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"O pior emprego do Brasil é ser governador do Rio de Janeiro", afirma Vladimir Palmeira

Carolina Juliano
Em São Paulo

Após duas tentativas frustradas, este ano Vladimir Palmeira conseguiu finalmente lançar-se como candidato ao governo do Estado do Rio de Janeiro pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Em 1994 e 1998, sua candidatura foi preterida pela executiva nacional do partido. Este ano, nem houve prévias. Palmeira acabou indicado pelo diretório federal como o candidato natural do PT no Estado.

Aos 61 anos, 26 deles dedicados ao PT, Palmeira diz que sempre se sentiu seguro no partido, apesar das divergências que o levaram algumas vezes a pensar em abandonar a legenda. Diverte-se quando o seu adversário do PRB, Marcelo Crivella, se autoproclama o candidato do governo federal e garante que tem um bom diálogo com o presidente Lula.

Apesar de estar em quinto lugar nas pesquisas de intenção de voto no Estado do Rio, Palmeira promete fazer uma campanha polêmica e reverter o quadro. "O pior emprego do Brasil é ser governador do Rio de Janeiro", disse à reportagem do UOL. "Mas vale a pena. É um desafio."

Confira a seguir os principais trechos da entrevista:

UOL - O senhor teve duas vezes a sua candidatura ao governo do Rio de Janeiro preterida pela executiva nacional do PT (em 1994 e 1998). O que aconteceu? Por que este ano o senhor se transformou no candidato natural do partido?

Vladimir Palmeira
- Em 1994 eu ganhei a prévia que disputei com Milton Temer, mas não levei porque foi alegada falta de quórum. E na convenção lançaram a candidatura do Jorge Bittar e eu perdi por 14 votos. Em 1998, ganhei a convenção, mas aí houve a intervenção nacional e a ordem para o PT apoiar a candidatura Garotinho. Fiquei de fora de novo.

Este ano a bancada federal me lançou, a bancada estadual me apoiou, o prefeito de Nova Iguaçu, o prefeito de Niterói também, e no fim do ano o diretório me indicou formalmente. Nem houve prévia.

UOL - A sua candidatura conta com o apoio incondicional do PT?
Palmeira
- Claro.

UOL - É que nós vemos hoje o Marcelo Crivella (candidato do PRB ao governo do Rio) se proclamando "o candidato do governo federal". Como é que o senhor se sente com isso? Como se posiciona?

Palmeira
- Eu me divirto. Eu já o provoquei falando em confissão, ele disse que eu era ignorante porque na igreja dele não existia confissão e que eu era ateu. Eu me divirto cada vez mais. O Lula tem dois palanques e pronto. É natural.

UOL - Mas isso não atrapalha a sua campanha?

Palmeira
- Isso gera certa confusão, mas o Lula tem toda razão. Se mais um candidato ao governo do Estado o apóia, por que ele iria recusar esse apoio?

UOL - O presidente Lula deve subir em dois palanques no Estado do Rio?

Palmeira
- Não sei como a coordenação nacional vai resolver isso. Mas se tiver de subir em dois ou três, tudo bem. Quantos candidatos quiserem apoiar o Lula, tantos palanques ele vai ter. O Crivella está dizendo que é "o candidato", mas isso é bobagem. Quem vai ganhar a disputa pelo governo do Estado do Rio de Janeiro será quem tiver propostas. O apoio do Lula é bom, é importante, mas o que mais importa é se você tem propostas para o Estado.

UOL - O senhor é quarto ou quinto colocado nas pesquisas. O Crivella está em segundo. Uma vez que ele se proclama o candidato do Lula, que está em primeiro lugar nas pesquisas de intenção de voto, ele não pode estar indo buscar votos que poderiam ser seus?

Palmeira
- Ter apoio do Lula é melhor do que não ter. Mas o apoio do Lula não é tudo. Se fosse assim o PT venceria em todos os Estados. O apoio do Lula é positivo, ajuda a campanha, mas cada um tem que fazer sua própria campanha.

