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Candidata do PSTU diz haver parceria para Aécio não atacar Lula

Larissa Morais
Da Redação

A professora de biologia Vanessa Portugal concorreu em 2002 ao cargo de vice-governadora pelo PSTU. Em 2004, candidatou-se pelo partido à Prefeitura de Belo Horizonte. Nestas eleições, foi escolhida para encabeçar a Frente de Esquerda - coligação entre PSOL, PSTU e PCB - em Minas Gerais.

Militante de um partido oriundo do PT, Vanessa reconhece que o candidato petista Nilmário Miranda tem feito críticas ao governador Aécio Neves (PSDB), mas diz que as propostas dos dois principais candidatos não se diferenciam. "Aécio e Nilmário são financiados pelas grandes corporações e usam o Estado a serviço delas, em detrimento da população pobre", diz.

Para Vanessa, o choque de inclusão social proposto pelo petista seria uma repetição do que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva faz em nível nacional - e as ações do governo federal seriam, em essência, idênticas ao que Aécio tem feito no Estado.

A candidata afirma ainda que o fraco desempenho de Nilmário nas pesquisas deve-se a um acordo entre PT e PSDB em Minas. Segundo Vanessa, Aécio e o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (PT), trocaram elogios e favores nos últimos quatro anos. "Há uma parceria para a atuação em Minas e para que Lula governe sem a oposição do Aécio", diz.

Entre as propostas de Vanessa estão a suspensão e a auditoria da dívida do Estado para destinar os recursos a um plano de obras públicas, com prioridade para as regiões mais pobres, como o Vale do Jequitinhonha. Outros destaques de sua campanha são a tese de reestatização da Vale do Rio Doce e a rejeição à transposição do rio São Francisco. Apesar de não serem atribuições do governo estadual, Vanessa diz que Minas deve liderar uma campanha por essas reivindicações.




UOL - O TRE tomou decisões que resultaram na perda de sete minutos de sua propaganda. Por que Nilmário e Aécio estão empenhados em retirar o tempo de sua coligação no horário eleitoral?



Vanessa - Somos a única campanha que tem discutido o cerne da política - o fato de as grandes corporações financeiras, os banqueiros e as multinacionais dominarem o cenário político do Estado e do país. Há uma conivência das instituições que favorece os principais candidatos. Nilmário conseguiu uma definição da Justiça porque colocamos muito rapidamente a imagem dele ao lado de Marcos Valério. Mas não fomos nós que criamos isso - Nilmário era o candidato do PT na eleição passada, financiada pelo valerioduto. Ele se sente incomodado, como ele próprio diz, em ser vinculado a um corrupto famoso. Mas eles fizeram a vinculação - nós só reforçamos a denúncia. Aécio ganhou direito de resposta no nosso programa com relação ao rio São Francisco e não respondeu. Nós dissemos que ele tinha acordo com a transposição. Ele diz ser a favor da revitalização, mas isso todo mundo diz - até o Lula. Isso não basta. Nós temos posição contrária à transposição, achamos que ela é absurda sob qualquer aspecto porque destrói o rio, favorece somente os latifundiários e usa recursos imensos da nação. Os candidatos se incomodam toda vez que a gente critica, mesmo tendo apenas um minuto, porque vamos à raiz do problema. Aécio e Nilmário são financiados pelas grandes corporações e usam o Estado a serviço delas, em detrimento da população pobre.



UOL - Existe polarização de fato entre Aécio e Nilmário?



Vanessa - Apesar de Nilmário ter feito algumas críticas à forma como Aécio trata o serviço público, a proposta do PT não se diferencia do PSDB. Na verdade, os dois candidatos são financiados pelos mesmos agentes. Quando se faz a discussão, por exemplo, do imposto sobre a conta de luz em Minas, é preciso discutir que as grandes empresas não pagam imposto, que na verdade a população de média e baixa renda financia a energia gasta por essas empresas. Quando se discute educação, é preciso dizer que o governo Lula e a prefeitura de Belo Horizonte, também do PT, atuam precarizando e privatizando a educação pública, da mesma forma como Aécio faz. Isso o Nilmário não fala. Há uma avalanche de propostas, as mesmas que existem há anos, e nada muda. Não muda porque o Estado continua sendo governado por uma pequena parcela da população.



UOL - O choque de inclusão social proposto por Nilmário não seria possível mantendo os pilares da economia, como o pagamento da dívida e o ajuste fiscal?



