27/10/2010 - 15h36

Relator no Supremo vota por aplicação imediata da Lei da Ficha Limpa

Rosanne D'Agostino
Do UOL Eleições

O ministro Joaquim Barbosa, relator do recurso do candidato ao Senado Jader Barbalho (PMDB-PA) contra a Lei da Ficha Limpa, apresentou voto nesta quarta-feira (27) para aplicar a norma nas eleições 2010. Quase um mês depois do primeiro turno das eleições, o STF (Supremo Tribunal Federal) volta a julgar o tema. A sessão teve início às 14h40. Até agora, seis ministros mantiveram os votos.

O recurso de Barbalho, que teve o registro de candidatura barrado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), é semelhante ao de Joaquim Roriz (PSC-DF), que terminou em impasse entre os ministros. O Supremo já reconheceu a repercussão geral, e o entendimento no caso deverá ser seguido pelos tribunais inferiores em processos idênticos.

O relator do caso, ministro Joaquim Barbosa, afirmou que o tema já foi “exaustivamente discutido” no recurso de Joaquim Roriz, por isso, apresentou “voto sucinto”. Ele afirmou que a Lei da Ficha Limpa não se qualifica como lei de processo eleitoral, portanto, não é necessário esperar um ano para aplicá-la. Assim, manteve o voto que proferiu no caso Roriz.

A comparação à liberação de Valdemar Costa Neto, decidida na noite desta terça (26) pelo TSE, provocou a primeira discussão ao plenário. Envolvido em denúncias de participação no esquema do mensalão, ele renunciou ao cargo de deputado federal para evitar ser cassado.

Durante o voto de Marco Aurélio de Mello, Gilmar Mendes chamou a decisão do TSE de “casuísmo jurisprudencial”. O presidente do TSE, Ricardo Lewandowski, e a ministra Cármen Lúcia, relatora, defenderam a decisão. “Repilo qualquer insinuação de que o TSE esteja fazendo casuísmo jurisprudencial”, disse Lewandowski.

“Dificilmente vai se encontrar um caso de mais escancarada, de mais escarrada, desculpem a expressão, de retroatividade”, disse Gilmar Mendes, para quem há a possibilidade de “manipulação das eleições, porque vai se escolher candidato”. “Devemos ficar advertidos desses excessos de moralismos. Em geral, descambam em abusos quando o são notória e notoriamente falsos.” O ministro, em seu voto, classificou a aplicação imediata da norma de “convite para um salão de horrores”.

Até o momento, seis ministros proferiram votos. Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Ayres Britto voltaram a se manifestar pela aplicação imediata da lei. São contra Marco Aurélio e Dias Toffoli. Os demais ministros ainda devem apresentar seus votos e, até o resultado final ser proclamado, podem mudar de opinião.

Defesa x acusação
Antes, em sua sustentação oral no plenário, José Eduardo Alckmin, advogado de Jader Barbalho, afirmou que o caso não é igual ao de Roriz. Segundo ele, Barbalho renunciou ao mandato para não se autoincriminar, e não para fugir de uma cassação. “Esse caso é um caso emblemático porque se trata de alguém que já participou de dois pleitos depois dessa renúncia sendo eleito com votação expressiva”, defendeu. 

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O advogado citou ainda o caso de Valdemar da Costa Neto, que teve o registro deferido pelo TSE após ter renunciado ao saber que estava sendo investigado por uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). “Parece que aí o sistema claudica, está sendo de uma certa forma, não se está atingindo o objetivo que se queria com essa lei”, afirmou. Ele sustentou ainda que, nesse aspecto, a lei revela uma aparência casuística, porque o fato já havia ocorrido há nove anos.

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, voltou a se manifestar contra o recurso de Barbalho, afirmando que o candidato estava na iminência de responder a processo por quebra de decoro, por isso, renunciou. “A gravidade das denúncias oferecidas no Senado era tamanha que, dificilmente, Jader não seria cassado”, disse.

