Violência no Rio

Medo de morrer faz pré-candidato a prefeito abandonar eleição em Magé (RJ)

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

  • Marcelo Carnaval / Agência O Globo

    Líder do PSDB no Rio, Otávio Leite tentava articular uma candidatura viável em Magé (RJ)

    Líder do PSDB no Rio, Otávio Leite tentava articular uma candidatura viável em Magé (RJ)

Interessado em retomar o poder em Magé, cidade da Baixada Fluminense, após 12 anos, o diretório do PSDB no Rio planejava até pouco tempo encontrar uma opção viável para concorrer à prefeitura. A missão cabia ao presidente tucano no Estado, o deputado federal Otávio Leite, que disse ao UOL ter achado, há alguns meses, o "candidato perfeito".

Tratava-se de um homem descrito como "família" e "muito religioso". Leite não esperava, porém, que o correligionário desistisse de encabeçar a chapa tucana por uma razão estranha ao ambiente democrático: o medo de morrer. O escolhido não quis sequer ser identificado pela reportagem.

O temor do pré-candidato, por outro lado, é coerente. Desde 1997, ao menos 14 pessoas ligadas à política municipal foram assassinadas. Desde novembro do ano passado, em toda a região da Baixada Fluminense, houve 13 homicídios contra vítimas que ocupavam cargos eletivos ou que pretendiam ingressar na vida pública --dois deles em Magé.

O caso que alarmou o tucano desistente, afirma Leite, foi o do vereador Geraldo Gerpe (PSB), 41, morto a tiros dentro do estacionamento da Câmara Municipal. Em meados de julho, a pré-candidata a vereadora Agá Lopes Pinheiro (DEM) foi assassinada quando estava com o marido em um bar no bairro da Barbuda. Os inquéritos estão a cargo da DHBF (Divisão de Homicídios da Baixada Fluminense).

Após o assassinato de Gerpe, o então pré-candidato tucano começou a ser pressionado pela família para que abandonasse o projeto político. E o fez sem pensar duas vezes.

"A pessoa me procurou e disse que, pela pressão em casa, não estava mais disposto a concorrer. Afirmou que lamentava muito, mas que o ambiente político da região representava uma insegurança para ele e para família. Um risco que ele não queria correr e ponto final", explica o presidente do PSDB fluminense.

A pedido da reportagem, Leite tentou contato com o antes pré-candidato a prefeito de Magé, para que ele fosse entrevistado. O convite foi rejeitado e o político respondeu que não se sentia seguro para falar com a imprensa. "A política não era para ser assim", desabafa Leite.

[O pré-candidato] apresentava boas perspectivas. A gente conseguiria compor uma alternativa interessante, uma novidade em relação à clássica realidade de beligerância que existe há muito tempo em Magé, onde existe um nível agudo de radicalização política.
Otávio Leite, deputado federal e presidente do PSDB no Rio

No município, de acordo com o líder tucano, "qualquer candidato precisa andar com seguranças" porque são comuns as tentativas de homicídio. Em geral, o método é simples: as vítimas são abordadas por criminosos em carros ou motocicletas e mortas a tiros. O histórico de violência contra ocupantes ou pleiteantes de cargos públicos na região indica que todos os casos ocorreram praticamente dessa forma.

"Mesmo sabendo que a barra é mesmo pesada em alguns lugares, acho que chegamos ao fundo do poço. (...) Nossos candidatos em Magé sempre comentam esse clima violento. Alguns disseram que evitam andar na rua à noite, relatam problemas com milícias e coisas do tipo", disse Leite.

Na visão do deputado, Magé "está um pouco mais à parte" das atenções eleitorais, o que facilitaria a prática de crimes de motivação política e impulsionaria a sensação de impunidade. "Em outros lugares, as campanhas têm mais televisão. Magé é uma cidade mais escondida. Isso me assusta um pouco", declarou. "Você pega o histórico do município e vê que há lutas fratricidas de grupos lá. E observa que a resolução desses casos tem sido muito precária."

CPI aponta impunidade

Em 2000, uma CPI foi criada na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) para investigar e debater a ocorrência de crimes violentos contra políticos na região metropolitana do Estado. No relatório final, duas das sete conclusões apontadas pela comissão foram a "cumplicidade de agentes do poder público" e "a impunidade como principal elemento propulsor da violência política".

Reprodução
Trecho do relatório da CPI da violência política, realizada na Alerj em 2000

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