Vanessa - Não seria possível porque seria uma repetição do que Lula fez. Nilmário diz que vai fazer no Estado o que Lula faz no país. Mas isso é o que o governador fez. Aécio atacou os serviços públicos, diminuindo recursos - Lula cortou recursos das áreas sociais mais do que FHC. Para inverter essa lógica, para haver um choque social, é necessário reduzir os impostos da população de média e baixa renda. Para isso, é preciso cobrar de quem ganha muito, porque o Estado não pode abrir mão de arrecadar. E tem que arrecadar onde existe dinheiro, ou seja, nas grandes empresas. A Vale do Rio Doce teve lucro de R$ 10 bilhões em 2005, e R$ 6 bilhões só no primeiro semestre deste ano. Se parte desses recursos não vem para o Estado, não há como investir em saúde e educação - vai ficar tudo a conta-gotas, como sempre foi. Outra coisa de que o Nilmário não fala é a questão das privatizações. A Vale e outras grandes empresas de mineração foram todas privatizadas, não pelo Estado, mas pela Federação. Para que o Estado tenha soberania, é preciso que faça uso dos recursos, com a reestatização. Outra questão omitida pelo Nilmário é a relação com o parlamento. Hoje a corrupção e as trocas de favores entre Executivo e Legislativo para aprovar as leis é uma forma de escoamento enorme de recursos do Estado.



UOL - A sra. acha que a identificação das políticas de Lula e de Aécio contribuiu para o fraco desempenho de Nilmário nas pesquisas?



Vanessa - Ao que tudo indica, houve e há um acordo entre PT e PSDB em Minas. O prefeito da capital, do PT, e o governador Aécio Neves trocaram favores e elogios durante estes quatro anos. Os deputados estaduais do PT, nos assuntos fundamentais para a população e para o serviço público, foram coniventes com Aécio. Em troca, os deputados federais do PSDB de Minas apoiaram todas as reformas propostas por Lula. Na verdade, há uma parceria para a atuação em Minas e para que Lula governe sem a oposição do Aécio. Isso faz com que a candidatura do PT não seja de oposição, de fato, porque não existe um histórico de oposição. Não existem projetos distintos. Isso provavelmente faz com que a população prefira continuar com o que já está aí, se é tudo a mesma coisa. Quem se apresenta como alternativa somos nós, que estamos correndo por fora desse jogo, com mais dificuldades porque não temos recursos - mas também não queremos os recursos espúrios desses candidatos - e lutamos contra um regime completamente antidemocrático, como ficou provado com a perda de minutos no horário eleitoral.



UOL - A candidatura de Nilmário não seria de disputa, portanto? Seria apenas um palanque para o Lula?



Vanessa - Acaba sendo uma candidatura meio laranja. Vira um palanque para o Lula, mas também Aécio contribui nisso, porque aparece junto do presidente em compromissos oficiais, como se fossem pessoas diferentes, governador e candidato. E não é, tanto que usa a máquina estatal a serviço da reeleição.



UOL - Aécio tem altos índices de intenção de votos nas pesquisas. Por que o governador tem tanta popularidade?



Vanessa - A popularidade de Aécio passa por dois elementos. Primeiro, porque ele tem uma vantagem muito grande - tem a máquina do Estado e a utiliza para se favorecer. Segundo, há uma blindagem na imprensa de Minas. Não tenho elementos para dizer de onde vem isso, mas o fato é que a imprensa mineira só faz elogios a Aécio. Todos os desmandos e problemas com o serviço público às vezes são noticiados pela imprensa nacional, e aqui não. Os movimentos sociais contra Aécio têm sido boicotados pela imprensa local - em contrapartida, ela divulga todos os números que favorecem o governador. A população na verdade não tem acesso à informação. Há um outro elemento. Conseqüência da decepção com Lula, há um sentimento numa parcela grande da população de que não é possível haver mudanças de fato e que, para continuar tudo como está, é melhor ficar com quem já se conhece. Também há uma campanha grande de marketing com a máquina do Estado. O que Aécio gasta com propaganda não fica a dever com o que ele gasta com áreas sociais.



UOL - O choque de gestão e o déficit zero foram os principais feitos do governo divulgados por essas campanhas de marketing. Qual é sua opinião sobre essas políticas?



Vanessa - O déficit zero é uma farsa, não existe. Na verdade é uma maquiagem de números. Minas pagou R$ 2 bilhões somente em juros da dívida em 2005, um valor superior ao gasto com saúde. A dívida continua crescendo enormemente. O Estado tem hoje uma dívida em torno de R$ 45 bilhões. O choque de gestão também é uma farsa, porque Aécio congelou os salários e reduziu os investimentos nas áreas sociais em 20%, relativo à receita. Ou seja, é um choque de gestão que desestrutura o atendimento à população. E aumentou estrondosamente os impostos para a população de média e baixa renda, o que fez aumentar a arrecadação do Estado e compensou todas as isenções e renúncias fiscais para grandes empresas. Além disso, Aécio não pagou nada da dívida com os servidores, os precatórios - ela segue existindo integralmente e só cresce.



UOL - A sra. disse que não é possível aumentar os investimentos sociais sem mexer na questão da dívida. Qual é sua proposta para isso?



Vanessa - Discutimos três ações. Primeiro, suspensão do pagamento da dívida, realização de auditoria e uso desses recursos num plano de obras públicas. Outro elemento é a cobrança de impostos das grandes empresas, principalmente daquelas que exploram os recursos naturais do Estado. Terceiro, atacar o pacto de corrupção que existe entre o Executivo e o Legislativo, também uma grande fonte de escoamento de recursos. A partir disso é preciso que o Estado priorize de fato as questões sociais, geração de emprego, segurança etc. Se não for assim, a população vai ter continuar se contentando com migalhas, com obras que aparecem de vez em quando, na época das eleições, apenas para dar a sensação à população de que algo está sendo feito.



