Procurador vê abuso de poder de Eduardo Paes em eventos olímpicos no Rio

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

A participação do atual prefeito do Rio de Janeiro e candidato à reeleção, Eduardo Paes (PMDB), na chegada da bandeira dos Jogos Olímpicos à cidade e a veiculação de propagandas eleitorais relacionadas ao evento, que será sediado pela capital fluminense em 2016, já são consideradas "abuso do poder político" pelo procurador regional eleitoral do Rio, Maurício da Rocha Ribeiro.

"Supostamente ele está na condição de prefeito, mas é um momento de transição. Ele está com essa bandeira olímpica na mão e não larga. Já estão ocorrendo excessos, e inclusive ele começou a disparar várias mensagens seguidas pelo Twitter, começou a extrapolar", disse Ribeiro. "Juntando com outras situações que ocorreram anteriormente, podemos dizer que se configura o abuso de poder político", disse.

A menos de uma semana do início do horário eleitoral gratuito na TV, o candidato da coligação "Somos um Rio" já se prepara, inclusive, para utilizar imagens de suas atividades na Olimpíada de Londres, realizada entre os dias 27 de julho e 12 de agosto. Na visão de Ribeiro, a campanha do peemedebista "está cometendo excessos no uso político dos Jogos".

Especialistas ouvidos pelo UOL afirmam que a exposição de Paes nos eventos relacionados à Olimpíada no Rio fortalece a campanha do atual prefeito e candidato à reeleição. Os dois principais adversários na disputa pela Prefeitura do Rio, Marcelo Freixo (PSOL) e Rodrigo Maia (DEM), concordam com essa tese.

Para o professor de marketing político da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM-RJ) Eugênio Giglio, as imagens que associam Eduardo Paes aos Jogos Olímpicos, a exemplo do momento em que o atual prefeito recebeu a bandeira durante a solenidade de encerramento de Londres 2012, geram "um efeito inegavelmente positivo".

O especialista afirma que tal "gancho eleitoral" seria o "maior bônus" em face da escolha do Rio como sede da Olimpíada 2016, argumentando assim que Paes não poderia ser culpabilizado por adotar essa estratégia. "Nessas condições, qualquer candidato faria o mesmo", disse.

Do ponto de vista do marketing político, Giglio diz que a propaganda de TV pode criar no inconsciente da população uma ideia de "dívida", isto é, a sensação de que a vitória da capital fluminense na eleição do Comitê Olímpico Internacional (COI), superando metrópoles como Chicago e Madrid, está obrigatoriamente vinculada aos feitos da atual gestão.

"Ele pode até chamar para si o crédito pela escolha da cidade, passando a ideia de que o Rio só foi escolhido por causa dele. Ou seja, ele se apodera da Olimpíada para fortalecer a propaganda. O episódio da bandeira, por exemplo, gera essa ideia. E aquela imagem não tem mais como tirar. Indiscutivelmente, é uma imagem muito forte, que pode trazer mais intenções de voto e, consequentemente, decidir a eleição", completou.

O cientista político e diretor-executivo do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro), Geraldo Tadeu Monteiro, afirma que o atual prefeito "vai capitalizar o clima pré-Olimpíada no Rio" e a permanência dele na chefia do Executivo carioca "como se fossem sinônimos". Porém, o especialista não acredita que tal estratégia será capaz de decidir o pleito para a Prefeitura do Rio.

"Por mais que as eleições tenham sempre um caráter muito mais nacional do que local, os problemas locais acabam pesando muito. Temas como a saúde, trânsito, transporte e educação, por exemplo, não serão esquecidos em função da euforia olímpica. A Olimpíada impulsiona, claro. Mas não acredito que, isoladamente, esse ator possa decidir a campanha eleitoral em favor do Paes", disse.

Monteiro afirma que o espaço dado aos Jogos Olímpicos 2016 na corrida eleitoral também pode ser aproveitado pelos adversários de Eduardo Paes. Segundo ele, "ninguém vai ficar contra o projeto olímpico", mas há questões inerentes ao tema que não favorecem o atual prefeito, tais como a demora na aprovação do orçamento do evento, a origem dos investimentos, entre outros.

"O que eles podem discutir é a capacidade do Eduardo Paes em conduzir esse projeto, questionando, por exemplo, a origem do dinheiro que será investido, eventuais interesses de empresas, valores que estejam superdimensionados etc. O Paes está fazendo o dele ao criar a ideia de que com ele o projeto olímpico dará certo. Cabe aos adversários desconstruir isso", finalizou.

Na mira do TRE

Candidato à reeleição, Eduardo Paes já recebeu do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) pelo menos duas multas de R$ 5.000 por propagandas e/ou atividades de campanha eleitoral consideradas irregulares --o prefeito chegou a recorrer ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que manteve as punições. Em relação ao episódio da bandeira olímpica, o peemedebista será novamente avaliado.

Na segunda-feira (13), o candidato do PSDB à Prefeitura do Rio, Otávio Leite, encaminhou um ofício ao TRE através do qual questiona a legalidade da participação de Paes no encerramento da Olimpíada de Londres e argumenta sobre um suposto "abuso de poder político e uso da máquina pública". Os tucanos também reclamam da apresentação da bandeira olímpica no aeroporto do Galeão, no Rio.

