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17/10/2006 - 00h48

Trabalho do PSDB "é vender patrimônio", diz Lula no "Roda Viva"

Cris Gutkoski
Da Redação, em São Paulo
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva manteve o discurso de atacar as privatizações promovidas pelos governos tucanos em entrevista ao programa "Roda Viva", da TV Cultura. Lula negou que a tática seja "terrorismo eleitoral", como tem sido definida pelos adversários.

"O que falamos agora é um histórico da vida do PSDB. Eles privatizaram quase tudo que tinha no Estado de São Paulo e no Brasil. Falam de privatizar o que puder privatizar. O trabalho administrativo deles é vender o patrimônio público."

O "Roda Viva", da TV Cultura, fez nesta segunda-feira o primeiro de dois programas especiais com os candidatos a presidente. O segundo será no próximo domingo, com Geraldo Alckmin (PSDB).

Participaram da entrevista com Lula o apresentador Paulo Markun e os jornalistas convidados Renata Lo Prete (Folha de S.Paulo), Tereza Cruvinel (O Globo), Alexandre Machado (TV Cultura), Lourival Santana (Estado de S.Paulo), Denise Rothemburg (Correio Braziliense) e Cristiano Romero (Valor Econômico).

A entrevista, cuja transmissão à noite durou cerca de uma hora e meia, a partir das 22h40min, foi realizada na biblioteca do Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente. Em quatro blocos, Lula respondeu perguntas sobre privatizações, dossiê contra tucanos, reforma na Previdência, reforma política, orçamento da União, entre outros temas.

Sobre o primeiro debate na TV Bandeirantes, Lula disse que estranhou o comportamento de Alckmin: "Ele estava ensandecido, ele pensou que resolveria o problema da guerra numa única batalha". O presidente também afirmou que a disputa política no país é "historicamente velhaca".

Ao final do programa, na ausência de perguntas sobre realizações de seu governo, Lula trouxe o tema da educação.

Leia os principais trechos das respostas do presidente:

Privatizações e terrorismo eleitoral
"Naquele tempo (em 1989), diziam até que eu ia fechar as igrejas evangélicas. O que falamos agora é um histórico da vida do PSDB. Eles privatizaram quase tudo que tinha no Estado de São Paulo e no Brasil. Falam de privatizar o que puder privatizar. O trabalho administrativo deles é vender o patrimônio público. Ele (Alckmin) acabou de privatizar em São Paulo. Ele que diga textualmente que não vai fazer. A prática não tem sido essa".

"Sou contra a privatização dos setores estratégicos para a soberania nacional. A Petrobras, que tinha lucro líquido pequeno, hoje tem lucro extraordinário. A empresa tem dado saltos extraordinários e continua sendo empresa pública. No Brasil se criaram determinadas manias para se desfazer do patrimônio público. O Estado brasileiro já deu demonstrações de que pode gerir os próprios fundos com muita competência. Não cabe ao Estado competir em todas as áreas com a empresa privada".

Investimentos
"Quando eu precisava de dinheiro, não vendia a geladeira. Eu trabalhava mais, fazia hora extra. A palavra de ordem para o próximo ano não pode ser outra a não ser desenvolvimento, crescimento econômico, distribuição de renda. Quando vejo um assessor dizer que vai economizar R$ 60 bilhões, é uma heresia. Duvido que haja margem de manobra para alguém dizer que vai cortar R$ 60 bilhões porque isso é asfixiar o país. É a primeira vez depois de 23 anos que as empresas têm mais lucros do que os bancos neste país. Vamos terminar o ano desonerando 23 bilhões de reais".

Previdência
"Não temos muito onde cortar gastos. (Num próximo governo) Pode ter uma nova reforma (da Previdência). Não vai ser proposta do governo, vou juntar todos os segmentos da sociedade interessados, trabalhadores da ativa, aposentados e empresários, e vamos discutir que tipo de reforma fazer na Previdência sem penalizar o trabalhador. No mundo inteiro, o aumento da longevidade... a cada 15 ou 20 anos vamos ter que rediscutir a contribuição".

