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28/10/2006 - 00h54

Eleitores trazem o dia-a-dia para debate dos presidenciáveis na Globo

Cris Gutkoski
Da Redação, em São Paulo
Na antevéspera da eleição, os candidatos Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Geraldo Alckmin (PSDB) foram confrontados em debate na Rede Globo num formato diferenciado dos três encontros anteriores no segundo turno. Nos três primeiros blocos, o petista e o tucano responderam perguntas de 12 eleitores indecisos sobre vários temas.

Marlene Bergamo/ Folha Imagem
Geraldo Alckmin (esq.) e Luiz Inácio Lula da Silva posam para foto no último debate
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Vindos de diversos Estados, os participantes trouxeram questões do dia-a-dia da população, como os temores sobre a Previdência, os altos custos dos impostos para microempresários, os problemas de saneamento básico que inundam residências em época de chuva. O tema da corrupção surgiu na pergunta de um lavador de automóveis de Porto Alegre.

Lula e Alckmin caminharam e gesticularam bastante no cenário. Por várias vezes, o presidente se aproximou do adversário, a ponto de tocá-lo.

Esta foi a quarta vez que os presidenciáveis se confrontaram na TV no segundo turno. O primeiro debate foi realizado pela Bandeirantes, em 8 de outubro, quando pela primeira vez um presidente em exercício do cargo, em campanha, se submeteu a um confronto ao vivo para grandes audiências. Depois, as emissoras SBT e Record promoveram os seus, em 19 e 23 de outubro, respectivamente.

Com mediação de William Bonner, o formato na Globo se diferenciou dos demais, ao acomodar no cenário eleitores indecisos, e não apenas candidatos e jornalistas. Os 80 eleitores foram selecionados pelo Ibope a partir de um grupo inicial de 300 pessoas.

O debate se realizou na antevéspera do pleito, e um dia após três institutos de pesquisa (Ibope, Sensus e Vox Populi) apontarem vantagem de Lula de mais de 20 pontos sobre o seu adversário.

Primeiro bloco
A primeira pergunta foi feita para Geraldo Alckmin (PSDB) por uma moradora do Pará, que reclamou de escolas públicas abandonadas e quis saber das propostas do candidato para a educação básica.

Alckmin lembrou que a universalização do ensino fundamental foi conquista do governo de Fernando Henrique Cardoso e criticou o governo Lula por não conseguir aprovar o Fundeb. "A gente fica triste de saber que tem 2,2 milhões de crianças fora da escola", disse o tucano.

Respondendo à eleitora, Lula afirmou que o seu governo criou quatro novas universidades federais e 48 extensões universitárias, além de revitalizar as escolas técnicas. Em eventual segundo mandato, o petista prometeu, para cada cidade-pólo, a criação de uma extensão universitária e uma escola técnica.

Uma eleitora do Paraná, trabalhadora autônoma, manifestou sua preocupação com um anunciado colapso da Previdência, em futuro próximo, e também com o excesso da burocracia para conseguir os benefícios.

Segundo Lula, o déficit será corrigido quando a economia crescer e gerar emprego. O presidente também citou o censo da Previdência como arma para modernizá-la e dar fim às fraudes.

O candidato tucano fez as primeiras críticas, nesse bloco, ao crescimento da economia no governo Lula. "O país cresce menos do que Argentina, Uruguai, Bolívia, Paraguai", disse. Mais tarde, no segundo bloco, Lula revidou, lembrando que economias distintas não devem ser comparadas.

"O Alckmin adora brincar com números possivelmente porque acredita que o povo não vai checar os números dele", disse o presidente. "Os economistas sérios deles (do PSDB) não fazem essa comparação. Pergunta se o Serra compara o crescimento do Brasil com o do Paraguai". Lula citou José Serra, governador eleito de São Paulo, por duas vezes durante o debate.

Uma eleitora de Belo Horizonte quis saber como melhorar o tratamento e a distribuição de remédios nos postos de saúde. A pergunta não foi respondida pelos candidatos. Alckmin aproveitou o tema para citar crises nas Santas Casas e a rede hospitalar deteriorada do Rio de Janeiro. Lula lembrou realizações de seu governo, como o aumento das verbas para a saúde e a criação das Farmácias Populares.

"A saúde foi sucateada", disse Alckmin. "Piorou muito". O presidente revidou: "Nós aumentamos o dinheiro da saúde de 28 bilhões para 44 bilhões de reais. Ele diz que piorou, não diz como era quando eles governavam esse país."

Ao responder à pergunta de um eleitor de São Paulo (que teve a casa inundada) sobre saneamento básico, Lula afirmou que os investimentos na área escassearam de 1998 a 2001. E citou a responsabilidade do administrador municipal que permite loteamentos irregulares. "Lamentavelmente, nos grandes centros urbanos, a ocupação é sempre desordenada". O presidente lembrou a criação do Ministério das Cidades no seu governo, como forma de dar prioridade ao tema do saneamento básico.

Segundo bloco

A primeira pergunta do segundo bloco foi sobre emprego, feita por uma eleitora carioca cujo irmão está desempregado há um ano. "Quando de fato o desemprego vai diminuir?", ela quis saber.
Lula admitiu que o desemprego não tem diminuído no ritmo necessário. "Foram gerados 7,7 milhões de empregos, dos quais 5,5 milhões com carteira assinada", disse, referindo-se ao seu mandato.