O Crivella ficou com ciúmes do Sérgio Cabral (PMDB), que disse que era amigo íntimo do Lula. O que tem ser amigo do Lula? Eu acho que o Cabral e a senhora dele freqüentam o palácio (da Alvorada, residência oficial do presidente da República) e que o Lula e ele trocam confidências porque só assim para ser um amigo extraordinário do Lula. Mas isso tudo é uma bobagem.

UOL - A visita que o senhor recebeu do ministro das Relações Institucionais Tarso Genro (no dia 21/7) teve como objetivo oficializar o apoio do governo federal à sua candidatura?

Palmeira
- Ele veio dizer que o PT me apóia. Disse que eu era o candidato do governo federal. Eu acho muito bom que ele venha e diga isso, mas eu não entro em competição com ninguém, não.

Eu tenho o apoio do governo federal porque eu defendo o governo federal politicamente. Eu sou do partido que o sustenta, o partido do presidente da República. Mas isso não tem nada a ver. Eu vou ganhar a eleição porque eu tenho propostas para o Rio.

AS DIVERGÊNCIAS COM O PT

UOL - Essas divergências que o senhor teve com o PT o afastaram do partido? Em algum momento o senhor pensou em deixar o PT?

Palmeira
- Sim. Tive algumas diferenças e pensei em sair mesmo.

UOL - Hoje o senhor se sente seguro no PT?

Palmeira
- Seguro eu sempre me senti, ninguém nunca me ameaçou, a questão é outra. Eu faço parte da militância do PT, minhas diferenças eram políticas, mas a militância achou que eu deveria ficar no partido e eu fiquei. Depois eu ia sair quando o partido estava sob a ofensiva da direita. As minhas diferenças são (ou eram) importantes, mas eu nunca pensei em ir para uma posição de extrema-esquerda.

UOL - O senhor foi deputado por duas vezes, inclusive deputado constituinte, por que não se candidatou mais a cargos legislativos?

Palmeira
- Porque eu já cumpri minha função. Em dois mandatos você aprende, ensina e está bom. Tem que dar chance a outros. Acho que o PT, inclusive, deveria ter como política estimular um rodízio para ter mais militância no Congresso Nacional. Mais pessoas que fossem lá para dar sua contribuição sem que o trabalho virasse rotina.

O PIOR EMPREGO DO BRASIL

UOL - Não pensa mais em ser candidato ao Legislativo?

Palmeira
- Não. Já dei minha contribuição. Eu quero agora o Executivo, que faz um trabalho diferente. O trabalho do parlamentar é de elaboração de leis e eu participei da Assembléia Constituinte, que elaborou o corpo básico das leis. Agora me interessa mesmo o Executivo, ainda mais num Estado como o Rio de Janeiro, que é um desafio para qualquer um.

O pior emprego do Brasil é ser governador do Rio de Janeiro. Isso porque é realmente um desafio você melhorar a situação do povo pobre do Rio, melhor a sua economia, recolocar o Estado em seu papel de liderança na Federação. É uma coisa importante. Vale a pena!

CAMPANHA ELEITORAL

UOL - No seu site na internet, diz que quer "fugir de campanhas pasteurizadas". Como?

Palmeira
- As campanhas políticas são comandadas por publicitários que trabalham em cima de pesquisas qualitativas. E elas indicam para todo mundo o ângulo de abordagem das determinadas questões e dizem se vale a pena ou não abordar certos temas. Isso tornou os candidatos um pouco iguais. As lideranças políticas vão se perdendo, assim como as ideológicas. Fica tudo padrão e eu não quero isso.

Eu quero fazer uma campanha polêmica tratando de questões que freqüentemente são tidas como não positivas, como a pena de morte, o aborto, a homossexualidade. Eu vou fazer programas com esses temas. Quero que o partido seja a expressão do movimento social. Não quero tirar nenhuma questão porque ela possa criar dificuldade com o eleitorado.

UOL - O senhor diz que vai fazer, no Rio, um governo de esquerda. Como o senhor define um governo de esquerda?