"Faz quase dois anos mandamos para o Congresso um projeto de lei chamado pré-empresa. Queríamos que o vendedor de cachorro quente pudesse se legalizar e participar de sistema de seguridade social com garantia de um mínimo de sobrevivência na velhice. (O projeto) Não foi aprovado. O Congresso poderia estar votando isso agora, (poderia) cumprir o papel importante de votar essas leis necessárias para o Brasil".

Escândalo do dossiê
"Se dependesse de mim, não teriam feito. E ao terem feito, deveriam ter falado no dia seguinte. Desde o início houve tentativa de dizer "o presidente sabia", como se fosse possível o presidente saber de tudo o que acontece no território nacional. O que é sagrado num governo republicano é que ao saber você tem que tomar as atitudes, afastar e permitir que as pessoas utilizem as garantias das instituições para se defenderem ou serem condenadas".

"Para prender é preciso respeitar o funcionamento das instituições. No que a minha candidatura precisava de dossiê? Se o dossiê é o que as pessoas dizem o que é, ele está na Internet. Como é que uma pessoa vai comprar um dossiê que está na Internet? A minha pergunta é simples, é de quem gosta de filme de detetive. Eu queria saber quem é o arquiteto desse dossiê".

E"u estava no Rio Grande do Norte, voltei aqui no domingo, chamei o presidente do partido (Ricardo Berzoini) lá em casa e disse "eu quero saber quem fez essa burrice, isso é uma sandice inominável". Ele me disse que não sabia. Falei, "Ricardo, você como presidente do partido tem obrigação de apresentar uma resposta para a sociedade". Na quarta, eu o afastei da coordenação da campanha. Agora posso esperar que a PF faça a investigação e consiga deles o que eu não consegui".

"A coisa não é tão simplista. Eu preferiria que quem fez a sandice tivesse assumido. Não assumiu, o que vai acontecer? A PF vai investigar a fundo. A ordem dada é que a PF não deixe pedra sobre pedra, pode demorar um dia, um mês um ano. Graças a Deus o método rápido de as pessoas contarem as coisas acabou. Nós conquistamos isso. Esse país tem justiça, tem Ministério Público, tem Polícia Federal. Não é mais uma questão da Presidência da República".

"Eu gostaria de saber quem é o arquiteto da idéia. Eu não tenho poder de investigação e é bom que eu não tenha. Só peço que apurem. E seja quem for que esteja envolvido, que pague o preço que tiver de pagar. Nós temos um povo mais atento, mais fiscalizador. Vocês deveriam ir para os comícios e ver como o povo está muito mais calejado, muito mais sabedor daquilo que lhe interessa".

"A maioria das quadrilhas que conseguimos desmantelar vem de muitos anos atrás. Tem gente que não se conforma com isso. Demos liberdade para a Polícia Federal trabalhar. Já houve momentos no Brasil em que não era assim".

O primeiro debate
"A minha relação política com as pessoas, de qualquer partido, sempre foi de muita diplomacia e de muita democracia. Nunca destratei nenhum político na minha relação pessoal. Estranhei o comportamento do meu adversário, ele estava ensandecido, ele pensou que resolveria o problema da guerra numa única batalha. Confesso que fiquei chateado. Ali estavam dois candidatos, mas estavam um governador do Estado e um presidente da República. Não gostei, mas também não me queixei, campanha é assim, campanha desfigura as pessoas. Eu preferia que o debate se desse no nível programático. Confesso que estranhei o comportamento do Alckmin naquele dia. Talvez ele tenha sido orientado para aquilo".

Campanha e família
"Cada um tem uma forma de ver a comunicação. Apareço o mínimo possível (na propaganda gratuita), até porque já sou muito conhecido. Eu não sou candidato do PT, sou candidato de um leque de partidos que me apóiam: PTB, PL, PC do B, PSB. Tenho que colocar a marca da campanha. O nosso programa está infinitamente mais qualificado do ponto de vista do conteúdo que o de nossos adversários".

"Não tenho acordo, tenho procedimento. Não me peçam para falar o nome de mulher ou de filho de adversário. Em 1989, não quero nem lembrar, eu tive a minha filha vítima disso. Eu sei o que é o reflexo disso na cabeça de uma pessoa. Vale para o meu filho o seguinte: da minha parte, não tocarei nas coisas pessoais do meu adversário. Não toquei na (vida) do Collor, do Fernando Henrique, do José Serra, do Alckmin".

