Quase metade dos vereadores do Rio trocou de partido no atual mandato

Gustavo Maia

Do UOL, no Rio

  • Júlio César Guimarães/UOL

    Plenário da Câmara dos Vereadores, que fica no centro do Rio

    Plenário da Câmara dos Vereadores, que fica no centro do Rio

A infidelidade partidária está longe de ser raridade no Legislativo carioca. No plenário da Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, hoje é quase tão fácil encontrar um parlamentar que tenha trocado de partido no atual mandato quanto quem se manteve na legenda pela qual foi eleito.

Dos 51 vereadores em exercício, 23 trocaram de partido desde o início desta legislatura, em 2013 --todos eles são candidatos à reeleição, à exceção de Jorge Braz (PSB). A quantidade representa 45% do total. O número é ainda maior quando se considera a quantidade de desfiliações: 30. Isso porque seis parlamentares fizeram pelo menos duas mudanças nesse período.

O troca-troca partidário reconfigurou a representação das legendas na Casa. No último pleito, foram eleitos representantes de 20 partidos. Atualmente, são 18 --sendo que quatro destes não elegeram representantes ou não existiam em 2012. O Brasil tem 35 siglas registradas no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Partido do prefeito Eduardo Paes, o PMDB foi o mais beneficiado, sendo o destinatário de oito dos vereadores em exercício. Com as mudanças, a legenda ampliou a liderança na quantidade de representantes na Câmara, com 18 parlamentares --pouco mais de um terço do total. O partido, entretanto, também perdeu duas representantes.

Representação por partido em 2016

  • PMDB: 18 (elegeu 13)
  • DEM: 5 (elegeu 3)
  • PSOL: 4 (elegeu 4)
  • PT: 3 (elegeu 4)
  • PP: 3 (elegeu 3)
  • PTB: 3 (elegeu 2)
  • PRB: 2 (elegeu 2)
  • Rede: 2 (não existia)
  • Solidariedade: 2 (não existia)
  • PDT: 1 (elegeu 2)
  • PSDB: 1 (elegeu 2)
  • PSB: 1 (elegeu 2)
  • PSC: 1 (elegeu 2)
  • PHS: 1 (elegeu 1)
  • PRTB: 1 (elegeu 1)
  • PSD: 1 (elegeu 1)
  • Pros: 1 (não existia)
  • PMN: 1 (não elegeu vereador)

"É natural que a bancada do partido do governo cresça. Estar na situação torna as coisas muito mais fáceis para o parlamentar, já que a grande maioria vive de levar melhorias para os seus bairros", analisa o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, professor do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro).

Segundo o pesquisador, outro fator que contribui para a alta rotatividade é o perfil do eleitor, que em geral é indiferente às trocas de legenda pelos vereadores. "Várias pesquisas apontam que só 30% do eleitorado consideram o partido quando vão votar. Normalmente, foca-se na pessoa", diz.

No caso de siglas pequenas, elas são praticamente plataformas para a pessoa se eleger

Geraldo Tadeu Monteiro, cientista político

O cenário, para ele, expõe ainda "a total falta de efetividade" da decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre o mandato pertencer ao partido, "já que o Supremo abriu algumas brechas". Para Tadeu Monteiro, são cada vez mais raras as candidaturas "realmente ideológicas".

Além do PMDB, outros dez partidos ganharam membros no Legislativo carioca nesta legislatura. O DEM, com duas adições, passou a ter a segunda maior bancada na Casa. 

Recordista de trocas

Tadeu Monteiro lembra ainda que a criação de cinco partidos nos últimos três anos contribuiu para a reacomodação dos políticos. Três deles foram os destinos de cinco vereadores do Rio: Jefferson Moura e Marcio Garcia foram para a Rede; Dr. Carlos Eduardo e Dr. Jorge Manaia migraram para o Solidariedade; e Paulo Messina está no Pros.

Messina, aliás, é o recordista de trocas neste ciclo eleitoral. Eleito pelo PV, migrou para o Solidariedade, ficou sem partido e ainda passou pelo PMDB. Tudo isso em menos de quatro anos.

Reprodução/Facebook
Paulo Messina (Pros), vereador e candidato à reeleição, é o campeão de troca de partidos

Em entrevista ao UOL, o vereador destacou que ficou seis anos no PV e só deixou o partido após "brigas internas". "Todo mundo começou a sair, o clima já não estava mais legal", disse. A ida em 2014 para o Solidariedade, criado no ano anterior, fez parte uma busca por outra legenda em que tivesse "vida orgânica". "Queria começar do zero", conta. A saída, no ano passado, ocorreu, segundo ele, porque "faltou ideologia no partido". O presidente do diretório municipal do partido, Frederico Andrade dos Santos, afirmou que a saída de Messina "se deu em razão de divergências com a bancada por conta de ideologias partidárias".

Depois de passar um período sem vinculação partidária, tomou a "decisão pragmática" de se filiar ao partido do governo municipal, para tentar garantir avanços para a categoria de educação. A migração para o Pros, também criado no atual ciclo eleitoral, ocorreu em março deste ano, após receber convite para fundar e presidir o diretório da legenda na cidade. "Foi uma decisão ideológica. Em um momento de crise institucional, foi uma oportunidade de pegar uma coisa nova."