Na ocasião, Paes desembarcou na capital fluminense junto com atletas que representaram o país em Londres e ao lado do presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, Carlos Arthur Nuzman. Na saída da aeronave, o candidato do PMDB exibiu a bandeira olímpica, fato que foi registrado por jornalistas nacionais e estrangeiros.

Em entrevista coletiva concedida no aeroporto, o prefeito anunciou que o orçamento dos Jogos Olímpicos será fechado no segundo semestre de 2013, e apresentou a canção oficial do evento -- intitulada "Os grandes deuses do Olimpo visitam o Rio de Janeiro". Ao fim da divulgação, Paes quebrou o protocolo oficial ao levar a bandeira, em seu carro, para a Gávea Pequena, residência oficial do prefeito. O procedimento deveria ter sido feito por guardas de honra, segundo as regras do COI.

"Ela é o símbolo das Olimpíadas, que é um período de quatro anos, especial na vida de qualquer cidade. O Rio passou uma parte importante de sua história olhando para trás. O processo de transformação do Rio, que olha para frente, se consolida com as Olimpíadas", afirmou Paes ao ser questionado sobre a importância do evento.

Desde a pré-campanha, a procuradoria eleitoral do Ministério Público Federal no Rio (PRE-RJ) já enviou diversas representações acerca das atividades de Eduardo Paes, o que inclui a associação de seu perfil no Twitter com a página oficial da prefeitura, a recepção ao jogador de futebol holandês Clarence Seedorf, recém-contratado pelo Botafogo, no Palácio da Cidade, a participação ao lado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na inauguração do Ligeirão (BRT Transoeste), entre outros.

Adversários comentam

O concorrente do PSOL à prefeitura do Rio, Marcelo Freixo, afirmou ao UOL que o caráter dúbio da legislação eleitoral, que não prevê a separação entre a condição de gestor e a de candidato, acaba dando origem a questionamentos sobre eventuais atividades de campanha de Eduardo Paes.

"Eu não vou judicializar o debate político. Nós queremos fazer política na política. É claro que há problemas democráticos, seja nessa ou em qualquer outra eleição, em função da nossa legislação eleitoral. É claro que seria melhor para a democracia se o prefeito fosse obrigado a se licenciar do cargo, mas não é o que acontece", disse.

"É inevitável o uso da máquina pública, aqui e em qualquer lugar. Claro que quando o Eduardo Paes está fazendo campanha quando carrega a bandeira, querendo ou não. Se a legislação obrigasse o candidato a se licenciar, seja prefeito, governador ou presidente, resolveríamos uma parte desse problema. O ideal seria uma mudança legislativa", completou.

Para o candidato do PSOL, os Jogos Olímpicos 2016 também servem para colocar em pauta questões referentes à estrutura da cidade, que, na visão dele, "caminha sem planejamento".

"A atual gestão não pensa na cidade, e sim no evento enquanto evento. Não pensa no legado que será deixado, no que a cidade pode ganhar. Em Londres, por exemplo, a Vila Olímpica será ocupada em sua metade por moradias populares. No Rio, temos o exemplo da Vila do Pan, que está afundando com apenas 30% do imóveis ocupados", argumentou Freixo.

Já o candidato do DEM, Rodrigo Maia, afirmou ao UOL não acreditar que o uso político dos Jogos Olímpicos será decisivo para a eleição, pois "a parte majoritária da população carioca se sente totalmente excluída do projeto olímpico". Para o filho do ex-prefeito César Maia, "nem os atletas gostam da forma como o projeto está sendo conduzido".

Maia diz reconhecer que o espaço dado à Olimpíada 2016 já estava "previsto no script". De acordo com o candidato do DEM, Paes tentará criar a ideia de que "o evento só poderia acontecer com ele [atual prefeito" em razão de sua parceria com os governos estadual e federal.

"Mas o Pan-Americano de 2007 é uma demonstração de que os grandes eventos na cidade ou no Estado podem ser feitos com independência e responsabilidade. Apesar de o César Maia [que ocupava o cargo na ocasião] fazer oposição a Lula e a Cabral, o Pan foi realizado com total êxito e harmonia administrativa. Dependendo da forma ele [Paes] conduzir o projeto, podem surgir notícias negativas para ele", disse.

"A pergunta que o carioca faz hoje é para quem a cidade está bombando. Para mim, não está. Como ele era o prefeito quando a cidade foi escolhida sede da Olimpíada e faz parte desse grande evento que todos estão a favor, é natural que ele tente associar as coisas. Mas se alguém quiser transformar a Olimpíada em uma agenda eleitoral sem explicar ao carioca como a vida dele vai melhor, vai quebrar a cara", completou Maia.

A reportagem do UOL tentou entrar em contato com o coordenador da campanha de Eduardo Paes, o também peemedebista Pedro Paulo Carvalho Teixeira, para comentar o uso dos Jogos Olímpicos e as acusações feitas pelos adversários do atual prefeito e candidato à reeleição. No entanto, não houve retorno de sua assessoria.

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