Candidatos driblam a lei para fazer campanha antes da hora em Curitiba

Rafael Moro Martins

Do UOL, em Curitiba

O comerciante Gerson Ferreira, pré-candidato a vereador pelo nanico PTN, jura que a coisa nada tem a ver com as eleições. “Uma amiga mandou a sugestão via Facebook. Gostei, e, como tenho pneu usado aos montes, montei o jardim”, diz, se referindo a um espaço de cerca de quatro metros quadrados na calçada de seu comércio de equipamentos para automóveis no Bom Retiro, bairro da região central de Curitiba.

No muro do pequeno jardim, em uma movimentada avenida do bairro, a placa informa: “Jardim idealizado por Gerson Ferreira. Renove com novas ideias e novos conceitos”. Como ele, vários pré-candidatos a prefeito e a vereador driblam a legislação --que veta qualquer tipo de propaganda antes de 6 de julho-- para começar a mostrar a cara aos eleitores.

“O candidato é um ser político que já está atuando em diferentes áreas sociais, como a internet, as redes sociais, a militância política. Ele já está se mexendo, como peças num tabuleiro de xadrez”, compara Ricardo Costa Oliveira, professor-associado de Sociologia Política da UFPR (Universidade Federal do Paraná).

Ferreira procura desvincular seu jardim da candidatura a uma cadeira na Câmara. “Ele faz parte da minha campanha por uma solução para as cheias do Rio Pilarzinho, que começou há um ano e meio. A pré-candidatura tem um mês”, argumenta o comerciante, que diz já ter sofrido prejuízos de mais de R$ 50 mil por conta das cheias sazonais do rio.

Outros pré-candidatos usam estratégias diferentes para tornar seus nomes familiares aos curitibanos. É comum ver, colados em automóveis que circulam pela cidade, adesivos em que a pessoa se intitula “amigo” de determinada pessoa --via de regra pré-candidata.

Um desses curitibanos de amigos generosos é o locutor de rádio Enemar Passos. “[Os adesivos] Quem mandou fazer foram amigos. É para divulgar meu nome, que é difícil, nunca acertam. Me acham de Ademar, Edemar”, afirma.

Passos não nega, porém, que busca uma candidatura à Câmara --sua primeira incursão na política, pelo PSC do prefeiturável Ratinho Jr., filho do apresentador do SBT.

“Mas ainda não está certo. A convenção é só dia 30. Até lá, não sou candidato. Enquanto isso, sigo no ar”, despista.

No Novo Mundo, região sul, motoristas que passam por uma das principais ruas do bairro veem, num muro, uma pintura que deseja “parabéns pelo dia dos namorados”. O autor, Ivo Roberto, é presidente de uma associação de moradores da região, e já concorreu, sem sucesso, a uma vaga na Câmara em 2008. Ele não foi localizado pela reportagem para comentar o caso.

Internet grátis e boca-de-urna

Um muro num dos mais movimentados cruzamentos da avenida das Torres, principal acesso ao aeorporto Afonso Pena, avisa quem passa pelo local que o bairro do Uberaba, um dos maiores de Curitiba, já tem "internet gratuíta".

O autor do projeto, e da pintura, ambos com cerca de um ano de idade, é o funcionário público Francisco Costa, conhecido na região como Chico do Uberaba. “[O bairro] É o único local do Brasil com internet sem fio sem participação do poder público”, garante ele, que é presidente de uma associação de empresários da região.

Segundo Costa, o projeto é financiado por associações empresariais e por um provedor de internet. Costa candidatou-se a vereador, sem sucesso, em 2008, pelo PSDB --à época, segundo o jornal “Gazeta do Povo”, foi preso por fazer propaganda boca-de-urna no dia da eleição.

Hoje presidente municipal do PMN, Costa planeja novamente concorrer a uma cadeira na Câmara. Questionado pelo UOL se a propaganda da internet grátis pode vitaminar sua candidatura, ele se defende. “Nem parei para pensar se ajuda. Se alguém me falar que não pode [manter a pintura], eu apago.”

Em seguida, disse que não autorizava a publicação da reportagem. “Não autorizo a publicação da matéria sem que possa vê-la antes. Se colocar, é por conta e risco de sua parte”, afirmou ao repórter.

O que diz a lei

O TRE-PR (Tribunal Regional Eleitoral) do Paraná informa que qualquer propaganda eleitoral antes de 6 de julho é “irregular e antecipada”, segundo a legislação. Ainda assim, a lei não define o que caracteriza propaganda eleitoral.

Além disso, o tribunal só pode agir “se provocado por uma reclamação formal, seja do Ministério Público Eleitoral, acionado por um cidadão, seja de um partido que formalize uma queixa”, informa a assessoria de comunicação.

“De certa forma, a legislação busca tapar o sol com a peneira”, avalia o professor Oliveira. Essas brechas acabam aproveitadas inclusive por candidatos a prefeito, via de regra vigiados mais de perto pelo Ministério Público --e pelos adversários.

Desde o fim do ano passado, circulam pela cidade automóveis com o adesivo “Juntos em 2012”. Grafado na mesma tipografia usada nas campanhas eleitorais do governador Beto Richa (PSDB), faz menção ao desejado apoio do tucano ao prefeito Luciano Ducci (PSB), terceiro colocado na pesquisa divulgada pelo Ibope em 2012.

“É assim em todas as campanhas. Amigos, grupos, se manifestam dessa forma. Eu mesmo uso em meu carro. Mas teria que se perguntar a quem fez [os adesivos] pra saber de onde surgiram”, afirma o presidente municipal do PSB, Ubirajara Schreiber, que trabalha no gabinete de Ducci.

Partidários de Gustavo Fruet (PDT) circulam pela cidade com adesivos que dizem “conte comigo” ao candidato --um bordão historicamente usado por eleitores do peemedebista Roberto Requião, desafeto do pedetista.

A atuação intensa na internet rendeu a Fruet a primeira multa da temporada eleitoral --foi condenado a pagar R$ 15 mil por usar o serviço de links patrocinados do Facebook para sua fanpage na rede social. A denúncia que resultou na multa foi movida pelo PRP, partido aliado ao PSB de Ducci.

Por meio da assessoria de imprensa, Fruet informou que recorreu da multa, e que não tem como controlar “manifestações de simpatizantes”. Outro pedido de condenação ao pedetista, por uma página no Facebook intitulada “Eu voto em Gustavo Fruet”, foi negado pela Justiça com base nesse argumento.

Do outro lado, Luciano Ducci é provavelmente o primeiro pré-candidato a manter um perfil na rede social Instagram, e Ratinho Jr. (PSC), filho do apresentador do SBT, mantém um site e perfis movimentados nas redes sociais de praxe – Twitter e Facebook.

“Nada contra. Sou favorável a uma liberdade ampla na internet. Não há como censurá-la. Ela é um espaço de ideias”, pondera Oliveira.

“O problema mais grave é o uso da máquina pública, por candidatos a reeleição, da mídia, por comunicadores, e o abuso do poder econômico, particularmente notável nos candidatos que saem das igrejas neopentecostais. É nisso que a Justiça Eleitoral tem de ficar de olho.”

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