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É preciso congelar altos salários, diz Olívio

Marcelo Gutierres
Da Redação, em São Paulo

Candidato do PT ao governo do Rio Grande do Sul, Olívio Dutra, 65, já esteve à frente do executivo gaúcho entre 1999 e 2002. O sonho de um segundo mandato foi desfeito quando o partido rachou e promoveu prévias, vencidas pelo então prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro, derrotado posteriormente por Germano Rigotto (PMDB) em 2002, agora candidato à reeleição.

Olívio ocupou o Ministério das Cidades, pasta criada no início do governo Lula. A demissão veio em 2005, no auge da crise provocada por denúncias do mensalão, em uma reforma ministerial para acomodar aliados do PP. O presidente Lula ofereceu ao ex-ministro, fundador do PT como ele, um cargo na Infraero. Olívio respondeu que não estava precisando de emprego. Ainda em 2005, foi eleito presidente do PT gaúcho.

Em entrevista ao UOL, Olívio diz acreditar num "clima favorável" para encaminhar à Assembléia, caso eleito, medidas para combater o déficit público, com base em uma nova matriz tributária. O petista promete retomar o orçamento participativo, bandeira da administração do partido em Porto Alegre e também colocada em prática em âmbito estadual. Afirma que respeitará o MST, mas que não concordará com "táticas adotadas".

Olívio Dutra também diz que não tem relação direta com a arrecadação de campanha e que se apóia na "criatividade" para driblar a falta de recursos. E sobre a frustrada negociação para implantar uma unidade da Ford no Estado (a saída da montadora virou cavalo de batalha da oposição), afirma: "Eu não gostaria que nenhum governante vivesse aquela situação". A seguir, os principais trechos da entrevista.

UOL - Caso eleito, como o sr. pretende combater o déficit público?

Olívio Dutra
- Sem tarifaço, diferentemente do que fez o atual governo. Caso eleito, uma das primeiras medidas de nosso governo será encaminhar à Assembléia Legislativa um programa de incentivo ao crescimento com base em uma nova matriz tributária. Promoveremos uma reestruturação com uma política que estimule a produção gaúcha, valorize as nossas vocações locais, zere o ICMS para muitos produtos - não só os da cesta-básica -, reduza as alíquotas do ICMS para alguns produtos de determinadas regiões. Nós queremos tornar mais justa a estrutura tributária, ou seja, quem tem maior poder contributivo paga mais, quem tem menor, paga menos. Os setores mais deprimidos, por um determinado tempo, podem não pagar aqui ou ali, esta ou aquela compensação.

UOL - O sr. acredita que terá maioria na Assembléia? Como será a negociação com o Legislativo?

Olívio
- Olha, nós não tivemos maioria quando governamos de 1999 a 2002. Por isso, por três vezes esse projeto importante, sério, que tocava no cerne da crise estrutural do Rio Grande do Sul, não teve lá aprovação. Mas isso não impediu que nós fôssemos tomando democrática e responsavelmente medidas que fizeram bem para a economia do Rio Grande do Sul. Eu penso que já há clima mais favorável, uma compreensão mais consolidada de que é preciso mexer na matriz tributária do Estado e não via tarifaço ou via renúncia fiscal ou anistia tributária, como fez este governo, repetindo as políticas que, antes da Frente Popular, já tinham prejudicado enormemente o Estado. Nós confiamos nesse novo clima. Estamos cada vez mais abertos ao diálogo, inclusive com setores, forças políticas e sociais que pensam diferente.

UOL - O sr. pretende seguir as determinações do Pacto pelo Rio Grande [iniciativa da Assembléia contra o déficit público, prevendo congelamento de salários nos três poderes]?

Olívio
- Em parte, sim. Esta medida que trata de acabar com a renúncia fiscal enorme, com as anistias fiscais, com os favores tributários para quem menos precisa, isso nós já propúnhamos quando fomos governo. Agora, outras propostas, como essa de congelar todos os salários, são impraticáveis. Ou o teto salarial do poder executivo proposto pelo atual governador, de R$ 22 mil, isso nós não pretendemos cumprir de jeito nenhum. Precisamos congelar o salário dos que já ganham muito bem e que são poucos do executivo, mas são muitos nos outros poderes.

UOL - O sr. pensa em privatizações?

Olívio
- Não, não. Até porque os próprios adversários já esgotaram esse discurso. Nós queremos fazer com que as empresas públicas funcionem no interesse público, de forma qualificada, atualizada, aperfeiçoada. Elas não podem ser cabides de emprego.

UOL - Como o sr. pretende combater o déficit previdenciário do Estado?

Olívio
- Não tem solução mágica ou arbitrada de cima para baixo de forma impositiva e arrogante. Nós temos que desencadear um processo que, por exemplo, crie um fundo para os funcionários que ingressarem daqui para adiante, via concurso público. E nós temos que ter no IPE [Instituto da Previdência gaúcho] um controle maior, com auditagem que evite desperdícios, descontroles, descaminhos. Nós temos de assegurar que os atuais contribuintes - sejam pensionistas, aposentados ou trabalhadores na ativa - não tenham prejuízo nenhum. São legítimos os direitos, mas nós temos que ir acabando com privilégios e particularmente com uma cobertura previdenciária de quem não contribuiu porque é um atendimento que, às vezes, falta para aquele que mais precisa e contribuiu sempre.

