Indefinição sobre fichas-sujas pode provocar até nova eleição; entenda

Bruna Borges

Do UOL, em Brasília

Políticos considerados "ficha-suja", ou seja, que já foram condenados por tribunais superiores e não poderiam tentar se eleger por causa da Lei da Ficha Limpa, continuam em campanha mesmo após terem as candidaturas barradas pela Justiça e podem até tomar posse, caso sejam eleitos.

Se enquadram nesta situação deputados federais como Paulo Maluf (PP-SP) e Jaqueline Roriz (PMN-DF), que tentam a reeleição. Um dos candidatos, o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda (PR), que tenta voltar ao governo, teve um dos recursos negado pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) na tarde desta terça-feira (9).

O imbróglio acontece porque políticos que tiveram o registro de candidatura negado pelos TREs (Tribunais Regionais Eleitorais) podem manter a campanha enquanto estiverem recorrendo ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para tentar reverter a cassação.

O impasse em torno dessas candidaturas pode ser resolvido apenas depois das eleições e, dependendo, do entendimento do TSE ou do STF (Supremo Tribunal Federal), novas eleições podem ser convocadas ou políticos derrotados nas urnas podem garantir uma vaga no tapetão. 

Veja, passo a passo, quais os procedimentos até que um candidato se torne totalmente inelegível:

Passo a passo das candidaturas "ficha-suja"
  • Shutterstock
    1 - Julgamento no TRE
    O primeiro passo para uma candidatura ser barrada é o julgamento no TRE local, que deve, por maioria, rejeitar o recurso do candidato "ficha suja"
  • Reprodução
    2 - TSE
    2- Em geral, após serem barrados pelo TRE, os candidatos costumam recorrer ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral)
  • Pedro Ladeira/Folhapress
    3 - TSE novamente
    Se o tribunal recusar a candidatura, o político pode recorrer da decisão no próprio TSE
  • Antônio Araujo/UOL
    4 - STF
    Se o recurso for negado novamente pelo TSE, o candidato ainda pode recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal) para tentar modificar a decisão
  • Robson Ventura/Folhapress
    5 - Recurso negado antes da eleição
    Se o candidato apresentar seu último recurso (ao TSE ou ao STF) antes da eleição, sua candidatura será cancelada e ele é considerado inelegível
  • Folhapress
    6 - Recurso aceito depois da eleição
    Se o último recurso for aceito depois das eleições, e o candidato tiver alcançado mais de 50% dos votos nas urnas, os votos são mantidos como válidos, ele é eleito e pode tomar posse
  • Tarso Sarraf/Estadão Conteúdo
    7 - Recurso negado depois da eleição e + de 50%
    Se o recurso final for negado depois das eleições, e o candidato tiver obtido mais de 50% dos votos nas urnas, a eleição será cancelada e o TSE precisa convocar uma nova votação, chamada eleição suplementar. Não há prazo para a nova votação -- ela pode ocorrer mesmo após a posse do candidato no cargo, que seria então cassado
  • Caio Guatelli/Folha Imagem
    8 - Recurso negado depois da eleição e - de 50%
    Se o último recurso for negado depois das eleições, mas o candidato "ficha suja" obtiver menos da metade dos votos, os votos são anulados e o segundo candidato mais votado vence a eleição

Pela legislação eleitoral, não há prazo máximo para que o TSE julgue os recursos -- daí o "limbo" jurídico que se forma. A ordem de julgamentos é definida pelo presidente da Corte, ministro Dias Toffoli.

Para o advogado Luciano Santos, especialista em direito eleitoral e membro do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral) -- um dos formuladores da Lei da Ficha Limpa --, a norma está sendo aplicada corretamente e "tem funcionado muito bem".

"Quando um candidato 'ficha-suja' mantém sua campanha e seu recurso é indeferido, ele faz isso por sua conta e risco. Se ele vai até o final, prejudica o partido, o processo político e a própria eleição", afirmou Santos.

O advogado explica que o direito a recorrer é garantido pela legislação brasileira, que permite que o candidato tente reverter as decisões de cassação em instâncias superiores. Esses recursos já valiam para outros casos de inegibilidade mesmo antes da aprovação da Lei da Ficha Limpa.

"É importante ressaltar o que essas impugnações provocam no eleitor, pois levanta-se o debate sobre a necessidade de se ter a ficha limpa. É um processo que não ocorre de um dia para o outro, mas vem melhorando", defendeu Santos.

