Cabos eleitorais no Rio ganham mais que carteiros e técnicos de enfermagem

Silvia Baisch

Do UOL, no Rio

  • Silvia Baisch/UOL

    Walney da Silva vai receber R$ 300 semanais pelo serviço, a ser realizado de segunda a sexta, das 8h às 17h, e aos sábados, das 8h às 13h

    Walney da Silva vai receber R$ 300 semanais pelo serviço, a ser realizado de segunda a sexta, das 8h às 17h, e aos sábados, das 8h às 13h

Liberada desde 6 de julho, a propaganda eleitoral por meio de cavaletes, bonecos, cartazes e mesas para distribuição de material de campanha é, para centenas de pessoas no Rio de Janeiro, uma oportunidade para driblar o desemprego e conseguir uma renda extra nos meses que antecedem a eleição –o primeiro turno está marcado para 5 de outubro. Um "plaqueiro" –pessoa que toma conta do material de publicidade dos candidatos-- pode ganhar mais de R$ 1.200 por mês, dependendo do postulante e do partido. 

O valor é quase o dobro do salário mínimo em vigor atualmente no Brasil (R$ 724) e supera a remuneração inicial de categorias reconhecidas pelo esforço físico, como um carteiro (R$ 1.100), ou que exigem formação técnica, como técnicos de enfermagem e secretariado (R$ 1.177,01). 

A ajudante de cozinha desempregada Yrléia Silva, 52, é uma que está aproveitando a oportunidade. Durante a semana, das 6h30 às 14h, ela cuida de duas placas/bonecos do candidato a deputado estadual Carlos Osório (PMDB) na Tijuca, bairro onde mora, na zona norte do Rio.

Yrléia admite que não conhece muito de Osório – "só falaram que ele foi não sei o que do BRT" – e que a preferência é pela campanha que pagar melhor. "Mas ele está pagando direitinho, R$ 312 por semana (R$ 1.248 por mês)". Osório foi secretário municipal de Transportes do Rio. 

Com o valor, a plaqueira ajuda duas pessoas da família que se encontram acamadas e compra os remédios para a mãe, com quem mora, que sofre do mal de Alzheimer. Sobre o voto, Yrléia diz ainda estar indecisa. 

Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do candidato Carlos Osório não respondeu à confirmação sobre os valores pagos aos plaqueiros até o fechamento da reportagem.

No Largo do Machado, na zona sul, Walney da Silva, supervisor desempregado de 53 anos, começou a cuidar de uma placa do deputado federal Otávio Leite (PSDB), candidato à reeleição, na segunda-feira (25).

Ele vai receber R$ 300 semanais pelo serviço (R$ 1.200 por mês), a ser realizado de segunda a sexta, das 8h às 17h (com uma hora de intervalo para o almoço), e aos sábados, das 8h às 13h.

Silva diz que já conhece o candidato de outras eleições nas quais fez panfletagem, mas que não sabe das propostas que ele defende. "Vou votar nele, porque, como está sempre ganhando, acho que faz alguma coisa", disse. 

A assessoria do candidato informou que a contratação desse tipo de pessoal é um serviço terceirizado.

Apesar de já ter trabalhado em outras eleições, a manicure Catiana Sílvia de Andrade, 29, também está nos primeiros dias de serviço neste ano. Mas confessa não estar muito satisfeita.

Sentada ao lado de um carrinho com a placa do candidato à reeleição a deputado estadual Dionísio Lins (PP), na praça Serzedelo Correia, nas esquinas da rua Siqueira Campos com a avenida Nossa Senhora de Copacabana, a moradora do morro do Pavão-Pavãozinho reclama que os R$ 200 que ganha por semana (R$ 800 por mês) são pouco para ficar cuidando da placa das 8h às 16h. 

"Eu que venho e volto arrastando o carrinho do comitê, a umas cinco quadras daqui. Ainda por cima não recebo dinheiro pra transporte e alimentação", contou. Se vai votar no candidato que representa? "Não sei nem quem é! Não conheço nem as propostas nem o homem. Não vou votar nele, vou anular meu voto!", disse.

A coordenação de campanha de Dionísio Lins confirma que os 15 plaqueiros que atuam na zona sul recebem R$ 800 por mês, "valor esse baseado no que é pago pelos demais candidatos. A coordenação oferece ainda lanche aos que trabalham nesses locais". 

Apesar do interesse financeiro ser predominante, é possível encontrar algumas pessoas que trabalham apenas por gostar do candidato. O morador de rua Luiz Soares de Souza, 57, é um deles.

Ao lado de uma placa da candidata a deputada federal Cristiane Brasil (PTB), na Tijuca, ele, que diz ganhar R$ 1.000 por mês como guardador de carro, recebe R$ 90 no mesmo período para atuar também como plaqueiro. "É bom porque é um dinheirinho a mais. Vou votar neles (a publicidade é conjunta com o candidato a deputado estadual Marcus Vinícius, o Neskau) porque são muito legais", afirmou. 

Questionada sobre o valor pago pelo serviço, a assessoria de imprensa de Cristiane Brasil informou que os plaqueiros ganham R$ 750 por mês para um trabalho de oito horas diárias e que Souza não é um dos cadastrados.

"No entanto, conseguimos saber que uma pessoa moradora daquela região e apoiadora da campanha da Cristiane e Marcus Vinícius fornece, do próprio bolso, uma ajuda de custo ao morador de rua que cuida dos carros na respectiva área", diz a nota. O texto afirma ainda que "todas as pessoas que querem apoiar um candidato o podem fazer até mesmo gratuitamente".

Resolução do TSE

De acordo com a assessoria de imprensa do TRE-RJ (Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro), "não há previsão na resolução do TSE que trata da propaganda eleitoral em 2014 sobre a necessidade de que haja alguém cuidando das placas".

No entanto, a Lei 9504/97 ressalta que esse tipo de publicidade não pode atrapalhar o bom trânsito de pessoas e veículos, sob pena de "apreensão da propaganda, entre outras providências". Dessa forma, instituiu-se a figura do plaqueiro, para evitar a colocação das propagandas em locais indevidos e a recolocação em caso de o material se deslocar para alguma via de circulação de carros.

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