14/08/2010 - 07h00

Ficha Limpa: divergência de interpretações entre TREs e TSE dará palavra final ao STF

Andréia Martins
Do UOL Eleições
Em São Paulo
  • Supremo Tribunal Federal: ministros do STF podem definir validade da Lei da Ficha Limpa

    Supremo Tribunal Federal: ministros do STF podem definir validade da Lei da Ficha Limpa

A aprovação da Lei da Ficha Limpa levou muitos eleitores a pensar que personagens de grandes escândalos políticos ficariam de fora das eleições de outubro, principalmente depois que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) decidiu que a lei seria aplicada a políticos com condenações anteriores a ela.

Mas de acordo com especialistas ouvidos pelo UOL, a votação dos casos com base na nova lei pode levar a um resultado não esperado, o da liberação da maioria dos políticos fichas-suja para disputar as eleições devido às diferentes interpretações da lei entre os tribunais.

Segundo a Lei da Ficha Limpa, candidatos que forem condenados por colegiado, processados por falta de decoro parlamentar, independente de sanção, ou que tenham renunciado para evitar processo de cassação podem ser incluídos na lei, que também propõe aumentar o tempo de inelegibilidade de três para oito anos, mesmo em condenações anteriores a lei.

Há divergências dentro do próprio TSE. Nesta quinta-feira (12), o julgamento do primeiro recurso feito ao órgão sobre um pedido de registro eleitoral negado com base na Lei da Ficha Limpa gerou diferentes interpretações. O relator, ministro Marcelo Ribeiro, surpreendeu os demais ao votar contra a vigência da lei para as eleições deste ano e o julgamento foi suspenso.

O recurso foi apresentado ao TSE pela defesa do candidato a deputado estadual pelo Ceará, Francisco das Chagas Rodrigues Alves. Francisco teve seu registro negado pelo TRE-CE (Tribunal Regional Eleitoral do Ceará) porque foi condenado por compra de votos nas eleições de 2008. Ribeiro já sinalizou que dará voto favorável à candidatura do político.

Impugnados com base na Lei Ficha Limpa nos TREs

Nome Partido Estado
Jader Barbalho PMDB PA
Fernando Collor PTB AL
Jackson Lago PDT MA
Neudo Campos PP RR
Marcelo Miranda PMDB TO
Sarney Filho PV MA

TREs x TSE

Os TREs de alguns Estados (como Maranhão, em Roraima, no Rio Grande do Sul, Pará, Piauí, Minas Gerais, Tocantins, Acre, Rio de Janeiro e Sergipe) também não seguiram a decisão inicial do TSE de aplicar a nova lei para casos retroativos, ou seja, julgados antes dela. Foi assim na hora de analisar os critérios de inelegibilidade de candidatos como Jader Barbalho (PMDB-PA), Fernando Collor (PTB-AL), Jackson Lago (PDT-MA), Neudo Campos (PP-RR), Marcelo Miranda (PMDB-TO), Sarney Filho (PV-MA), entre outros. Todos tiveram suas candidaturas deferidas pelos tribunais

Para Gaudêncio Torquato, professor da USP (Universidade de São Paulo) e analista político, “há uma clara visão desarmônica entre os Estados quanto à interpretação da Ficha Limpa”. O motivo, segundo ele, "é a forte pressão política nos TREs de alguns Estados, onde há uma interferência clara na Justiça Eleitoral".

“Nunca vi uma eleição tão interrogativa como essa. A gente nunca passou tanto tempo se questionando sobre regras em tempo de campanha, como nessa eleição”, disse ele.

O procurador regional eleitoral de Tocantins, João Gabriel Moraes de Queiroz, chegou a declarar que no Estado, "a Ficha Limpa está sendo aplicada apenas quando convém, em casos de políticos menores".

Lá, uma das candidaturas mais contestadas, a do ex-governador Marcelo Miranda, que será candidato ao Senado, foi aprovada pelo TRE-TO. Ele teve o mandato de governador cassado em 2009, pelo TSE, e pela condenação estaria inelegível até setembro de 2012.

Especialistas apontam pontos divergentes da lei

Caso o TSE negue a candidatura a um dos políticos citados acima ou confirme a inelegibilidade de nomes como Joaquim Roriz (PSC-DF), Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), Ivo Cassol (PP-RO), Ronaldo Lessa (PDT-AL), entre outros já barrados pelos tribunais regionais, os recursos serão encaminhados ao STF (Supremo Tribunal Federal).

 Candidatura barrada

  • Joaquim Roriz (PSC), candidato ao governo do DF, foi barrado pelo TRE e vai recorrer no TSE e no STF

No Supremo, a interpretação da lei também divide opiniões. Na última terça-feira (10), durante o lançamento da campanha Eleições Limpas, em Brasília, Lewandowksi disse não esperar por mudanças profundas da parte do STF, em relação à decisão do TSE de aplicar a lei imediatamente. “Um ou outro ponto poderá ser discutido, questionado e até derrubado no Supremo Tribunal Federal, mas eu espero que não”, diz.

Na opinião do advogado e especialista em direito eleitoral, Alberto Rollo, a lei “é inconstitucional” e um ponto que deve gerar polêmica e divisão no Supremo é a presunção de inocência, segundo o qual o acusado não pode ser considerado culpado antes do fim do processo. “O que se discute não é o que a lei vai trazer de bom. Não há dúvida quanto a isso. Mas sem considerar a presunção de inocência, vamos entrar nas trevas do direito”, diz Rollo.

Quanto a casos já julgados, o especialista se diz contrário ao artigo da nova lei que permite ampliar a inelegibilidade de candidatos já condenados e que já cumpriram a pena para oito anos.

Já o jurista Dalmo de Abreu Dallari tem outra intepretação da lei. Segundo ele, a lei “é totalmente legal, pois a própria Constituição estabelece que, a qualquer momento, uma lei complementar pode acrescentar novas condições de elegibilidade ao processo eleitoral”.

De acordo com Dallari, o que a Lei da Ficha Limpa estabelece é uma “condição de elegibilidade” e não “uma pena”. Por esse motivo não deve ser questionada em pontos como retroatividade, presunção da inocência e outros.

“Ela apenas estabelece uma condição, indica se o candidato está apto ou não a participar dess processo, ao contrário de uma pena que suspende os direitos políticos”, diz.

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