"Não posso responder pelo site que um companheiro do PT fez. Posso responder pelo meu comportamento. O Marco Aurélio (Garcia) sabe o que eu disse pra ele. Numa campanha minha não se toca nesse assunto. O meu filho, minha mulher, eu e qualquer parente de primeiro a oitavo grau estão subordinados à mesma legislação de todos os demais brasileiros. Se tiver coisa errada, que se investigue e puna. Até agora, tudo foi investigado pelos meus adversários. Não posso tomar as dores do meu filho. Ao mesmo tempo não posso impedir que ele trabalhe. Alguém diga se houve coisa ilegal ou não".

"A disputa política nesse país historicamente é velhaca. As pessoas utilizam os argumentos mais absurdos possíveis para ganhar uma eleição. Quem ganhar com método ilícito, tem pouca chance de fazer um bom governo".

Reforma política
"A reforma política não é desejo do presidente. A questão da fidelidade partidária, a discussão sobre os mandatos, tem coisas que me incomodam, por que um senador tem mandato de oito anos e não de quatro? Sou simpático à idéia do voto distrital misto. Mas eu era parlamentarista no plebiscito e perdi. O que a gente não pode é vender o parlamentarismo como salvação da lavoura, temos que aprender a conviver com política de coalizão, tudo isso é aprendizado".

Orçamento da União
"O Orçamento não pode continuar a ser feito como está sendo. Ouvimos mais de 2.700 entidades. Todo mundo critica a comissão do orçamento. É mais honesto valorizar as emendas individuais (...) do que essas barganhas que acontecem. A emenda de bancada é mais saudável, tem mais identidade".

Petistas envolvidos em escândalos
"Chegar à presidência e montar ministério é quase como convocar uma seleção. Se o jogador não fez o que tinha de ser feito, ele é afastado. As pessoas foram chamadas pelas qualidades que tinham. Eles viraram alvos de críticas e denúncias e eu não poderia mantê-las no governo. O José Dirceu era um quadro que poderia ser ministro de qualquer governo da história desse país. Não existe amigo nessas coisas, existe comportamento. Na hora que você faz as coisas ruins, você paga por elas".

Ações na educação
O meu cuidado era não deixar o governo parar. Nós trabalhamos e os resultados foram muito bons para a história política do Brasil. Tenho orgulho de dizer que sou o presidente da República que mais investiu em educação na história desse país. São 48 extensões universitárias, até o final do ano inauguramos 32 escolas técnicas. Estamos com defasagem no ensino superior, médio e fundamental. Por que herdei isso? Aumentamos de oito para nove anos a permanência de crianças na escola. Havia uma lei que dizia que o governo federal não poderia mais ser responsável pelo ensino técnico, nós revogamos essa lei. Vamos fazer em cada cidade pólo uma extensão universitária e uma escola técnica. Anunciamos a Universidade Aberta. Não posso resolver em apenas quatro anos o que não foi feito em 40 anos. O Brasil não dará o salto de qualidade que o mundo exige se não houver prioridade para a educação. No Prouni, são 204 mil jovens a mais na universidade brasileira. Parece pouco? Quero fazer do Brasil o país mais democrático do mundo no acesso à universidade".

Acordo com PL na campanha
"Em nenhuma reunião de que eu tenha participado se discutiu de pagar a um partido político. Não é possível que alguém ouse achar que alguém pode financiar a campanha de outro. (O financiamento público de campanhas) É muito mais barato e mais sadio do ponto de vista da democracia. Não pode ter dinheiro privado em campanha política".

Se não for eleito?
"Primeiro, eu vou ser eleito. Eu vou para São Bernardo do Campo e todo dia eu vou ver a Volkswagen, o pessoal que me criou para a política. Deus já foi generoso comigo ao extremo ao permitir alternância de poder. Já aprendi muito e já sei todo o caminho das pedras. O povo está sentindo no bolso, no supermercado, no depósito de material, no açougue, na farmácia... apesar das coisas negativas, ele está comendo mais e vivendo melhor".