Insegurança jurídica
O STF começou a julgar a aplicação da norma em setembro, mas um impasse adiou a decisão até que outra contestação chegasse à Corte. Diante da indefinição e de decisões conflitantes da Justiça Eleitoral, candidatos mantiveram-se na disputa e, sub judice, receberam votos -que permanecem zerados enquanto não há decisão final sobre seus registros. 

Jader Barbalho, segundo candidato ao Senado mais votado no Pará, foi barrado pela Lei da Ficha Limpa porque renunciou ao mandato de senador em 2001, para escapar de possível cassação por quebra de decoro.

A diferença com relação a Roriz é que Barbalho já obteve o deferimento de seu registro de candidatura por duas vezes após ter renunciado. E foi eleito, em 2002 e 2006. Assim, sua defesa acredita ter razões comprovadas de que a retroatividade da lei irá prejudicar o candidato.

Caso o Supremo decida que a lei não vale para estas eleições, ele e outros candidatos na mesma situação estão eleitos. Os votos serão contabilizados às legendas, e o quadro de vencedores, alterado. 

Pela Lei da Ficha Limpa, o político que renunciar para não ser cassado fica inelegível por oito anos após o fim do mandato que cumpriria. Antes, eram três anos. A legislação também barra candidatos com condenação por decisão colegiada (por mais de um desembargador). 

Demora
A Corte está dividida. Todos os ministros foram unânimes em considerar a lei constitucional, mas cinco votaram para aplicar a norma nestas eleições, enquanto outros cinco entenderam que a aplicação imediata fere direitos dos candidatos, pois não entrou em vigor um ano antes da eleição como exige a Constituição. 

Procurador-geral dá parecer contrário a recurso de Jader

"A renúncia ao cargo de senador da República com a finalidade de escapar de processo por quebra de decoro parlamentar e de preservar a capacidade eleitoral passiva consiste em burla rejeitada por toda a sociedade", diz Roberto Gurgel

Com a aposentadoria do ministro Eros Grau, para cuja vaga o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda não nomeou substituto, coube aos ministros decidirem se haveria desempate. Uma das possibilidades seria o voto de desempate do presidente, que votaria duas vezes. Sem consenso, o julgamento foi adiado. 

Roriz contestou o mesmo ponto da legislação, mas o recurso perdeu o objeto depois que o candidato desistiu de concorrer ao governo do Distrito Federal para indicar a mulher, Weslian Roriz, em seu lugar na chapa.

O desgaste sofrido com o adiamento, no entanto, deve fazer com que ministros, desta vez, encontrem outra solução, ou ainda, mudem seus votos. Além disso, pode ser determinante o fato de o primeiro turno ter ocorrido sem uma definição sobre a lei, permitindo que candidatos, teoricamente barrados, continuassem na disputa normalmente.

“Possibilidade teórica sempre tem [de continuar empatado]. Eu não saberia fazer uma avaliação hoje. Se ninguém mudar de posição fica tudo como estava, mas pode ser até que o tribunal encontre uma solução não alvitrada até agora”, disse Cezar Peluso, presidente do STF, na semana passada. Ele admitiu que os ministros podem se reunir antes da sessão para discutir o tema.

O impasse no Pará
O terceiro mais votado no Pará, Paulo Rocha (PT), também foi barrado com base na Ficha Limpa. Ele e Jader Barbalho somaram mais de 50% dos votos no Estado, o que, na opinião de alguns especialistas, anularia a eleição

Marinor Brito (PSOL), senadora eleita em segundo lugar com 32% dos votos válidos, está em Brasília, informou sua assessoria de imprensa, para acompanhar o julgamento no Supremo. “A pressão política está muito forte, mas tenho a sensação que a decisão do TSE deve prevalecer pela impugnação dos candidatos ficha suja”, afirma.

Para Brito, caso o Supremo mantenha os ex-adversários barrados, deve prevalecer entendimento do Ministério Público Federal do Pará. “Os procuradores da República que atuam no Estado analisaram a legislação vigente e concluíram que a realização de novas eleições por causa da anulação de mais de 50% dos votos válidos só se aplica à disputa em que a eleição se dá por maioria absoluta”, avalia. “Esse tipo de eleição se configura apenas para disputa por cargos de governador e presidente.”

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