Indígena Juruna tenta diálogo com governo federal, mas se opõe a Belo Monte

Alceu Luís Castilho

Da Agência Pública

Reportagem da série "Cartas na Mesa", da Agência Pública, em que cidadãos brasileiros criticam os candidatos à Presidência da República

Estudante de Direito, Amaury Juruna confirma que os indígenas de outro tronco linguístico, como os de sua etnia, possuem um perfil mais aberto à negociação com o governo federal sobre a hidrelétrica de Belo Monte, em relação aos Munduruku e Kayapó. Ele conta que já esteve dos dois lados da moeda: participou do governo e também do Movimento Xingu Vivo para Sempre. Considera que, pela posição radical contra o empreendimento, o movimento acabou não beneficiando ninguém. "Eles não apresentam uma solução", considera. "E também nunca vão às aldeias".

Mesmo assim, ele diz que não é favorável a Belo Monte, no atual contexto que define como "desorganizado". "Estão passando por cima de muita coisa", afirma.  Por outro lado, considera que, antes do empreendimento, as pessoas em Altamira estavam "no meio do deserto". "Existe agora uma movimentação de resgate. O movimento social não tem solução para acabar com a estagnação da cidade".

"As promessas não foram cumpridas de forma adequada", avalia Amaury. "Não foi feito um plano. Criaram novas aldeias, 26, com índios de poucos anos de contato. A Norte Energia deu voadeiras. Mas o motor quebra, eles encostam e vendem. Se uma liderança articula um movimento contra Belo Monte, uma pessoa da Norte Energia dá valor em dinheiro para essa pessoa sair. E ali acaba o movimento. Ele é comprado a partir de uma liderança. Isso é muito comum".

Ele diz que para sair na cidade às seis da tarde, hoje em dia, é preciso usar máscara. "É uma neblina, por causa da poeira. Muita gente na cidade, muito lixo". O indígena relata que houve um protesto muito específico em decorrência da obra: o das prostitutas. "Queriam que a Norte Energia pagasse em datas alternadas", conta Amaury. "Não estavam dando conta".

Antes do carnaval, Amaury foi com mais 15 indígenas, de quatro aldeias Juruna e uma Arara, para Maranhão e Tocantins, ver como viviam os Krahô e Kanela após a construção de uma barragem em suas regiões. Foram com uma consultora de projetos, de São Paulo. E um funcionário da Funai: um motorista. "Ela não era antropóloga, não conhecia nada", relata. "Como contratam uma pessoa que nunca viu indígena numa região de conflitos?"

Ubiratan Cazetta, do Ministério Público Federal, constata que o MPF tem dúvidas em respeito ao cumprimento das condicionantes e dificuldades na fiscalização das verbas. "Em alguns momentos a liberação de recursos pode dar margem a distorções", afirma. "Comunidades indígenas foram utilizadas ou enganadas para ganhos fora da realidade. Algumas lojinhas de Xikrin tiveram um faturamento que levaria dez anos para ser obtido. É um tema que nos preocupa. Mas hoje, com exceção de alguns casos, não temos controle".

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