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31/10/2008 - 07h00

Crise deve virar desculpa de prefeito que não cumprir promessas

Rosanne D'Agostino
Em São Paulo

"Colocar o pé na rua, fiscalizar as obras, agir com pulso firme com vontade de trabalhar." Promessas como estas, presentes no programa de governo do prefeito reeleito da capital paulista, Gilberto Kassab (DEM), não custam aos cofres públicos. Para construir hospitais, linhas de metrô e creches, por outro lado, é preciso haver orçamento, que pode vir a ser reduzido nos municípios caso a crise econômica global chegue ao país.


Para Gil Castelo Branco, economista da ONG Contas Abertas, a ameaça de um período de recessão na economia mundial e no Brasil pode virar desculpa de prefeitos eleitos caso, no futuro, não tenham cumprido com as promessas feitas no calor de suas campanhas. E ainda, beneficiar quem foi eleito com promessas que não teria condições de cumprir mesmo em um quadro de crescimento econômico.

Crise econômica pode autorizar
mea-culpa de prefeitos eleitos,
avalia especialista; ouça:


    Pelo país, a maioria dos candidatos em 2008 priorizou promessas na área dos transportes e saúde, com a ampliação de linhas do metrô e construção de hospitais.


    Em São Paulo, Gilberto Kassab teve como principais bandeiras de campanha a construção de três hospitais e o investimento de R$ 1 bilhão na expansão do metrô. Além disso, isentar autônomos de ISS (Imposto sobre Serviço).


    Márcio Lacerda (PSB), em Belo Horizonte, pretende construir 14,6 quilômetros de metrô em quatro anos. Em Fortaleza, a prefeita reeleita Luizianne Lins (PT) promete concluir o Hospital da Mulher, obra orçada em cerca de R$ 57 milhões, além de construir 15 mil casas populares.

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      Amazonino Mendes (PTB) foi eleito em Manaus com a promessa de que construirá 1.000 creches municipais, além de criar o Bolsa Família Municipal, com R$ 60 mensais às 115 mil famílias cadastradas pelo governo federal no Programa Bolsa Família. Disse ainda que irá reduzir a alíquota do IPTU de toda a população da cidade ainda em 2009.


      As obras, no entanto, correm risco de não sair do papel por falta de recursos. "Diante de uma crise, o gasto da administração pública é muito engessado", diz Castelo Branco. "O gasto da União, já há muitos anos, ficou concentrado em despesas obrigatórias, que são quase impossíveis de se cortar. Teria que se demitir pessoal. É mais fácil o governo diminuir o investimento, as obras, a construção de postos de saúde, metrôs, escolas, obras em estradas. Então, essas promessas dos candidatos ligadas à expansão de metrô, enfim, a tudo o que for em termos de obra, construção de hospitais, construção de escola, tudo isso passa a correr, no mínimo, um grande risco", avalia.


      Segundo o especialista, "a crise vai ser distribuída, ninguém vai estar imune a ela". "Não existe uma vacina anticrise. Estados e municípios vão sofrer se a proporção for essa que todos imaginam. Quanto maior é a economia do Estado, maior é o impacto. E é muito provável que o governo diminua o nível de investimento a partir de agora. Um exemplo disso é o PAC [Programa de Aceleração do Crescimento] que, em outubro, teve uma redução significativa nas aplicações", afirma.


      "Essas obras, principalmente as obras novas, a perspectiva de que elas aconteçam é pequena, porque o governo vai priorizar aquelas que já estão em andamento. O que for de obra nova corre, naturalmente, um risco muito maior. E o governo estadual, que também depende em parte da arrecadação do Estado, ele vive esse mesmo drama", diz o economista.

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      Na capital paulista, Kassab admitiu que pode haver cortes no orçamento, mas não em áreas prioritárias como saúde, educação e transporte. A proposta orçamentária na capital paulista prevê R$ 1,4 bilhão para transportes e R$ 4,5 bilhões para saúde, de um total de R$ 29,39 bilhões de investimentos -valor 17% maior do que em 2008. Desse montante, R$ 11,6 bilhões viriam da arrecadação de impostos, como IPTU e ISS, e R$ 11,5 bilhões da transferência corrente, repasse federal e estadual de IPVA e ICMS. A Comissão de Finanças e Orçamento da Câmara de São Paulo já analisa a proposta.


      Ainda conforme Castelo Branco, é provável que, em todos os municípios, haja cortes. "As conseqüências imediatas vêm logo agora. Está no Congresso o Orçamento Geral da União, que vai ter que ser modificado completamente. A inflação, o crescimento da economia, do PIB, que vai diminuir, isso vai obrigar a reformulação do orçamento. O governo não tem como cortar nas despesas obrigatórias, que são pessoal, previdência, juros, então acaba cortando nos investimentos, que são obras, compra de equipamentos, e isso afeta os Estados e municípios. Muitas das promessas que os prefeitos fizeram não vão poder realizadas. E aí, certamente, os prefeitos devem alegar que a crise afetou, mas é muito provável algumas dessas promessas fiquem completamente inviáveis", completa.

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      No caso de São Paulo, o especialista diz ainda que a crise prejudicaria proposta que causou polêmica da candidata Marta Suplicy (PT) durante a corrida eleitoral, de ampliar linhas do metrô com investimentos na ordem de R$ 490 milhões por ano da prefeitura e outros R$ 490 milhões do governo federal.


      "A proposta não está no Orçamento e, dificilmente, entraria no de 2009. Agora mesmo [com a crise] é que vai ser muito mais difícil que seja incluída. A Marta disse que tinha um compromisso com o governo federal de que isso seria liberado, mas, mesmo que ela tivesse sido eleita, o governo federal teria a maior dificuldade, e a perspectiva que se tem da reforma do orçamento é de que a despesa tenha até que diminuir", conclui.


      Cartilha anticrise


      O economista também enumera o que acredita ser o "dever de casa" dos prefeitos eleitos em 2008 em suas futuras administrações, a fim de diminuir o impacto da recessão.


      "A receita é austeridade, melhorar a qualidade do gasto. Eles precisam fazer um esforço para evitar o aumento as despesas correntes, pessoal e previdência. Segurar ao máximo o que chamamos de manutenção da máquina pública, a luz, a água, o cafezinho, a energia, passagem aérea, diária. O governo tem que segurar essas despesas para tentar manter o investimento destinado às obras, construções, compra de equipamentos, porque é isso que movimenta a economia", afirma.

      Economista afirma que receita
      anticrise exige austeridade; ouça


        Castelo Branco diz ainda que o orçamento terá de ser reformulado. "Basta se pensar que a previsão de crescimento do PIB que está nesse orçamento é de 4,5%. Então, isso é absolutamente inevitável. Se a economia cresce menos, a arrecadação cresce menos, a despesa tem que diminuir."


        O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, recuou nesta quinta-feira (29) nas projeções de crescimento da economia para 2009, de 4,5% de expansão há duas semanas, para 4%, "ou um pouco menos".


        "Nós vamos viver o outro lado da moeda. O período de recessão da economia mundial. O governo vai ter que apertar o cinto, porque, até agora ,estava fácil. A possibilidade de aumentar impostos não existe, porque a sociedade não vai aceitar. Então, vai ter que se trabalhar em regime de crise e contenção de despesas. A recessão vai chegar, é inevitável. O Brasil não é uma ilha. Vai ser afetado pela crise. Agora, a dimensão é que não se sabe. Ainda vamos ter que avaliar", conclui.

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