Palmeira
- Diante dessa crise ideológica no mundo, eu defino que é de esquerda quem defende os oprimidos, mas isso só não é suficiente. De esquerda é também quem defende a luta dos oprimidos. O governo Lula não só defendeu os oprimidos com a redistribuição de renda, como também tem dado espaço - como nenhum outro presidente da República deu - para os movimentos populares.

UOL - Não podemos ignorar que o governo do presidente Lula tem uma política econômica excludente.

Palmeira
- Não, o presidente Lula tem uma política econômica muito boa. Pode-se dizer que a política monetária dele tem problemas. Mas a econômica, não. Se ela consegue aumentar salário real, aumentar emprego e aumentar o salário real, não pode ser excludente. No governo Lula, pela primeira vez em 23 anos, caiu a concentração de renda. É a primeira vez que os pobres ganham mais.

No Estado do Rio de Janeiro, vamos fazer uma política de esquerda neste modelo. Com mais distribuição de renda e mais participação popular. A questão da criminalidade aqui é central. Os bandidos oprimem a população pobre e a polícia também. Os pobres são oprimidos pelos dois lados. Quero mudar a condição da polícia. A polícia tem que defender a vida e o cidadão. Hoje o Rio de Janeiro é um verdadeiro faroeste.

PROGRAMA DE GOVERNO

UOL - E como o senhor pretende mudar isso?

Palmeira
- Primeiro tem que ter uma orientação de base. Precisa mudar essa idéia de que você acaba com uma quadrilha colocando a polícia em cima do morro. Isso vai acabar. E vamos fazer isso com mais investigação, que deve ficar a cargo da polícia civil. A PM vai fazer policiamento preventivo e, claro, eventualmente vai agir como polícia de choque para reprimir graves crises. É uma orientação muito diferente da política atual.

Com o tempo também vamos mudando a polícia. Há muito bandido na polícia, vamos ter que fazer uma seleção, afastar elementos que não se enquadrem.

UOL - A prioridade do seu governo será a segurança pública?

Palmeira
- Sem dúvida. Minha prioridade é emprego e segurança. Mas entenda bem, hoje em dia não se pode fazer política social sem atacar os problemas das quadrilhas. Nas escolas públicas, traficante bate em professor. Nos postos de saúde também não há segurança. Há professores que não aceitam trabalhar em determinadas escolas e há médicos que se negam a trabalhar em certos postos de saúde que estão em bairros controlados por traficantes. Para eu poder oferecer serviço público em determinados lugares preciso, antes, desmontar as quadrilhas.

EDUCAÇÃO

UOL - Quais os seus planos para a educação?

Palmeira
- Temos um problema sério de qualidade de ensino. Faltam professores e há professores sem qualificação porque o Estado, em vez de colocar os concursados, nomeia professores por indicação política. Vou precisar contratar professores e aumentar também o salário deles para vinculá-los à escola. Porque há professores que precisam saltar de escola em escola para dar aulas e isso tem que acabar. Temos que melhorar a situação do professor para ele poder dar um atendimento mais qualificado aos meninos.

UOL - Algum plano de reativar os Cieps (Centros Integrados de Educação Pública, criados pelas administrações de Leonel Brizola)?

Palmeira
- Sim, é mais ou menos a mesma coisa porque quero dar ensino em tempo integral. O que tem no (projeto do) Brizola de mais positivo é o horário integral, é ocupar as crianças o tempo inteiro. Esse tipo de ocupação das crianças com qualidade, de interação das escolas com a sociedade é muito positivo.

Também na educação eu vou reformular inteiramente o ensino técnico, que hoje é uma bagunça. No Rio de Janeiro o ensino técnico saiu da Secretaria da Educação e passou para a Secretaria de Ciência e Tecnologia. Vamos voltar para a Educação e vamos fazer uma reformulação nos cursos oferecidos. Hoje são cursos comerciais e não cursos técnicos, temos que formar para áreas que precisam de mão de obra.