UOL - A sra. tem falado muito na campanha da proposta de reestatizar a Vale do Rio Doce. Como isso seria feito na prática?



Vanessa - É importante dizer que reestatizar a Vale não é tarefa do governo estadual, porque a empresa é federal. O que temos dito é que Minas deve liderar uma grande campanha pela reestatização. Com Heloísa Helena (PSOL) presidente, isso se concretizaria de maneira mais fácil, uma vez que também faz parte do nosso programa nacional. Minas deve ter uma posição porque 60% do lucro da Vale vem do Estado. O minério é um recurso estratégico, da população. Ele não pode ser privatizado porque não se pode privatizar o solo, o Estado não pode abrir mão desse recurso estratégico, sob o risco de abrir mão de sua soberania. Outro elemento é que a venda da Vale foi fraudulenta. A Companhia Siderúrgica Nacional comprou 41,73% das ações por pouco mais de R$ 3 bilhões. O valor de mercado da empresa hoje é estimado em US$ 55 bilhões. Terceiro, com a Vale foram vendidas reservas de urânio, e isso é proibido pela constituição. Esses elementos facilitam a anulação do leilão de venda da Vale, o que favorece a reestatização por decreto, sem indenização, porque as empresas já lucraram muito, e com base numa fraude - claro que é preciso discutir as ações dos trabalhadores.



UOL - O Estado de Minas tem regiões bastante distintas em termos econômicos. Quais são as propostas da Frente de Esquerda para combater as desigualdades regionais?



Vanessa - Nosso programa se aplica a todo o Estado, mas é claro que os investimentos devem ser feitos de acordo com cada região. Uma das medidas que discutimos é a reforma agrária, que no caso de Minas é de fundamental importância, porque nas regiões mais pobres seria a principal medida para a democratização da renda e da riqueza. O Estado deve ser o dinamizador dessa reforma e não pode agir sozinho, até porque essa é uma tarefa do governo federal - e Heloísa tem a mesma proposta. Mas também não basta fazer a reforma agrária como o governo Lula, que compra a fazenda dos latifundiários a preços altíssimos (o que faz com que a reforma seja muito mais lenta) e, depois de feita, o trabalhador fica abandonado na terra. É preciso ter políticas claras para mantê-lo no campo. A reforma agrária é nosso carro-chefe no que diz respeito à geração de renda. Outro elemento importante é o plano de obras públicas, que gere empregos. É óbvio que as regiões mais carentes devem ser priorizadas, com construção de casas populares, escolas, campi da universidade estadual e hospitais, saneamento básico, tratamento de lixo e esgoto. Tudo isso é possível a partir da suspensão do pagamento da dívida e do aumento da cobrança de impostos das grandes empresas.



UOL - Até agora, sua candidatura não teve crescimento significativo nas pesquisas. A sra. acha que a transferência de votos e da popularidade de Heloísa Helena ainda é possível?



Vanessa - Estamos trabalhando em torno de um programa nacional. É claro que a senadora é muito mais conhecida do que qualquer um de nós no Estado. Mas vamos trabalhar até o último minuto, e achamos que é possível haver uma transferência grande dos votos de Heloísa - não apenas para os candidatos a governador, mas também os proporcionais. Queremos discutir o programa da Frente e a necessidade de um novo modo de governar para o país, e isso só é possível na medida em que as pessoas votem em todos os candidatos da frente. Queremos fazer essa discussão, apesar do pouco tempo no horário gratuito, mas no corpo-a-corpo temos conseguido esse objetivo. Achamos que é possível reverter pelo menos parte dos votos da Heloísa para a Frente de Esquerda.



UOL - Por que a sra. acha que isso ainda não aconteceu?



Vanessa - Um elemento é que a Heloísa é bem mais conhecida, e outros são nossas condições financeiras e o espaço na imprensa. O Estado é muito grande, com cidades muito pequenas e, como não existe democratização na imprensa e no processo eleitoral, há uma dificuldade maior de nossas candidaturas chegarem às pessoas. Há também um jogo da grande mídia e das estruturas de governo para despolitizar as eleições, personificá-las e descasar o candidato do seu partido, de governos anteriores desse partido. Isso, é claro, dificulta uma candidatura programática como a nossa.



Reportagem publicada em 27.set.2006

Todos os candidatos ao governo de Minas Gerais foram convidados para conceder entrevista ao UOL.

Nome Completo:
Vanessa Portugal Barbosa

Local de nascimento:
Boa Esperança (MG)

Data de nascimento:
12 de abril de 1970

Profissão: professora de biologia

Partido: PSTU

"Apesar de Nilmário ter feito algumas críticas à forma como Aécio trata o serviço público, a proposta do PT não se diferencia do PSDB."

Vanessa Portugal

REFORÇO NACIONAL

José Maria de Almeida, presidente do PSTU e ex-candidato à Presidência, aparece no programa de Vanessa na TV