Câmara de Porto Alegre gasta R$ 658 mil em viagem pró-Cuba e para ver luta

Flávio Ilha

Colaboração para o UOL, em Porto Alegre

  • Ronaldo Bernardi/Agência RBS

    Fachada da Câmara dos Vereadores de Porto Alegre

    Fachada da Câmara dos Vereadores de Porto Alegre

A Câmara Municipal de Porto Alegre gastou, entre janeiro de 2013 e agosto deste ano, R$ 658.439,87 em despesas de viagens de vereadores e funcionários. Em quatro anos de legislatura, o gasto total da Câmara deve ser de cerca de R$ 350 milhões, incluindo salários. Entre as viagens realizadas, estão uma convenção em Foz do Iguaçu (PR) em solidariedade a Cuba e um campeonato júnior de muay thai na Turquia.

Apenas em diárias (que incluem despesas de hospedagem, alimentação e transporte, mas excluem as passagens aéreas), foram R$ 308 mil em três anos e meio, somando vereadores e funcionários. Só os vereadores gastaram 65% dessa verba: R$ 199.778,62 com diárias no Brasil e no exterior. Tiveram gastos com viagens 23 dos 36 vereadores, sendo que 15 deles viajaram para fora do país.

No mesmo período (desde 2013), a Câmara despendeu R$ 350.324,83 com bilhetes aéreos no Brasil e no exterior. A Casa, no entanto, não discrimina dos gastos com passagens por vereador.

Recordistas em gastos

A vereadora Jussara Cony (PCdoB), recordista entre seus colegas, gastou quase R$ 30 mil em seu mandato com diárias de viagem pagas pela Câmara Municipal de Porto Alegre.

Só no primeiro ano foram sete viagens, a um custo total de R$ 10.154,29 --a maioria delas para participação em eventos relacionados à área da saúde (a vereadora é farmacêutica) ou de cunho feminista.

Jussara argumenta que os gastos com diárias referem-se estritamente ao trabalho legislativo. "Na condição de vereadora e por vezes como representante da Câmara de Porto Alegre, participei de atividades relacionadas à construção de políticas públicas importantes para a cidade na área social --como saúde, direitos das mulheres e reforma urbana", explicou. 

Reprodução/Facebook
Jussara Cony é a campeã de gastos com diárias de viagens

Segundo a parlamentar, os debates de que participou "contribuíram" para a concretização de ações ou projetos que viraram leis. Jussara citou a lei 11.552 (de 2014), que incluiu o ensino da Lei Maria da Penha no currículo de direitos humanos das escolas. Também destacou que desistiu de participar da edição de 2013 do Fórum Social Mundial, realizado na Tunísia, "por entender que o gasto seria demasiadamente alto".

Em Foz do Iguaçu, em junho de 2013, a vereadora recebeu R$ 868,92 (equivalente a uma diária e meia) para participar da 21ª Convenção Nacional de Solidariedade a Cuba. Em 2014, a Câmara pagou duas diárias e meia para que a vereadora participasse do 9º Congresso Nacional da União Brasileira de Mulheres, em Brasília.

No ano passado, foram R$ 4.600 em diárias para participação no Fórum Social Mundial da Biodiversidade, em Manaus, e outros R$ 3.000 para presença no seminário internacional do Fórum Social Mundial em Salvador.

Neste ano, a parlamentar já obteve financiamento público para participar da 4ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, em Brasília, e para um seminário sobre emancipacionismo e identidade de gênero em Salvador.

Em segundo lugar no ranking de gastos de diárias está o vereador Waldir Canal (PRB), quena atual legislatura recebeu R$ 24,5 mil para viajar nove vezes à capital federal --em apenas uma ocasião o vereador participou de um seminário em Curitiba. Só em 2016, o parlamentar já recebeu quase R$ 9.000 em diárias para participar de eventos em Brasília.

A reportagem do UOL questionou a assessoria do vereador, por telefone e por e-mail, sobre o conteúdo de seus roteiros em Brasília, mas o gabinete não apresentou uma justificativa para os deslocamentos do parlamentar.

A suplente Séfora Mota (PSB), que assumiu o mandato entre 2013 e 2015, é a terceira que mais gastou em diárias de viagens: R$ 17.396,87, incluindo um curso de capacitação para orientadores em sexualidade e diversidade funcional (para pessoas com deficiência) realizado em Buenos Aires, na Argentina, entre 20 e 22 de março de 2014. Só em diárias, a participação no curso custou R$ 3.378,69.

Ela também participou, em 2013, do lançamento de uma linha de roupas de ginástica para pessoas com deficiência em São Paulo, com um custo de R$ 938,52 por uma diária e meia. Só no primeiro ano de suplência foram cinco viagens a um custo total em diárias de R$ 8.909,96.

"Todas as minhas viagens foram feitas a partir de convites e aprovadas pela Câmara Municipal. Cada um dos eventos teve como objetivo aprofundar o conhecimento e estabelecer troca de experiências para trazer à população de Porto Alegre, neste caso em especial à população com deficiência, subsídios para que possamos desenvolver projetos e políticas que aumentem a inclusão e acessibilidade", justificou em nota.

Viagens para o exterior

petista Carlos Comassetto utilizou oito diárias internacionais em 2015 --R$ 10,2 mil-- para representar a Câmara durante a Expo Milão, na Itália. No ano passado, o parlamentar esteve também em Manaus e em Brasília. Na Itália, o vereador teve a companhia do presidente da Câmara, Cássio Trogildo (PTB), que está inelegível devido a uma condenação por abuso de poder econômico na campanha de 2012.

"O objetivo da Expo Milão foi de promover o debate sobre como nutrir o planeta de forma sustentável, justa e saudável. Foi um intercâmbio importante com técnicos de muitos países que têm investido nesse segmento", explicou o parlamentar, que é engenheiro agrônomo.

Já o socialista Airto Ferronato passou cinco dias, em março de 2013, em Istambul, na Turquia, para acompanhar o Campeonato Mundial Júnior de Muay Thai. O roteiro custou R$ 5.908,69 apenas em diárias. Ferronato justificou que participou do evento para oferecer Porto Alegre como sede do torneio de 2015, que acabou se realizando na Tailândia.

O regimento da Câmara não prevê aprovação pelo plenário para roteiros de parlamentares, mas estabelece um limite de R$ 16.237,71 em diárias e passagens aéreas por ano. A cotação, bem como a compra das passagens, é feita pela Câmara, e não pelos gabinetes.

O presidente da Câmara, Cássio Trogildo, afirmou que os gastos com deslocamentos dos vereadores de Porto Alegre é "bem menor" do que permite o regimento interno. Além disso, justificou que os parlamentares prestam contas na tribuna das viagens que realizaram.

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