Uma moradora de Belém se declarou revoltada com o desmatamento. Alckmin trouxe números da devastação de milhares de quilômetros na região amazônica e prometeu, se eleito, melhorar a infra-estrutura na região dentro das regras do desenvolvimento sustentável.

Lula reagiu com números da queda do desmatamento nos dois últimos anos, cerca de 30%. Reiterando inserções de sua propaganda gratuita, Alckmin denunciou como "privatização" a lei - irresponsável, segundo o tucano - que permite concessões a empresas brasileiras e estrangeiras na região. "Se hoje é difícil fiscalizar, imagina quando entregarem para a iniciativa privada". Segundo Lula, a nova lei é necessária para acabar com a grilagem na floresta. "É concessão, não é para ser privatizada", disse.

Um jovem eleitor de Pernambuco, terra natal de Lula, lembrou que amigos seus morreram devido à violência urbana. "O que o sr. vai fazer para salvar a vida dos meus amigos?", ele perguntou. O tema da segurança pública gerou nova troca de acusações entre os presidenciáveis. Para Lula, a criminalidade está relacionada às décadas anteriores de descaso dos governos com a educação. Alckmin acusou o governo federal de omisso no policiamento das fronteiras e prometeu, se eleito, combater o tráfico de drogas, agindo nas causas da violência.

"Lula prometeu cuidar das fronteiras em 2002. Está tudo abandonado", disse.

Lula aproveitou a deixa para citar a atuação do PCC (Primeiro Comando da Capital) no Estado de São Paulo. "A perfeição da polícia de São Paulo resultou no PCC. O cuidado deles com adolescentes resultou na Febem".

Alckmin subiu o tom no final do segundo bloco, durante uma pergunta sobre transporte público feita por um eleitor de Fortaleza. Disse que Lula interrompeu obras no metrô em capitais. "Ele parou o metrô por três anos e sempre a culpa é dos outros. É impressionante como ele não assume responsabilidades".

Terceiro bloco
No último segmento destinado a perguntas de eleitores indecisos, o tema da corrupção veio à tona na voz de um lavador de veículos de Porto Alegre. Ele pediu soluções para controlar melhor o dinheiro público e a corrupção.

"Quero abrir meu coração com você", disse Alckmin. "O povo está indignado com o que aconteceu no país nos últimos anos". Lula retomou o discurso de que seu governo iniciou um combate inédito à corrupção "na história desse país". Citou um livro do procurador da República Cláudio Fontelles.

"Nós decidimos combater a corrupção", disse o presidente. "Não é verdade", revidou Alckmin. "Os escândalos são sem fim. Não apuraram nada. O primeiro mandatário tem que dar exemplo e as coisas começaram dentro do Palácio do Planalto".

Um morador de São Paulo lamentou que, diferentemente de um colega seu, não vai receber décimo-terceiro salário no final do ano, por ser trabalhador autônomo. Para mudar ao quadro, de acordo com Lula, seria necessária uma "revolução no mundo do trabalho", além da manutenção do funcionamento do mercado interno.

"Todos os economistas do PFL, PSDB e PT sabem que o país nunca teve crescimento de consumo como está tendo agora, o que significa que a economia interna está crescendo", disse o presidente. Alckmin lembrou que o PT havia votado contra o Plano Real, em 1994.

Quarto bloco

Na hora de os candidatos trocarem perguntas entre si, Alckmin aproveitou a lista variada de problemas citados pelos eleitores para sublinhar a suposta ineficiência do governo Lula no saneamento, na habitação, na educação, nas leis trabalhistas etc.

Lula afirmou que atualmente 90% dos programas sociais são financiados pelo governo federal, criados a partir de bandeiras dos movimentos sociais. "Estamos começando a recuperar o tempo perdido", disse. "Cada brasileiro sabe que não é possível consertar em quatro anos o que não foi feito em 40 ou 50 anos".

Na única pergunta que fez diretamente ao adversário, Lula trouxe o tema da segurança pública e ironizou o bordão do tucano sobre a origem do dinheiro para a compra de um dossiê contra candidatos tucanos.

A resposta do tucano motivou aplausos da platéia de convidados. "Quando ele perguntou "de onde veio o dinheiro?", eu pensei que ele ia explicar para você". Alckmin repetiu os números que costuma citar sobre a queda de homicídios em São Paulo. "O PCC não é ligado ao meu partido."

"Se ele cuidou da segurança como diz que cuidou, é de saber o que poderia acontecer no Brasil com o PCC", revidou Lula.

Nas considerações finais, faltando poucos minutos para a meia-noite (prazo dado pela Justiça Eleitoral para eventos do tipo), o candidato do PSDB afirmou que "o Brasil não pode continuar nesse retrocesso de natureza ética" e que "esse slogan 'não troque o certo pelo duvidoso' é medroso".

Lula encerrou sua participação no debate com uma frase formulada na antevéspera em cerimônia no Palácio do Planalto com catadores de material reciclado organizados em cooperativas. "Esse preconceito que eles (a elite) têm, não tem como reciclar, tem que extirpar da política brasileira".

O presidente prometeu mais 300 mil vagas no Prouni (Programa Universidade para Todos) e mais acesso aos negros nas universidades, pelo sistema de cotas. "Nós vamos fazer pelo ensino fundamental aquilo que eles não fizeram, porque se fizessem as coisas estavam com boa qualidade hoje".