SAÚDE

UOL - E para a área da saúde?

Palmeira
- O aspecto principal é recolocar o governo na sua posição, no seu papel institucional de articulador do sistema único de saúde no Estado. O governo Garotinho não cumpriu essa função, é uma bagunça generalizada, os municípios não dialogam entre si, o trabalho na Região Metropolitana avançou um pouco e depois estancou. Nós temos que restabelecer esse papel e isso só depende de vontade política.

Depois vamos trabalhar em conjunto com os municípios para descentralizar a saúde e finalmente vamos reformular a estrutura dos hospitais estaduais, que hoje é uma vergonha, um abandono completo. Há funcionários mal pagos, hospitais mal administrados, salários ruins. Haverá uma reformulação estrutural. Vamos democratizar, colocando os funcionários também na gestão, mas com critérios técnicos e não políticos.

CONTAS PÚBLICAS

UOL - Como o senhor pretende lidar com o déficit que a governadora Rosinha Garotinho deve deixar de herança para seu sucessor (estimado em R$ 1 bilhão pelo Tribunal de Contas)?

Palmeira
- Vamos ter que apertar o cinto no primeiro ano de governo, tentar consertar isso melhorando a arrecadação, reformulando a secretaria da fazenda, melhorando a estrutura de fiscalização. Vai haver também um certo ajuste, temos que diminuir gastos. O governo Rosinha terceirizou muitos serviços, é uma barbaridade. E essas terceirizações nem sempre são úteis, para falar numa linguagem polida. Há casos de empresas contratadas para serviços que não realizaram. Vamos ajustar, mas sempre preservando o funcionamento daquilo que for mais importante para o setor público.

UOL - O que o senhor acha que será mais difícil de consertar depois dos últimos dois governos (de Anthony e Rosinha Garotinho)?

Palmeira
- É páreo duro. A questão da criminalidade piorou muito. Mas tem outras tarefas muito difíceis para um governador: a habitação, o transporte. Há déficit de tudo porque não tem dinheiro, não tem recurso. Nós dependemos do governo federal. Muita gente promete mundos e fundos, mas não vai cumprir. Nós temos que ter uma política ativa de procurar colaboração com o governo federal para resolver esse problema, que é muito difícil.

UOL - Se o presidente Lula for reeleito, o senhor acha que é o candidato do Rio que melhor poderá dialogar com ele para buscar investimentos federais?

Palmeira
- Eu acho que tenho um bom diálogo do Lula e não terei problema em trabalhar com ele.

PESQUISAS

UOL - Como o senhor lida com as pesquisas de intenção de voto?

Palmeira
- Acho que elas revelam esse momento que o eleitor ainda não decidiu nada porque não tem campanha de televisão. Os candidatos que estão na frente agora são aqueles que já disputaram cargos majoritários.

UOL - O senhor acha que as pesquisas vão mudar depois que começar a campanha na TV?

Palmeira
- Claro que sim. Nós do PT estamos fazendo uma campanha de militância e vamos fazer a campanha de TV para reverter este quadro. Até lá creio que não vá haver grandes mudanças na posição dos candidatos. Só o programa de TV é que poderá alterar isso.

UOL - O senhor vai ter quantos minutos de propaganda?

Palmeira
- Teremos 3 minutos e 57 segundos, que serão suficientes para eu falar o que tenho que falar. O tempo dá e sobra.

Todos os candidatos ao governo do Rio de Janeiro foram convidados para conceder entrevista ao UOL.

Nome completo:
Vladimir Gracindo Soares Palmeira

Local de nascimento:
Maceió (AL)

Data de nascimento:
11 de dezembro de 1944

Profissão: economista

Partido: PT

"As pesquisas qualitativas indicam para todo mundo o ângulo de abordagem e se vale a pena ou não abordar certos temas. Isso tornou os candidatos um pouco iguais. Fica tudo padrão e eu não quero isso."

Vladimir Palmeira, explicando que não gostaria de ser um candidato pasteurizado