UOL - O PIB gaúcho teve um recuo, ficou em 4,8% negativos em 2005. Como o sr. pretende retomar o crescimento?

Olívio
- Valorizando setores, ramos e sistemas locais de produção, por exemplo. Estimular a micro, pequena e média empresa de diferentes setores. Investir em pesquisa, ciência e tecnologia para aumentar a capacitação e o valor agregado do bem e do serviço produzido. Isso é um processo. Portanto, isso também é baseado num diálogo, numa discussão ampla com a sociedade, desde agora, que vai resultar num encaminhamento de um Programa de Incentivo ao Crescimento para a Assembléia Legislativa nos primeiros meses de governo. Não tem mágica e não tem solução imediata. Temos que desencadear um processo de mexer nessas questões estruturais. A matriz tributária do Estado está de ponta-cabeça. Ela tem de ficar de pé.

UOL - O sr. pretende retomar o orçamento participativo?

Olívio
- Evidentemente. Nós queremos informar a cidadania de onde vêm os recursos. Queremos ter de volta o orçamento participativo, de forma mais qualificada, aperfeiçoada, plural, aberta. Hoje o que se chama de consulta popular é, na verdade, uma coisa que se preocupa com o quantitativo. É como colocar um rebanho de animais num brete e alguém ficar contando quantas cabeças passam por ali.

UOL - O sr. considera que errou ou acertou no caso Ford [negociação frustrada para implantação de uma unidade no Estado]?

Olívio
- Eu não gostaria que nenhum governante vivesse aquela situação: uma grande e poderosa empresa, com um faturamento de bilhões de reais, que estava sendo favorecida com recursos que o Estado não tinha para atender à micro, pequena e média empresa e nem sequer para pagar justamente o salário dos trabalhadores do setor público. Estávamos fazendo essa negociação, atravessou-se o governo federal [governo FHC], por injunções político-partidárias, e aprovou uma medida provisória do governo federal - que inclusive alterou o regime automotivo aqui do Mercosul -, para repassar mais favores dos favores já enormes que a Ford estava recebendo para ir para a Bahia. Gostaríamos que essa empresa estivesse aqui, mas não do jeito que foi proposto, com um enorme custo para o Rio Grande e também com uma desconsideração para setores que estavam falidos.

UOL - As estiagens castigam o produtor gaúcho. Especialistas dizem que se trata de algo relativamente previsível. Como o sr. planeja resolver esse problema?

Olívio
- Temos de trabalhar a sustentabilidade. Temos de incentivar com ciência, com tecnologia, com financiamento, com extensão cultural. Temos de diversificar nossa produção primária e aumentar a produtividade para garantir um ganho justo ao micro, pequeno e médio agricultor, à agropecuária e à agroindústria. Uma política de açudagem também é muito importante, assim como a implantação de cisternas em determinadas regiões do Rio Grande ou de poços artesianos. Isso são medidas, digamos, de curto prazo. Defendo também um zoneamento agrícola que possibilite uma agricultura adequada.

UOL - Como será a sua relação com o MST?

Olívio
- Uma relação de respeito, o que não quer dizer que se concorde com todas as táticas aqui ou ali desenvolvidas. Todos os movimentos sociais têm de ser respeitados. Eles têm de estar conosco, dialogando, conversando, propondo, averiguando, acompanhando a execução de políticas, demandando. Isso faz parte da democracia.

UOL - Como está sendo a arrecadação de recursos para a sua campanha?

Olívio
- Eu te confesso: não tenho relação direta com essa questão. Há uma pessoa encarregada disso. É o Laerte Meliga [responsável pela arrecadação de campanha], que chefia uma comissão. Não tenho falado com ninguém fora dessa comissão a respeito de quais são as fontes. Eu sempre fiz política com muita escassez de recursos, mas com bastante criatividade. Temos uma visão do mundo: a política não é um "toma-lá-dá-cá", um "é-dando-que-se-recebe", uma troca de favores. Política é construção do bem comum com o protagonismo das pessoas. Nós acreditamos nessa idéia, muito mais do que em dinheiro.

Todos os candidatos ao governo do Rio Grande do Sul foram convidados para conceder entrevista ao UOL.

Nome completo:
Olívio de Oliveira Dutra

Local de nascimento:
Bossoroca (RS)

Data de nascimento:
10 de junho de 1941

Profissão: professor

Partido: PT

"Eu não gostaria que nenhum governante vivesse aquela situação: uma grande e poderosa empresa que estava sendo favorecida com recursos que o Estado não tinha"

Olívio Dutra, ao falar sobre a frustrada negociação com a Ford durante o seu governo [1999-2002]

CRIATIVIDADE

Olívio diz que recorre à criatividade para vencer a falta de recursos de sua campanha