O TSE ainda não fez um balanço sobre quantos recursos de cassação de registro com base na Ficha Limpa chegaram até o tribunal. Também não confirmou se irá apresentar o número de recursos e decisões julgadas até o final das eleições.

Os TREs têm até o dia 21 deste mês para concluir os julgamentos de registro de candidatura, então, novos casos de recursos ainda podem chegar ao TSE.

No final de agosto, o Ministério Público Eleitoral divulgou um balanço parcial com os pedidos de impugnações com base na lei. Foram 497 ações, sendo a rejeição das contas do candidato o motivo de maior incidência, com 254 questionamentos de registros.

Os candidatos que estão ameaçados de perder a candidatura, mas que aguardam recursos, podem renunciar até 15 de setembro. Se o candidato for substituído, os dados e a foto da urna serão atualizados a tempo do primeiro turno das eleições, no dia 5 de outubro, conforme o TSE.

Também de acordo com o TSE, não há restrições para que cônjuges assumam as candidaturas de "fichas-sujas" que renunciaram. Neste caso, a mulher ou o marido do candidato ou candidata "ficha-suja" precisa ser filiada ao partido que tem direito à vaga e ser elegível, ou seja, não ser enquadrada nos mecanismos barrados pela Lei da Ficha Limpa, por exemplo.

O mecanismo já foi utilizado em eleições passadas. Em 2010, o ex-governador do DF Joaquim Roriz (PRTB), que é "ficha-suja", colocou sua mulher, Weslian Roriz (PRTB), no seu lugar da candidatura ao governo do DF a nove dias do pleito. Apesar de experiência nenhuma com a política e o pouco tempo de campanha, Weslian chegou ao segundo turno, mas perdeu para o petista Agnelo Queiroz (PT).

Candidatos barrados pela Lei da Ficha Limpa
  • Flávio Florido/UOL
    Paulo Maluf
    O deputado federal Paulo Maluf (PP-SP) tenta a reeleição, mas seu registro de candidatura foi barrado pelo TRE-SP por uma condenação por improbidade administrativa da Justiça de São Paulo. O candidato entrou com um recurso no TSE e aguarda a decisão sobre a ação Foto: Flávio Florido/UOL
  • Pedro Ladeira/Folhapress
    José Roberto Arruda
    O ex-governador José Roberto Arruda (PR-DF) concorre ao governo do Distrito Federal, mas sua candidatura foi barrada pelo TRE-DF por envolvimento no mensalão do DEM. O candidato recorreu ao TSE e a Corte negou seu recurso. Arruda então recorreu da decisão no próprio TSE e espera a análise da nova ação. Também recorreu ao STJ para tentar anular a condenação que o tornou "ficha suja" Foto: Pedro Ladeira/Folhapress
  • Sérgio Lima/Folhapress
    Cesar Maia
    O ex-prefeito do Rio de Janeiro Cesar Maia (DEM-RJ) tenta uma vaga no Senado, mas teve sua candidatura barrada pelo TRE-RJ com base na Lei da Ficha Limpa. Ele tem uma condenação em 2ª instância por suposto uso irregular de recursos públicos para financiar a construção de uma igreja na zona oeste do Rio. Ele recorreu ao TSE e aguarda a decisão sobre o recurso Foto: Sérgio Lima/Folhapress
  • Flavio Florido/UOL
    Soninha Francine
    A ex-vereadora Soninha Francine (PPS-SP), candidata a deputada federal, teve seu registro negado pelo TRE-SP com base na Lei da Ficha Limpa, por contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo quando era diretora técnica da Superintendência do Trabalho Artesanal nas Comunidades do governo estadual. Soninha pode recorrer ao TSE até dia 5 de setembro Foto: Flavio Florido/UOL
  • Lula Marques/Folhapress
    Paulo Rocha
    O ex-deputado federal Paulo Rocha (PT-PA) tenta a vaga do Pará ao Senado, mas de acordo com a Lei da Ficha Limpa, está inelegível porque renunciou ao mandato na Câmara em 2005 para fugir da cassação após o escândalo do mensalão petista. O candidato recorreu ao TSE e aguarda a decisão sobre o recurso Foto: Lula Marques/Folhapress
  • Brizza Cavalcante/Agência Câmara
    Jaqueline Roriz
    A deputada federal Jaqueline Roriz (PMN-DF) tenta a reeleição, mas teve seu registro cassado pelo TRE-DF por uma condenação por improbidade administrativa por envolvimento no mensalão do DEM. Ela recorreu ao TSE e aguarda o julgamento do recurso Foto: Brizza Cavalcante/Agência Câmara

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