Outra situação curiosa é a da vereadora Rosa Fernandes, que está no sexto mandato consecutivo na Casa, desde 1993, e no quinto partido. Neste mandato, para o qual se elegeu pelo PMDB, ela migrou para o Solidariedade para depois se mudar justamente para o PMDB. A reportagem procurou a vereadora por telefone no seu gabinete por várias vezes e chegou a ser orientada a enviar um e-mail para a sua assessora de imprensa. Dois e-mails foram enviados, mas nenhum foi respondido até o momento.

Vereadores que trocaram de partido

  • Alexandre Isquierdo (DEM): Saiu do PMDB
  • Atila A. Nunes (PMDB): Saiu do PSL
  • Carlos Bolsonaro (PSC): Saiu do PP
  • Dr. Carlos Eduardo (Solidariedade): Saiu do PSB
  • Dr. Eduardo Moura (PMDB): Saiu do PSC
  • Dr. Gilberto (PMN): Saiu do PTN
  • Dr. Jairinho (PMDB) - Saiu do PSC e passou pelo Pros
  • Dr. João Ricardo (PMDB): Saiu do PSDC e passou pelo Solidariedade*
  • Dr. Jorge Manaia (Solidariedade): Saiu do PDT
  • Eduardão (PMDB): Saiu do PSDC
  • Jefferson Moura (Rede): Saiu do PSOL
  • Jorge Braz (PSB): Saiu do PMDB*
  • Junior da Lucinha (PMDB): Saiu do PSDB
  • Leonel Brizola Neto (PSOL): Saiu do PDT
  • Marcelinho D'Almeida (PP): Saiu do PSB e passou pelo Pros
  • Marcelo Arar (PTB): Saiu do PT*
  • Marcio Garcia (Rede): Saiu do PR
  • Mario Junior (DEM): Saiu do PTB
  • Paulo Messina (Pros): Saiu do PV e passou pelo Solidariedade e pelo PMDB*
  • Professor Rogério Rocal (PTB): Saiu do PSDC*
  • Renato Moura (PDT): Saiu do PTC e passou pelo Pros
  • Rosa Fernandes (PMDB): Saiu do PMDB e passou pelo Solidariedade
  • Veronica Costa (PMDB): Saiu do PR

* Ficou um período sem partido

Legendas perdem representantes

Após o troca-troca, seis partidos que elegeram vereadores em 2012 perderam todos os representantes na Casa desde o início da legislatura: PSDC (3), PR (2), PTC (1), PV (1), PTN (1) e PSL (1).

O PSDC (Partido Social Democrata Cristão) foi o mais prejudicado pela infidelidade partidária nesse ciclo eleitoral. Para André Luiz dos Santos, presidente municipal da sigla há um mês e também subprefeito da zona norte do Rio, o partido precisa manter diálogo constante com seus representantes para evitar a evasão.

Reprodução/Facebook
André Luiz dos Santos é presidente do PSDC no município do Rio de Janeiro

"Devemos elaborar projetos juntos. O partido pode fazer proposições por meio dos seus vereadores, por exemplo. Isso não estava acontecendo antes", declarou Santos. Segundo o dirigente, Dr. João Ricardo saiu do PSDC por divergências ideológicas com o presidente anterior da legenda na cidade, em acordo entre as duas partes, e Eduardão e Rogério Rocal decidiram disputar as eleições deste ano por outros partidos. Eleito vereador em 2012, Luiz Carlos Ramos foi eleito deputado federal pelo PSDC em 2014, mas em fevereiro trocou a sigla pelo PTN.

Único dos três vereadores em exercício a responder às solicitações da reportagem, Rocal declarou que saiu da legenda por achar que sua eleição em um novo pleito seria mais viável no PTB. "O partido [PSDC] não estava harmônico quanto a minha permanência. Inclusive, ao me desfiliar, nem fizeram questão de minha permanência."

Por que trocou?

O UOL questionou todos os vereadores citados na reportagem nos e-mails disponíveis nas suas páginas no site da Câmara dos Vereadores. Também ligou para cada gabinete, mais de uma vez, desde a última segunda-feira (5), para confirmar o recebimento dos pedidos. Além de Paulo Messina e Rogério Rocal, apenas Leonel Brizola Neto respondeu até a publicação desta reportagem.

Divulgação
Brizola Neto trocou o PDT pelo PSOL

O ex-pedetista, neto mais velho do ex-governador Leonel de Moura Brizola, fundador do partido, declarou que a saída, em setembro do ano passado, foi "uma decisão sofrida e difícil", mas as desavenças com o atual presidente do PDT, Carlos Lupi, "sobre as alianças e os rumos do partido não deixaram outra saída". "Lupi chegou a processá-lo depois que Brizola acusou o PDT de ser uma legenda de aluguel, uma espécie de apêndice do PMDB", declarou sua assessoria de imprensa, em nota. "O PMDB é a antítese do brizolismo", completa o texto. Segundo informações do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio), Lupi pediu indenização pela declaração, o que foi negado. Houve recurso, mas também foi julgado improcedente.

A escolha pelo PSOL obedeceu, segundo ele, "aos critérios brizolistas que o orientam desde a juventude". "Se meu avô fosse jovem, hoje estaria militando no PSOL", disse o vereador.

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