Das pessoas ouvidas, ela foi a única a declarar voto em Freixo. "Meu candidato era o Pedro Paulo, mas já que ele não entrou, vou votar nesse outro rapaz", disse ela. "Freixo?" "Isso, esse aí mesmo", respondeu.

Ao UOL, Freixo afirmou que a falta de conhecimento pode estar relacionada ao pouco tempo tempo de TV que o candidato tinha no primeiro turno dentro do horário eleitoral --apenas 11 segundos em um bloco de dez minutos.

"Por causa do pouco tempo de TV, é difícil tornar nossa candidatura conhecida. Contamos com as redes e a rua. Nesta campanha, fizemos algumas atividades em Santa Cruz, inclusive um debate completamente lotado na Universidade Cândido Mendes."

Nós não temos rejeição alta em Santa Cruz e a falta de conhecimento pode ser resolvida agora no segundo turno, com mais tempo de TV.

Marcelo Freixo

Receio com as milícias

Durante o primeiro turno, em uma entrevista à "TV Globo", Freixo foi questionado sobre a sua agenda de campanha para a zona oeste carioca. Na ocasião, jornalistas da emissora afirmaram que haviam checado o calendário de atividades no site do candidato e que, segundo tais informações, o deputado pouco havia ido à zona oeste (apenas 10% dos eventos).

Freixo respondeu que evitava divulgar publicamente sua agenda nos bairros dessa região, pois isso poderia oferecer riscos a ele e a sua equipe.

"Fui presidente da CPI das Milícias, que são muito presentes na zona oeste. Nem todo lugar da zona oeste eu posso ir, por segurança. Eu não posso avisar que vou a Campo Grande em determinado horário", declarou.

"Candidato zona sul"

Alheios às preocupações do pleiteante do PSOL, as amigas Solange Guerra, 45, e Sônia Cristina Gomes, 51, dizem que "Freixo não tem a cara da zona oeste". Questionadas sobre o que o candidato poderia fazer para captar votos na região, ambas responderam que ele deveria fazer mais campanha pelo bairro.

Sônia Cristina disse ainda ter "ouvido falar" que Freixo era um "candidato zona sul". "Já vi gente comentando que ele é mais lá de baixo [em referência a regiões mais próximas do centro do Rio], que muita gente rica vota nele."

O cientista político Geraldo Tadeu Monteiro afirma que a associação da imagem de Freixo à zona sul se tornou uma "marca". "É uma marca dele. É morador da zona sul, que tem um perfil muito próprio. O bairro de Laranjeiras é um epicentro, um reduto dos movimentos pró-Freixo porque concentra boa parte dos trabalhadores intelectuais, profissionais liberais e funcionários públicos federais."

Graves indicadores sociais

Santa Cruz tem graves problemas sociais e de infraestrutura, de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Estatísticas do Censo 2010 compiladas pelo IPP (Instituto Pereira Passos) mostram que o IDS (Índice de Desenvolvimento Social) na região é de 0,527 --quanto mais próximo de um, melhor o indicador.

No topo do ranking, está a Lagoa, na zona sul carioca, que tem 0,819. Além disso, o estudo mostra que 34% dos domicílios não possuem serviço de esgoto adequado, e 67% têm rendimento domiciliar per capita até um salário mínimo.

Votação expressiva em Laranjeiras

Do outro lado da cidade, na região de Laranjeiras e Cosme Velho, na zona sul, Freixo obteve um resultado expressivo: mais de um terço das pessoas que votaram nele (39,49%) ali estava no domingo (2). O UOL também circulou por ruas desses bairros para conversar com eleitores do candidato do PSOL.

Segundo Felipe Ferreira, 38, as questões ideológicas são determinantes nesse recorte geográfico da disputa pela Prefeitura do Rio. "Todo mundo que vota no Freixo tem uma linha ideológica mais à esquerda, como o pensamento dele, por exemplo, em relação a políticas de repressão às drogas", declarou.

Para arquiteta e urbanista Larissa Paredes, 29, Freixo é o único candidato que sugere um "projeto de cidade", articulado a partir de um diálogo com vários setores da sociedade. "Como urbanista, eu sempre me preocupei em ter um papel social na construção da cidade. E essa é a principal proposta do Freixo", declarou ela, que ainda citou teóricos como David Harvey (autor do livro "Cidades Rebeldes") e Jane Jacobs ("Morte e Vida de Grandes Cidades") para fundamentar seu apoio ao concorrente do PSOL.

"Existe uma tendência mundial de concentração das cidades. Mas quanto maior a concentração, menor é a qualidade de vida da população urbana. É preciso investir em mobilidade e em uma ideia de urbanismo sustentável, com uma gestão de pulso firme. Acredito que o Freixo representa esses ideais", explicou.